Sociedade

Cabinda aposta no resgate das danças em extinção

Alberto Coelho | Cabinda

Jornalista

O responsável da Acção Cultural da província, José Maria Janson, reconheceu que o resgate destas danças não é uma tarefa fácil, pois muitos dos praticantes já não estão em vida, enquanto outros desistiram.

09/05/2021  Última atualização 09H45
Grupos Folclóricos © Fotografia por: Edições Novembro
A revitalização das danças tradicionais desaparecidas e das que estão em vias de extinção é uma das principais apostas da Secretaria da Cultura de Cabinda, num trabalho feito em parceria com a Associação dos Grupos Folclóricos.
O responsável da Acção Cultural da província, José Maria Janson, reconheceu que o resgate destas danças não é uma tarefa fácil, pois muitos dos praticantes já não estão em vida, enquanto outros desistiram. "O trabalho de resgate, iniciado há algum tempo, sofreu interregno, devido à Covid-19”, disse, acrescentando que dos 54 grupos de dança controlados pela Secretaria da Cultura hoje só estão no activo 40. "Os demais desistiram por falta de incentivos financeiros para sustentar as actividades”.

Mayeye, matáfala, kintuene, nzoca, baine, maringa, merengue são algumas das muitas danças ainda praticadas em Cabinda. Mas outras, como o nkuintchi, matinuko, libuli, yombo, liquembe, senguele e ntchientchi acabaram por ser extintas do folclore local. Actualmente as que estão em vias de extinção são nyoyo, dibondo, lélica, sunsa, nzola e matchatcha, apesar do trabalho de resgate feito pela cultura local.

"Estamos a trabalhar com as administrações municipais para resgatar algumas danças que desapareceram, através de um festival local, de forma a incentivar os criadores e o público”, justificou e explicou que para o êxito do projecto já foram identificadas as antigas praticantes destes estilos e sensibilizadas a transmitirem o legado às gerações mais novas.
Questionado sobre o actual estado da dança em Cabinda, José Janson descreveu um cenário de preocupação, porque os grupos estão a viver imensas dificuldades, por falta de patrocínio, ou de apoios como indumentária e material acústico, em especial batuques. "A situação agravou-se ainda mais com o surgimento da Covid-19, que retirou a possibilidade destes participarem em eventos culturais públicos”.

"A maioria dos grupos não tem patrocínios e sustenta as actividades com custos próprios. Às vezes dependem dos incentivos do Estado, através da Secretaria Provincial da Cultura”, esclareceu, acrescentando que, geralmente, devido à falta de patrocínios, os grupos de dança não realizam exibições públicas e a aparição se resume mais ao Carnaval. "Como não temos grupos carnavalescos propriamente ditos, eles aparecem e se transformam em grupos carnavalescos”.
A presença de alguns destes grupos, adiantou, também é notória em actividades governamentais e em algumas cerimónias e festas tradicionais como o Chicumbi (a festa da puberdade). "Espectáculos como tal não existem, tirando aqueles promovidos pelo sector da Cultura e depois de cada actuação eles ficam desmoralizados”.
Em relação à dança moderna, a Secretaria da Cultura controla um total de 49 grupos que praticam os estilos kuduru, funk, reagge, kizomba, semba e zouk.

Kintuene
Um dos estilos de dança tradicional muito referenciado a nível local é o kintuene, importado da República Democrática do Congo, hoje muito enraizado nos municípios de Buco-Zau e Belize. Ao contrário das outras danças, em vias de extinção, este estilo expandiu-se em toda a extensão da província de Cabinda, por estar muito ligada à juventude.
As melodias reflectem geralmente as dificuldades sociais que os cidadãos enfrentam no dia-a-dia  e também têm um pendor crítico quanto às questões morais e éticas, assim como aos bons costumes da região.
As actuações podem ser exibidas nos momentos de alegria (festas) e de tristeza (falecimentos). As violas de caixa de fabrico caseiro, os chocalhos e o bordão são os principais instrumentos que acompanham as melodias, todas cantadas na língua local, kiombe. As dançarinas vestem-se, normalmente, de panos levantados até aos joelhos e descalças.


Especificidade
Entre os estilos mais particulares de Cabinda, o executado pelos Bakama têm uma caracterização própria na cultura tradicional de Cabinda. O responsável da Acção Cultural local explicou que devido às actuações em público eles podem ser enquadrados "como um grupo de dança com características específicas próprias”.
"Eles representam uma espécie de religião tradicional dos cabindas, que actuam em cerimónias de empossamento de chefes, actos fúnebres e de homenagens, doença prolongada e grave, expiação e purificação, consagração, calamidades naturais e agradecimentos”, esclareceu.

Em termos rituais, adiantou, os Bakama estiveram, no passado, ligados ao culto "Lusunzi”, um génio que servia de intercessor entre Deus e os homens. "Por isso eles são temidos por terem o poder de amaldiçoar e intercederem junto dos antepassados para apaziguar e regular os conflitos que afectam os valores morais e culturais da comunidade”, disse.


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