Opinião

A toque de caixa

Animados pelas notícias do início da vacinação contra a Covid-19 em vários pontos do mundo, apesar de, ainda assim, preocupados com as desigualdades que a distribuição desses fármacos profiláticos tem revelado, 2021 começa com bons motivos para África, que parece estar a dar sinais de querer sair do marasmo e do gráfico da desgraça e subdesenvolvimento com que é geralmente ilustrado.

10/01/2021  Última atualização 09H45
Um quadro que se manifesta na própria distribuição das vacinas, em que África surge em último lugar e não por ser o menos infectado e afectado, mas pelas diferenças de desenvolvimento e de investimento que lhe estão associadas.

Os africanos - tão mal vistos pelos seus problemas, conflitos, pobreza, fome, migração, frágeis democracias- puderam ter os seus momentos lúdicos, ao assistirem, estupefactos, às cenas que vinham da capital dos Estados Unidos da América, considerados a mais sólida democracia do mundo. Tudo porque se desenrolava um golpe de Estado, o que, tipicamente, só era possível nos anos 1970/80 da América Latina e, ultimamente, em África. Na maior potência mundial, que impõe as suas regras a todo o mundo, o candidato derrotado não aceita os resultados, levanta a bandeira da fraude e vai no sentido da tese de que eleições só são livres e justas quando se ganha!( Onde é que já vimos isto?).

Em outras situações e noutras geografias, lá estariam os africanos a ser, uma vez mais, humilhados pela sua inadaptação à democracia, pelo incumprimento dos padrões civilizacionais, que eles (os do Ocidente) gostam de impor e tomar como únicos. Mas, sendo os EUA, tudo é permitido e não passa nada, mesmo que em eleições anteriores já tivéssemos visto cenas próprias daquilo que eles consideram o Terceiro Mundo, como a recontagem dos votos na Flórida, que (não) deram a vitória ao proclamado vencedor George W. Bush. Mas, tratando-se de euro-americanos, tudo é permitido, incluindo invadir o símbolo maior da democracia, que é o edifício do Congresso. Quando se tratou das manifestações dos "afro-americanos”, a Polícia não andou a distribuir rebuçados e chocolates, como na última quarta-feira.

Deixemo-los com os seus maus exemplos, desde que não tenham imitadores por aqui, como, infelizmente, parece acontecer. E, assim, haverá que lhes dar a resposta adequada, para que, qual crianças traquinas, possam ser educadas a respeitar a vontade do soberano, as leis e as instituições.

Andam por aí alguns "talibãs” a prometer o retorno à guerra, a mobilização de descontentes para a desordem e o caos como única forma de fazer a pretendida alternância no poder, até porque, como diziam os cartazes da manifestação de ontem, 45 é muito. São os extremistas que, à força de um estatuto de opositores, se julgam acima de qualquer barreira, perante o silêncio cúmplice das  lideranças, elas próprias ávidas de materializar essa troca, não importam os meios.

E é vê-los a aproveitar a "ditadura norte-coreana” para atentar contra o Estado, contra a soberania, para fomentarem a anarquia, a arruaça, criarem o pânico, destratar instituições e dirigentes, num regresso a práticas que se pensava não serem mais desejo de todos os angolanos, a não ser deles próprios, que já sentiram o resultado perverso desta aventura.

Porque acreditam que o seu antigo estatuto rebelde lhes concede direitos ilimitados e que haverá sempre um refúgio onde se esconderem, se a coisa der para o torto, ou que a clemência e a tolerância são intermináveis.

Sejam eles os extremistas de antigamente, os velhos lobos agora travestidos de democratas verborosos, ou ainda os novos talibãs, que agem às claras nos subúrbios, promovendo a subversão, é preciso que assumam as suas responsabilidades, não se escondam debaixo de saias de grupos de descontentes, e tenham consciência de que a justiça pode até demorar, mas é implacável e que, na hora da verdade, nenhum movimento lhes poderá valer, mesmo que vindo de quem não tem moral para repreender ninguém, mas julga ter poder quanto baste para ditar ordens a todos.

São acções semelhantes que fazem com que o continente seja sempre visto pelos maus exemplos, porque conduzem à insegurança, razão principal para que a União Africana não se afirme como uma força geopolítica que projecte o desenvolvimento, tal como rezam os seus estatutos.

A boa notícia do estabelecimento do livre comércio em África, com a adesão de 54 países, é um passo importante para a afirmação do continente, onde mais de um bilião de pessoas, deitado sobre um leito de riquezas naturais invejável, está habituado a consumir (quando pode) produtos de outras paragens e a ver partir os seus bens para sustentar economias alheias.

A iniciativa ainda vai esbarrar na insegurança que assola África e dificulta a livre circulação, vai enfrentar as barreiras aduaneiras, a burocracia, a corrupção e o desnível de desenvolvimento, que, intramuros, também é assinalável, mas é um pontapé de saída acertado, numa altura particularmente delicada devido à incerteza que a pandemia da Covid-19 levanta a todos, sem excepção.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião