Coronavírus

África com segunda vaga mais severa e uma subida de 30% nos casos diários

A segunda vaga de Covid-19 em África foi mais severa, revela um estudo, que aponta o relaxamento das medidas de saúde pública e as novas variantes como causas prováveis de um aumento médio diário de 30% de infecções.

28/03/2021  Última atualização 11H44
África com segunda vaga © Fotografia por: DR
De acordo com a análise, publicada pela revista científica The Lancet, houve cerca de 30% de mais infecções diárias durante a fase ascendente da segunda vaga em África, durante os meses finais de 2020, em comparação com o pico da primeira, registado em meados de Julho. O estudo, que abrange o período entre 14 de Fevereiro e 31 de Dezembro de 2020, é apresentado como a "primeira avaliação aprofundada à natureza da pandemia” nos 55 Estados-membros da União Africana (UA), que somam mais de 1,3 mil milhões de pessoas.

De acordo com os autores, as "respostas iniciais rápidas e coordenadas” à pandemia contribuíram para limitar a severidade da primeira vaga, no entanto, o afrouxamento e a menor adesão às medidas de saúde pública e sociais, que se seguiram, "contribuíram para os maiores impactos observados durante a segunda vaga”.
"O surto de casos durante a segunda vaga é também susceptível de ter sido parcialmente impulsionado pelo aparecimento das variantes da Covid-19, algumas das quais mais transmissíveis do que a estirpe original”, aponta o estudo, ressalvando, no entanto, não ter sido possível avaliar os seus efeitos.

Os autores analisaram os casos de Covid-19, mortes, recuperações e testes realizados em todos os 55 Estados-membros da UA, utilizando dados recolhidos pelo Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC), bem como as medidas de saúde pública e as restrições adoptadas pelos países no combate à pandemia. Até 31 de Dezembro de 2020, África tinha reportado 2.763.421 casos de Covid-19, cerca de 3% do total global, e 65.602 mortes. Durante o primeiro pico da pandemia, foram reportados em média 18.273 novos casos por dia, valor que subiu para 23.790 casos diários no final de Dezembro de 2020, quando 36 países enfrentavam uma segunda vaga de infecções.

A análise das medidas de saúde pública em vigor no mesmo período confirmou que os países agiram muito rapidamente numa primeira fase, o que parece ter retardado o progresso da pandemia no continente. Entre 50 países, 36 (72%) implementaram as primeiras medidas de controlo rigoroso aproximadamente 15 dias antes de comunicarem o primeiro caso, e em meados de Abril, quase todos os países (96%, 48 países), tinham pelo menos cinco medidas de saúde pública rigorosas em vigor. No entanto, quando confrontados com uma segunda vaga, no final do ano, muitos países não aplicaram tão fortemente as mesmas medidas, refere o estudo.

Dos 38 países que enfrentavam uma segunda vaga e adoptaram restrições, quase metade (45%, 17 países) tinha menos medidas em vigor durante a segunda vaga. Embora a análise indique que a África, como um todo, não reportou tantos casos e mortes associadas à Covid-19 como outras partes do mundo, o estudo revela variações consideráveis em todo o continente. Apenas nove países contabilizaram a maioria dos casos (83%) e mais de três quartos das mortes (78%) ocorreram em cinco: África do Sul, Egipto, Marrocos, Tunísia e Argélia. As maiores incidências de casos por 100.000 habitantes foram registadas em Cabo Verde (1.973), África do Sul (1.819), Líbia (1.526), Marrocos (1.200), e Tunísia (1.191).

Dos 53 países que relataram mais de 100 casos de Covid-19, um terço (34%) tinha uma proporção de mortes em comparação com o total de casos mais elevada do que a média global de 2,2%. A nível regional, a África Austral foi responsável por cerca de metade dos casos (43%) e das mortes (46%). O Norte de África foi também fortemente afectado, com mais de um terço de todos os casos (34%) e mortes (37%) ocorridos na região. A África Oriental foi responsável por 12% dos casos e 9% das mortes, com 9% dos casos e 5% das mortes registaram-se na África Ocidental e 3% dos casos e 2% das mortes na África Central. No final de Março de 2020, a maioria dos países (89%) tinha a capacidade de realizar testes PCR à Covid-19 e, em Julho de 2020, todos estavam em condições de o fazer.

Até 31 de Dezembro, mais de 26 milhões de testes tinham sido realizados, no entanto, a análise indica que muitos países não conseguiram satisfazer a procura de testes durante os períodos de pico da pandemia. Mais de dois terços dos países (70%) tinham capacidade de teste suficiente quando a primeira vaga começou, mas apenas um quarto (26%) conseguiu satisfazer a procura de testes no pico. No pico da segunda vaga, apenas um terço dos países (36%) podia satisfazer a procura de testes. "As nossas conclusões indicam que vários factores conduziram provavelmente à segunda maior vaga de casos de Covid-19 em África”. A par de relatos de que a adesão a medidas de saúde pública - tais como o uso de máscaras e o distanciamento físico - diminuiu, destaca-se a importância de uma monitorização e análise contínuas, particularmente, à luz do aparecimento de novas variantes mais transmissíveis”, disse o director do África CDC e um dos co-autores do estudo, John Nkengasong.

Estimando que os países africanos venham a enfrentar novas vagas de infecções pelo novo coronavírus, os resultados do estudo realçam a necessidade de monitorização e análise contínuas dos dados para ajudar os países a equilibrar o controlo da transmissão com as economias. "Estes conhecimentos revelam também a necessidade de melhorar a capacidade de teste e revigorar as campanhas de saúde pública, para voltar a sublinhar a importância de se respeitarem as medidas que visam atingir um bom equilíbrio entre o controlo da propagação da COVID-19 e a sustentação das economias e dos meios de subsistência das pessoas”, sublinhou Nkengasong.

Os autores reconhecem algumas limitações ao seu estudo, considerando que, como a análise foi concluída a 31 de Dezembro de 2020, não foi possível avaliar os efeitos das novas variantes do vírus, incluindo a variante sul-africana B.1.351. Por outro lado, assinalam a escassez de dados específicos de cada caso, tais como idade, sexo ou profissão, bem como o facto de nem todos os países comunicarem os dados de casos e testes diariamente, entre outras limitações.

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