Dossier

Enfermeiros assinalam Dia da Saúde

Uma ambulância pára bruscamente à entrada do Banco de Urgência da Clínica Multiperfil. As portas da viatura são abertas à pressa e é retirado um homem com vários ferimentos.

25/09/2011  Última atualização 08H33
Arimateia Baptista © Fotografia por: O enfermeiro precisa ser tolerante e mostrar empatia para com o doente e acatar os conselhos dos mais antigos na profissão

Uma ambulância pára bruscamente à entrada do Banco de Urgência da Clínica Multiperfil. As portas da viatura são abertas à pressa e é retirado um homem com vários ferimentos. Domingos Manuel, o enfermeiro de serviço, é a primeira pessoa, na clínica, a prestar assistência ao sinistrado. “Tem acompanhante?”, pergunta, enquanto faz respiração artificial à vítima e a encaminha para a sala de emergência.
Estamos perante um caso de atropelamento com risco de vida. Habituado a estas situações, Domingos Manuel sabe que o seu papel e dos demais membros da equipa é fundamental, por isso não perde tempo, pois cada segundo é precioso na luta por manter os sinais vitais da vítima.
“A vantagem disso é que, às vezes, chega um paciente grave e consegue-se estabilizar o sinistrado”, disse o enfermeiro, depois de atender o jovem atropelado.
É assim, a rotina diária dos profissionais de enfermagem. São eles os primeiros a receber os pacientes quando estes entram numa unidade hospitalar, até que o doente tenha a assistência de um médico.
Domingos Manuel é um dos 15 mil enfermeiros existentes em Luanda. Em todo país, o “exército” dos também chamados “homens da seringa” chega aos 27 mil profissionais, que todos os dias exercem um trabalho silencioso, que salva muitas vidas humanas.


Dedicados à profissão


A dedicação e o amor à profissão levou Domingos Manuel e a sua equipa a cuidar, há cerca de dois anos, de um paciente que ficou tetraplégico. “Esse paciente tem sido assistido em sua casa. Para ele, nós somos os anjos aqui na terra e isso dá-nos uma enorme alegria e demonstra que o nosso trabalho é bem realizado”, explicou.
Para Suzana Sumbelelo, enfermeira na mesma clínica, o médico cura, mas o técnico de enfermagem cuida do paciente. “Isso muitas vezes envolve dar ânimo ao doente quando, por exemplo, são informados que têm uma doença crónica ou que morrerão dentro de pouco tempo. É preciso ser mãe para o doente”, afirmou.
Técnico de enfermagem, Lisandro da Silva exerce a profissão há quatro anos nesta unidade hospitalar. Para ele, é preciso ter capacidade para encarnar a dor e a angústia que o paciente sente, com o fim de o ajudar. “É necessário ter bondade e paciência. É preciso estar sempre disposto a aprender mais sobre enfermagem e medicina, de uma forma geral, pois existem coisas que só aprendemos no dia-a-dia”, adiantou.
Vânia Ernesto, que exerce a função de coordenadora das enfermeiras das consultas externas, defendeu ser preciso demonstrar cordialidade no atendimento ao paciente.
“O enfermeiro precisa ser tolerante e mostrar empatia para com o doente. Uma boa enfermeira precisa ser estudiosa, observadora e extremamente profissional”, disse, sublinhando que o enfermeiro que não for abnegado, que seja egoísta e não dê importância aos conselhos dados por aqueles que estão há mais tempo no sector da saúde, não vai atender bem o paciente e terá dificuldades com os seus colegas.
A enfermeira Clementina Queirós considerou ser indispensável que o profissional de saúde possua várias qualidades. “Deve ser flexível, tolerante e paciente”, sublinhou, acrescentando que o enfermeiro tem de ser uma pessoa aberta, adquirir outros conhecimentos e ter habilidade para se dar bem com os colegas e a hierarquia médica.
“Precisa ser rápido a assimilar novas habilidades a fim de continuar a ser eficiente”, frisou.
Exercendo a profissão de enfermeiro há mais de 10 anos, Manuel Pedro disse que o amor ao próximo é um dos factores importantes para desempenhar com zelo e dedicação a enfermagem. “É preciso ter amor ao próximo para realmente querer ajudar as outras pessoas. É preciso saber lidar com o stress, porque em enfermagem é tudo ou nada”, disse.


Horas de trabalho


A bastonária da Ordem dos Enfermeiros de Angola, Maria Teresa Vicente, disse que, enquanto existirem doentes, haverá sempre necessidade de profissionais de saúde.
“Não é possível existir saúde sem o profissional do ramo”, sublinha, acrescentando que estudo e treino prático, por um período de quatro anos, e experiência são requisitos essenciais para se desempenhar bem o papel de enfermeiro.
O regime jurídico da carreira, que foi aprovado em 17 de Novembro de 2010, através do decreto presidencial nº 254, pretende fixar uma jornada de trabalho de 30 horas semanais.
Maria Teresa Vicente informou que a redução das horas de trabalho vai trazer mais qualidade de vida aos profissionais e pacientes. “Até ao momento, aguardamos que seja aplicado, para permitir que os profissionais se sintam melhor enquadrados em função da sua formação e competências”, explicou.
Fazendo uma avaliação do trabalho feito pelos enfermeiros, reconheceu que estes técnicos se têm esforçado muito no desempenho das suas funções, mas que a assistência ainda não é aquela que a Ordem dos Enfermeiros deseja. Para se atingir esse objectivo, a Ordem tem estado a realizar cursos de formação e acompanhamento aos profissionais, no sentido de colmatar algumas falhas existentes. Acrescentou que existem três classes nos técnicos de enfermagem: técnico básico, médio e superior, além dos que já atingiram doutoramento e pós-graduação.
“É obrigatório que todos os enfermeiros estejam inscritos na Ordem dos Enfermeiro de Angola para exercerem a profissão”. 


Os desafios


Além de alegrias, estes profissionais enfrentam muitos desafios. Eles não podem cometer erros ao dar remédios, recolher sangue, inserir um dispositivo intravenoso ou simplesmente mudar um paciente de posição.“A enfermeira tem de ser extremamente cuidadosa. Não pode dar-se ao luxo de errar”, salientou Maria Teresa Vicente.
A bastonária acrescentou que os enfermeiros têm sido ignorados naquelas situações em que notam algum erro cometido pelo médico na hora de prescrever a medicação a ser seguida pelo paciente.
“O enfermeiro vive situações difíceis não só com o paciente, porque existem aqueles casos em que ele acha que o médico prescreveu o remédio errado ao doente, ou deu instruções que não são as melhores para o tratamento. Infelizmente, alguns médicos não aceitam prontamente as suas sugestões. Nesses casos, o enfermeiro tem de se limitar”, disse a bastonária com alguma tristeza no olhar.


Enfermeiro versus doente


O excesso de pessoas que procuram os serviços das unidades hospitalares faz com que, algumas vezes, os enfermeiros sejam mal compreendidos pelos doentes e familiares que desejam ser logo atendidos à chegada.
“Ela chegou agora, como é que já está a ser atendida?”, ouve-se diariamente nos hospitais, lembrou a bastonária, explicando que estes constrangimentos colocam muitas vezes os técnicos de enfermagem em situação de insegurança no local de trabalho.
Os técnicos avaliam os pacientes de acordo com a gravidade da patologia, sendo que os casos mais graves são atendidos imediatamente, explicou. “As equipas de enfermagem correm um risco maior de sofrer abusos e violência no local de trabalho. Muitas vezes, o problema são os pacientes sob efeito de drogas, bêbados, stressados ou pesarosos”, afirmou.


Formação


A gerente de enfermagem da Clínica Multiperfil, Julianda André, que se ocupa da gestão da equipa de enfermagem, garantiu que nos últimos anos se foi tornando cada vez mais necessário que os técnicos de enfermagem tenham maiores conhecimentos profissionais.
“O desejo e a habilidade de entender o que se estuda são essenciais. As enfermeiras também precisam ser capazes de tomar decisões imediatas e agir rapidamente se a situação assim o exigir”, frisou.
Há vários factores que contribuem para o stress dos técnicos de enfermagem, conforme contou Julianda André.
“Quando uma enfermeira não consegue prestar cuidados adequados a um paciente devido ao excesso de serviço, o stress aumenta logo”, sublinhou, acrescentando que “dar o melhor de si, mesmo em favor de pacientes que estão a morrer, pode ser um preço muito alto a pagar no sentido emocional e físico”.