Economia

Fiscalista portuguesa afirma que acordo beneficia Angola

A convenção  que elimina a dupla tributação entre Angola e Portugal, que é votada hoje na Assembleia Nacional, “é mais favorável ao Estado angolano”, considerou ontem, em declarações à agência Lusa a fiscalista Mariana Gouveia, reconhecendo, no entanto, que “vai melhorar a vida das empresas portuguesas”. 

23/01/2019  Última atualização 08H51

“Não me choca o conteúdo da convenção, mas é mais favorável a Angola”, considerou a fiscalista da Miranda & Associados, vincando, ainda assim, que a vida das empresas portuguesas ficará melhor depois da entrada em vigor do diploma, o que não deverá acontecer “antes de 2020, na melhor das hipóteses”.

Em declarações à Lusa, a propósito da votação, hoje, na Assembleia Nacional do convénio para eliminar a dupla tributação entre os dois países, “um momento histórico em termos de política fiscal angolana, já que é o primeiro convénio a ser assinado”, a especialista em tributação internacional disse que a convenção, apesar de positiva, “não é um mar de rosas”.

“A convenção é um passo muito positivo e permite limitar a tributação em certas situações, contudo, não é a convenção mais favorável que Portugal tem celebrado, é aliás bastante menos favorável do que a maioria das convenções que Portugal tem assinado e que estão em vigor, desde logo porque tem uma retenção na fonte de 5,00 por cento em todos os serviços técnicos”, avisou.

No entanto, é “a convenção possível, e é mais protectora dos interesses angolanos”, disse Mariana Gouveia de Oliveira.

“Existem dois grandes modelos de convenções, o da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), que protege os interesses dos países desenvolvidos, e o das Nações Unidas, que protege o interesse dos países receptores de 'know-how' e de capital e serviços técnicos. Sendo Angola um país com muita força negocial, um país relevante para a economia portuguesa, naturalmente que nessa negociação os interesses de Angola tiveram um impacto preponderante”, disse a fiscalista.

“A convenção entre Portugal e Moçambique também tem uma série de cláusulas dentro do modelo das Nações Unidas, mas não é tão favorável a Moçambique como esta é favorável a Angola”, apontou, dando como exemplo o facto de Angola tributar a prestação de serviços pelas consultoras a 5,00 por cento e não a zero, como é prática nestes acordos.

“A convenção prevê a possibilidade de Angola impor uma retenção na fonte de 5,00 por cento na prestação de serviços técnicos feitos por empresas estrangeiras para Angola, mesmo sem presença nenhuma no país, nomeadamente as consultoras, e isto é um aspecto muito atípico, Portugal tem mais de 80 convenções e nenhuma tem uma disposição deste género”, disse a especialista.

“Esta norma inovadora vai muito em linha com as regras domésticas angolanas, que tributam 6,5 por cento pelos serviços prestados por entidades não residentes, e Angola não quis abdicar dessa possibilidade”, contrariando assim o típico modelo de convenções “que é não se poder tributar os lucros das empresas que estejam a funcionar num país e a prestar serviços para o outro”.

Isto, conclui Mariana Gouveia de Oliveira, “vai ser muito importante porque temos muitas empresas em Portugal que prestam serviços para Angola” e que, portanto, vão ver a tributação reduzida, porque a taxa máxima desce de 6,5 para 5,00 por cento.

A Convenção para Eliminar a Dupla Tributação em Matéria de Imposto sobre Rendimento e Prevenir a Fraude e Evasão Fiscal entre as Repúblicas de Angola e Portugal terá um período inicial de vigência, para os termos do acordo, de oito anos.

A proposta já foi aprovada na sexta-feira pelo Parlamento português, cabendo hoje a vez à Assembleia Nacional de Angola. O objectivo do acordo é “desenvolver” as “relações económicas e reforçar a  cooperação em matéria fiscal” entre os dois países.