Sociedade

A deficiência física como alavanca para o crescimento

Rui Ramos

Jornalista

Zacarias Malundo João, 51 anos, é filho de Mateus João e de Jacinta Malundo, natural de Dimuca, Negage, província do Uíge.

31/01/2021  Última atualização 11H06
Zacarias Malundo João © Fotografia por: DR
Os estudos primários de Zacarias Malundo João foram feitos na aldeia natal, Dimuca, com continuidade na capital da província do Uíge entre 1987 e 1989, no curso básico de Educação. Zacarias Malundo João cumpriu o Serviço Militar Obrigatório no período de 1987-1991, no  Uíge, Luanda, Huíla e Namibe.
Em Maio de 1995,  por acção de uma bala, contrai uma lesão de nível T3 ficando paraplégico, situação que perdura até hoje, com uma passagem pelo Brasil, por acolhimento familiar, com o propósito de tratamento, em 1997.

Regressou a Angola sem melhorias, mas "com um nível de auto-estima elevado”, para enfrentar a nova vida, cuja dificuldade foi acrescida pela deficiência, sendo "muito fraco o apoio que o Ministério da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria” lhe presta, segundo diz.
"Com altos e baixos, vou caminhando. Todo o mundo tem dificuldades, mas sou convalescente e tenho família dependente de mim, as responsabilidades cresceram.”

 Zacarias Malundo João diz que aprendeu uma frase no Brasil, no Centro de Reabilitação Física do Sarah, em Brasília, que o tem levado a batalhar cada dia que passa: "Não penses que por seres deficiente basta rezar ou pedir a Deus e tudo virá para te sustentar”.
Após a lesão, provocada por arma de fogo, Zacarias Malundo João foi transferido para o Hospital Militar de Luanda, durante 6 meses, e aí, aos 26 anos, soube que não voltaria a andar.

 Preso a uma cadeira de rodas, Zacarias Malundo João nunca desistiu de lutar e ei-lo na Educação como docente no ensino de adultos após obter a licenciatura em Gestão de Empresas pela Universidade Técnica de Angola UTANGA, em 2016.
Um eterno estudioso, assim se define Zacarias Malundo João, que já fez 6 cursos de pós-graduação na UAN-CEAFIE, e outros de "carácter mais básico”, "tudo para sustentar o grau de licenciatura e para atingir ou ter habilidades e competências exigidas a este nível”.

Zacarias Malundo João pretende chegar mais longe, mas as dificuldades financeiras não lhe têm permitido atingir as principais metas que se propôs. Com os membros inferiores paralisados, Zacarias Malundo João foi aconselhado pelo médico a praticar desporto e ei-lo a jogar basquetebol e chega a Marceliano Correia Victor "Mbeco”, o grande «patrão» do Clube Macovi, que conheceu no Uíge, que o incentiva. E no Kapalanga, o treinador do Núcleo do Macovi, Leopoldo Siveinge Paulo Muikhulu, puxa por ele e Zacarias Malundo João torna-se um mestre certificado.

"Já como docente do primário, fundei o Clube do Kapalanga na antiga Escola VIN-335 Nação Coragem, conhecida como Escola do Tio Neto, e delegaram-me para contactar o mister Mbeco. "Quem me ensinou a jogar xadrez foi o meu irmão Adolfo Malundo João quando eu estava acamado em casa.”

Zacarias Malundo João é vice-presidente da Mesa da Assembleia da APDAL "Associação Provincial de Desporto Adaptado de Luanda e lembra o treinador Silas, ex-atleta do ASA, substituído por Quinito que actualmente trabalha na Rádio Nacional, de seguida Moniz Marques, "este último revolucionou bastante o basquetebol, e Adelino Chimuco, coordenador nacional de Basquetebol do Comité Paralímpico Angolano, além de Joaquim Cafuxi, director técnico. Zacarias Malundo João diz-nos que residia na zona da Cidade Alta até ser desalojado e enviado para o município de Viana.

"Saía de Viana para o Centro de Reabilitação de Medicina da Samba para a fisioterapia, trajectória muito difícil devido à locomoção em autocarro cheio até ao 1º de Maio, daí  até ao Centro ia sozinho, na cadeira de rodas, regressava ao Hospital Militar e depois dos treinos ia dali para o Largo das Escolas para apanhar o autocarro para casa”, destacou.

Durou um ano este "inferno”, até conseguir adquirir a primeira motorizada. "Como basquetebolista conheci Benguela, Cuanza-Sul, Huíla, Cabinda e outros lugares, eu que pensava que para mim o mundo tinha acabado”. Zacarias Malundo João nunca parou de praticar xadrez e em 2002 inscreve-se em formações no actual Centro Ortopédico Agostinho Neto em Viana e em Reparação de TV, aproveitando a gratuitidade dos cursos estatais devido à sua condição. 

Por outro lado, apetrechou-se de uma máquina fotográfica e, de cadeira de rodas, anda muitas vezes por Luanda fotografando pessoas e eventos a pedido. De entre os obstáculos para um portador de deficiência física, Zacarias Malundo João refere os lugares sem acesso ou sem mobilidade para cadeirantes e a rejeição nos transportes públicos. "Já tive esta discriminação antes de adquirir a minha primeira motorizada”.

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