Opinião

Actuais conflitos internos têm causas económicas

Apesar do nosso continente continuar a ter um grande número de conflitos internos, houve, nos últimos anos, uma evolução dos factores de conflitualidade, deixando de ter como génese causas étnico-grupais e passando para questões económicas e de repartição da riqueza.

01/02/2021  Última atualização 07H26
Angola tem tido o mérito de servir de exemplo na busca de soluções negociadas para o tipo de conflitos que eram essencialmente baseados nos problemas políticos. A onda de novos conflitos, de inspiração económica, coloca ao continente e Angola, em particular, o desafio de "descobrir” um novo caminho, uma nova fórmula que se ajuste aos problemas de hoje.

As grandes zonas de conflitos são, paradoxalmente, terras de índices de desenvolvimento muito baixos e, ao mesmo tempo, territórios detentores de recursos minerais extremamente importantes, quase sempre fontes principais de enriquecimento da elite e de sustentação económica dos governos. Os novos conflitos são basicamente motivados por disputas por água e recursos minerais; da disputa pelo controlo das rendas provenientes da exploração de recursos naturais e decorrente da pobreza e/ou a falta de oportunidades económicas alternativas.

Há hoje um claro nexo de causalidade entre os conflitos e as reclamações e protestos contra o atraso no desenvolvimento de zonas economicamente ricas, mas a viverem em condições miseráveis. A abundância de recursos naturais, em vez de promover o desenvolvimento e contribuir para o bem-estar das populações, contribui para o exacerbar das situações de pobreza, precariedade e desigualdades económicas sustentadas e ajudam a fomentar a corrupção.

É imoral e inaceitável o contra-senso das terras que produzem a riqueza estarem no limiar da pobreza extrema, o que pode ser resolvido se houver a resoluta decisão de consagrar uma abordagem diferente do envolvimento directo das empresas responsáveis pela extracção de recursos na gestão governativa das regiões onde trabalham.

Se se pretender enfrentar com sucesso a nova onda de conflitos latentes no continente, então é necessário estabelecer uma proporcionalidade entre o extraído e o reinvestido e mudar o "mind-set”, que terão de deixar de ver a responsabilidade social das empresas como um gesto de boa vontade e um dever secundário. A responsabilidade social das empresas é uma obrigação ética e uma garantia de estabilidade.

A arrecadação de elevadas rendas provenientes da exploração dessas matérias-primas deve gerar a obrigatoriedade moral de um reinvestimento em projectos sustentáveis que possam ser capazes de gerar novos empregos, bem-estar e desenvolvimento sustentável na agricultura, indústria, cultura e energia e águas. A frustração e a não concretização de uma responsabilidade social efectiva gera, por um lado, o surgimento de grupos movidos pela ganância dispostos a desafiar os governos na disputa pelo controlo dessas zonas e, por outro, cria, entre os mais radicais, a convicção de que só a deflagração de um conflito violento pode permitir uma alteração profunda da situação.

O desafio de Angola (que hoje lidera as organizações regionais de resolução de conflitos) é de actuar à frente do nosso tempo e conceber um modelo de responsabilidade social capaz de manter a autoridade administrativa do Estado, mas, em simultâneo, envolvendo-se directamente na gestão governativa das comunidades. As empresas terão de ser capazes de canalizar verbas para o sistema fiscal, mas ao mesmo tempo assumir directamente a criação de postos de trabalho, assumir o controlo financeiro dos principais projectos de desenvolvimento local e co-participar nos principais programas de desenvolvimento das pessoas e da economia local.

Só assim a responsabilidade social das empresas será, ela mesma, a primeira garantia de segurança e um dos alicerces para o desenvolvimento sustentável e de uma governação eficaz. A incapaz máquina administrativa deve reconhecer a necessidade de intervenção do sector empresarial, assegurando que áreas geográficas, projectos e programas de desenvolvimento sejam directamente geridos por terceiros, como forma de rapidamente gerar crescimento e assegurar a observância de boas práticas em matéria de direitos humanos e protecção contra riscos económicos, sociais e ambientais.

Se Angola quiser continuar a assumir a liderança da resolução de conflitos terá de iniciar um novo tempo, fazer aprovar uma estratégia nacional de responsabilidade empresarial, para que as populações locais sejam as primeiras a beneficiar do facto de terem nascido em zonas ricas em recursos naturais. O primeiro passo é a educação: É preciso iniciar uma forte campanha de educação dos gestores públicos e privados das empresas que exploram os recursos naturais, para passarem a ver a responsabilidade social como obrigatória e proporcionalmente estabelecida em função do volume de rendimentos extraídos.
Em segundo lugar, reinvestir fortemente nas zonas onde extrai riquezas e adoptar a responsabilidade social como prevenção de conflitos e uma garantia de estabilidade.

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