Opinião

Desluandizar

Adebayo Vunge

Jornalista

Depois da institucionalização de uma espécie de “comissão de salvação” contra o lixo na cidade de Luanda, começou na semana passada uma campanha massiva de limpeza que envolve um manancial de meios, entre equipamentos e humanos, numa “requisição civil” junto de empresas privadas do ramo da construção civil e obras públicas, para além de algumas empresas de limpeza que “perderam ou ficaram excluídas” do concurso emergencial para a limpeza de Luanda.

03/05/2021  Última atualização 11H56
Estando a viver nesta cidade, nenhuma alma humana consegue escapar aos efeitos danosos em termos de salubridade do meio, numa altura em que a dimensão demográfica da cidade começa a escapar o controle de qualquer estatística. E tanto é assim, porque ninguém hoje sabe, ao certo, qual é o tamanho da população de Luanda, um factor absolutamente fundamental para qualquer actividade de planeamento e gestão urbana e das demais políticas públicas para esta metrópole. Urge uma nova ronda censitária.

Mas ao reflectir sobre Luanda, nos últimos dias, em vários círculos e em diferentes meios, é claro para todos que a poucos meses das eleições é urgente inverter-se o quadro e conferir em definitivo um outro rumo à governação de Luanda. Como diria o meu antigo professor e deputado Paulo de Carvalho, não vale a pena atermo-nos aos nomes. É importante definirmos o perfil e a meta do que se quer de Luanda.

Do meu ponto de vista, porém, para além das soluções endógenas, o resultado de todas as medidas de política para Luanda estão hoje, mais do que nunca, dependentes de soluções exógenas. O que quero dizer com isso, afinal?
Sem prejuízo de tudo o que possa ser feito em Luanda e isso é incontornável e inadiável porque as pessoas cá estão (seis milhões, oito milhões, dez milhões?). As soluções de Luanda passam, em grande medida, pelo que chamo aqui de "desluandizar” Luanda.

É absolutamente vital que possamos apostar rigorosamente mais noutros espaços do nosso território, definindo pelo menos quatro corredores de desenvolvimento integrado - I. Malanje-Huambo e Bié (o verdadeiro planalto central); II. Namibe, Huíla e Cunene (corredor-Sul); IIII. Cuanza-Norte – Uíge – Zaire e Cabinda (corredor Norte); IV. Lunda-Norte (Dundo) – Lunda -Sul (Saurimo) e Moxico (Luena) ou também corredor do Leste, para além do corredor Luanda – Bengo e Cuanza-Sul.

Tudo isso, não só como forma de desafogar Luanda, mas principalmente como medida para conseguirmos o equilíbrio da repartição de riqueza nacional e no combate às assimetrias regionais, assegurando programas de maior investimento em infra-estruturas e do sector privado.

Precisamos tornar real o lema do PIIM – mais vida nos municípios para que consigamos um verdadeiro tampão contra o êxodo rural. As pessoas têm que saber e perceber que sair das suas zonas para zungar em Luanda não é solução. É uma ilusão e um novo problema!

É óbvio que é importante que haja circulação efectiva do capital no interior do nosso país. Não podemos nos permitir que haja municípios do nosso país sem uma agência bancária. Que haja municípios sem combustível e sem electricidade. E não podemos aguardar as autarquias, ou seja, os políticos que se entendam, mas a vida não pode esperar. E se não há vida…

É óbvio que os jovens precisam ser melhor elucidados sobre o potencial de desenvolvimento das suas localidades no lugar de emigrarem para a venda ambulante em Luanda. É óbvio que as oportunidades de formação devem estar bem repartidas pelo país. É óbvio que as oportunidades de emprego devem existir em associação directa com os grandes projectos industriais e da mineração.

Por isso mesmo, a perspectiva da instalação da Endiama Mining na Lunda-sul é um caminho importante neste sentido. Espero que seja uma verdadeira instalação, assumindo-se aqui todos os riscos sobretudo económicos e financeiros, uma vez que é expectável que ocorra um aumento dos custos operacionais e dessa instalação numa primeira fase. Mas vislumbramos o quão rápido será o impacto para a região. A recuperação da EN-230 será de resto o grande contributo do Estado neste sentido.

Nessa mesma direcção, penso por exemplo nos projectos de refinarias em curso em Cabinda e no Soyo, o quanto estas terão um impacto na região, contanto que venham a dar primazia aos jovens locais ou outros do nosso país que se queiram instalar ali.

Ora, "desluandizar” significa também abandonar as politiquices e colocar a máquina verdadeiramente em funcionamento. Colocar funcionários públicos competentes e comprometidos. Colocar os empresários angolanos a captar negócios e oportunidades, evitando-se que largos segmentos de negócios estejam capturados por estrangeiros como se assiste em Luanda.

Significa abandonar a mentalidade perniciosa do lucro fácil, do menor esforço e da desvalorização do trabalho. Significa fazer prosperar exemplos empresariais e de cidadania como os de Alfeo Venevala, "Nelito das bananas”, Luís Nunes, a aldeia Camela Amões, entre outros exemplos dignos de realce, mas sonegados pelo mau trabalho do jornalismo que continua demasiado concentrado em Luanda e não nos permite ter uma real fotografia do país, como nos mostraram os companheiros do "Andar o país”.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião