Política

Compra de divisas envolvia empresas estrangeiras

Santos Vilola

Jornalista

O ex-governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Valter Filipe, foi ontem confrontado com designações comerciais de uma série de empresas, a maioria delas estrangeiras, que terão beneficiado, segundo a acusação do Ministério Público, de cambiais (dólares e euros) do Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (GRECIMA) por eventuais serviços prestados em nome do Estado.

12/02/2021  Última atualização 15H40
© Fotografia por: DR
Entre as empresas que terão beneficiado do esquema de obtenção de divisas do BNA por alegados serviços prestados ao GRECIMA estão a Duta, Nove Group, Consulcom Marketing e Consultoria, Ovil, Lda, Pavitra, Vitalop, Lda, Monarch, Paditra, Randon Ltd, Zilfor e Bencon. 

À data governador do banco central e emissor de moeda no país, Valter Filipe, ouvido como declarante, disse ao juiz principal da causa, Daniel Modesto, desconhecer estas empresas."O governador do BNA não tinha a possibilidade de conhecer as empresas que o GRECIMA mandava por ofício ao BNA a solicitar a disponibilização de divisas. Não tinha como saber porque nunca tive contactos com elas”, disse Valter Filipe, sob juramento legal, acrescentando que desconhecia a venda de divisas das operações cambiais que aquele gabinete presidencial fazia.
Razões para cambiar

Questionados sobre quais eram os fundamentos do GRECIMA para os pedidos de operações cambiais, Valter Filipe disse que "não se recorda”, mas lembrou as necessidades de compra de equipamentos para órgãos de comunicação social e para preparar as eleições. Além destas, admitiu, houve mais. "Em 2017, durante a preparação para as eleições, havia a necessidade de pagar a empresas para melhorar a imagem do país no estrangeiro”, disse.  Valter Filipe esclareceu que, em 2015, a Assembleia Nacional aprovou o Plano para a Saída da Crise que estabelecia que, dado que as Reservas Internacionais Líquidas são suporte das importações e exportações no mercado internacional, a afectação de divisas seriam feitas de forma directa, além do leilão aos bancos comerciais. 

O BNA afectava divisas aos diversos órgãos de soberania, da Administração Pública, titulares de cargos públicos de forma individual, generais e oficiais da Polícia Nacional, magistrados, procuradores, etc., ou seja, pessoas colectivas de direito público e privado. Tinham ainda direitos empresas portadoras de licenças para importar bens alimentares, alfais agrícolas, industriais e de saúde."Cabia ao BNA analisar a capacidade do pedido de divisas a afectar, no todo ou em parte, às instituições”, acrescentou, reconhecendo, no entanto, que empresas que alegadamente prestavam serviços ao GRECIMA beneficiavam da afectação directa de divisas, exclusivo apenas para instituições do Estado.

Valter Filipe disse desconhecer a quantidade das operações do GRECIMA e os bancos comerciais que usava. Questionado se era possível Hilário Gaspar Santos levantar divisas directamente no BNA, Valter Felipe negou. Chamado para uma acareação rápida, Gaspar Santos ainda negou que fosse possível. Mas o juiz confrontou-o com uma afirmação sua no início das sessões de discussão e julgamento em que admite ter ajudado pessoas a levantar dinheiro directamente do BNA.O juiz insistiu, questionando onde Gaspar Santos dava entrada dos pedidos de divisas e ele respondeu: "no BNA”. Antes de pôr fim à acareação pontual, o juiz concluiu que "já viajou várias vezes, mas nunca foi ao BNA”. 
"Valter Filipe mentiu”

Chamado pelo juiz principal da causa para esclarecer se quem fazia a compra de divisas era o GRECIMA ou em-presas que prestavam serviços ao GRECIMA, Manuel Rabelais reconheceu que havia duas ou três modalidades de compra de divisas: uma era compra directa (por ofício) e outra através de em-presas que prestavam serviços ao Estado.Entre apreensões a escolher a palavra certa para o momento, Manuel Rabelais disse que Valter Filipe "mentiu” quando disse que não sabia das empresas, uma vez que todas constavam dos ofícios. O juiz interrompeu de pronto, dizendo que "não se pode vir cá mentir.”Instado a esclarecer se nos ofícios que dirigia ao BNA mencionava as empresas, Rabelais afirmou que sim, insistindo que todas prestavam serviço ao GRECIMA, mas concretamente em relação à Monarch disse "penso que sim” e à Paditra que "não sabia.”

Manuel Rabelais esclareceu que as empresas Radon Ltd, Zilfor e a Bencon foram usadas pela via da sua conta pessoal para transferir dinheiro para pagar serviços prestado ao Estado por outras empresas."Não tenho estado a responder ao detalhe porque algumas questões eram de carácter secreto”, insistiu, admitindo que "as empresas citadas nos autos serviram de intermediárias para transferir dinheiro para a minha conta para pagar serviços prestados ao Estado.”    
Questionado se prestava contas ao então Presidente da República, o ex-director do GRECIMA e secretário para Comunicação e Imprensa de José Eduardo dos Santos disse que sim, mas verbalmente. Disse que não haviam facturas dos pagamentos feitos, mas confrontado pelo juiz principal da causa com uma factura, Rabelais ficou surpreendido por instantes, e defendeu-se respondendo que "essas facturas eram para cumprir com as regras do compliance internacional.” ”O pagamento a entidades que prestavam serviços é que era secreto”, disse.

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