Opinião

Cidade má para viver

Luciano Rocha

Jornalista

Luanda sempre foi uma cidade má para viver, primeiro, por motivos óbvios, durante as sucessivas ocupações, depois, já sem o jugo colonial, por razões diversas mas, igualmente, evidentes, agravadas com o surgimento do novo-riquismo.

22/01/2021  Última atualização 09H10

Luanda, que tem tudo para ser bonita e boa para viver, trabalhar, visitar, é aquilo que se sabe, exactamente a antítese, um amontoado de incongruências fruto do egoísmo de uns quantos que lhe taparam caminhos das aragens do mar pelos quais respirava, construindo indiscriminadamente caixotes de vidro e plástico, desrespeitando os mais elementares  princípios de urbanização, forma de enriquecerem sem esforço.

Os novos-ricos tão afoitos a substituir os ocupantes na pose e forma de olharem para os angolanos, bem podiam ter aproveitado o que de bom eles deixaram a nível do traçado arquitectónico, independentemente das razões que os motivaram. Vejam-se, entre outros, os exemplos dos bairros  do Café, antigo musseque Braga, feito pelos roceiros analfabetos ou quase, quando ele atingiu as mais altas cotações no mercado internacional; Cruzeiro destinado aos quadros médios do funcionalismo público, mesmo, mais tarde a Vila-Alice para os trabalhadores do Caminho de Ferro de Luanda, com o mesmo estatuto; e Maculusso, habitado pela pequena-burguesia nacional. 

Noutro grupo, abertamente discriminatório, fizeram os bairros Indígena, com moradias de rés-do-chão, paredes de cimento, cozinha, quarto de banho, varanda e quintal;  e o Operário, de vias de areal vermelho e casas de adobe, mais tarde de madeira,  sem esgotos, latrinas, a exemplo do Marçal. Em comum, quer no primeiro caso, quer no segundo, tinham as ruas em esquadria, pelo que, mesmo naquelas em que não tinham sarjetas raramente havia lagoas das chuvas.

Mais, quem não dispunha de água canalizada podia recorrer aos chafarizes. Claro que havia tasqueiros a desviá-la não só para baptizarem o vinho vendido avulso, como a negociá-lo em barris. O mau deixado pelo colono foi aproveitado pelos novos abutres.Estas são apenas amostras - há muitas mais -de como Luanda continua uma cidade na qual não apetece viver, nem trabalhar, sequer visitar. Não há governador ou administrador que lhe valha enquanto durar a pandemia do novo-riquismo própria da burguesia impreparada, com reflexos devastadores na da Covid-19. 

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