Reportagem

Terrenos infra-estruturados postos à venda no Kilamba

A Empresa Gestora de Terrenos Infra-estruturados, EGTI, EP, criada por Decreto Presidencial, em 2015, para atender a administração e gestão racional das infra-estruturas e dos espaços infra-estruturados do país, está a preparar uma campanha de venda de terrenos infra-estruturados, na centralidade do Kilamba, numa área total de 658 841,71 metros quadrados, o correspondente a 65 hectares.

14/11/2019  Última atualização 13H05
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 Os preços, no Kilamba, giram em torno do equivalente em kwanzas a 214 dólares por metro quadrado, já que o actual não corresponde ao valor de mercado.

O objectivo é vender terrenos “prontos a construir”, à partida com energia, água, saneamento e arruamentos. Contudo, mais do que isso, o Estado pretende evitar que os terrenos continuem a ser objecto de ocupação ilegal, impossibilitando a sua comercialização. Por enquanto, em Luanda, a empresa desenvolve a actividade nos terrenos das cidades do Kilamba, Sequele e Camama, perspectivando o fomento e desenvolvimento de projectos imobiliários privados, já que entende que toda a concessão de direitos de superfície sobre terrenos a ser feita, nesta nova fase, segue uma estratégia urbana, que visa captar “projectos âncora” que garantam emprego, serviços de qualidade e extensas áreas verdes.
Em entrevista ao Jornal de Angola, o presidente do Conselho de Administração da Empresa Gestora de Terrenos Infra-estruturados, Pedro Cristóvão, enfatizou que a localização estratégica do Sequele, Camama e Kilamba, associada a outros aspectos, resultam numa procura exponencial de terrenos, o que coloca sobre eles a vantagem de, no quadro da estratégia urbana, captar “projectos âncora” que garantam emprego e serviços.
Vai ser assim, em breve, em mais de 20 cidades de 12 das 18 províncias do país: Luanda, Cabinda, Uíge, Lunda-Sul, Bié, Huíla, Benguela, Namibe, Moxico, Cuanza-Sul, Huambo e Bengo. Uma lógica que visa privilegiar a estratégia da empresa, que passa por desenvolver a sua acção de comercialização e valorização de activos dentro das regras da sustentabilidade urbanística, oferecendo um serviço público de gestão, promoção e comercialização de terrenos públicos e privados do Estado. Além disso, participa no processo de requalificação e desenvolvimento urbano regido pelo Plano Director Geral de Luanda.
Para Pedro Cristóvão, o país deve caminhar para uma direcção em que o cidadão terá de adquirir terreno devidamente identificado e com infra-estruturas necessárias, na base de segurança e certeza jurídica.
“Há esta disponibilidade, mas as pessoas teimam em comprar sempre terrenos ocupados ilegalmente e sem escritura”, advertiu o responsável. A campanha será realizada ainda este ano, num espaço correspondente a 564 lotes para habitações unifamiliares, edifícios multi-familiares, terrenos de uso comercial, saúde, serviços administrativos, escolas e parques urbanos. Numa primeira fase, a campanha deve abranger apenas a cidade de Luanda e, na próxima, todas as províncias, numa altura em que crescem as construções dirigidas.
“Há construções feitas pelos próprios cidadãos em larga escala, em Angola. O que é preciso é apenas uma orientação, ou seja, de terrenos infra-estruturados com o uso dos solos definidos”, disse.

Kilamba, o epicentro

A urbanização de hoje começa no Kilamba, disse Pedro Cristóvão, que considerou a centralidade “epicentro da gestão urbana em Luanda. Esta é a primeira fase de gestão de terrenos infra-estruturados, aprovados e devidamente identificados, seja para lote central, para os macro lotes ou pequenos lotes, os chamados “lotes chorenira”.
“Toda a gestão que a empresa faz no país tem na cidade do Kilamba um espelho”, sublinhou, prometendo investir em áreas abertas para espaços de lazer e serviços múltiplos, numa cidade que cresce a um ritmo vertiginoso.
A estratégia passa por privilegiar a acção no corredor central, com espaços multi-usos que englobem habitação, serviços, comércio, restauração, equipamentos de utilização colectiva e turísticos, sem deixar de parte infra-estruturas e espaços verdes públicos, para proporcionar qualidade de vida e uma componente paisagística diferenciada.
Pedro Cristóvão afirmou que o Estado deixou espaços para que o investimento privado faça construções na cidade do Kilamba, no caso, colégios e hospitais de referência, numa altura em que a centralidade sequer tem um hospital.
“Tem um centro médico, mas não tem um hospital”, referiu o gestor, para quem “tudo isso tornará a cidade mais apetecível, já que a ideia é fazer com que as cidades se expandam e as pessoas encontrem nelas uma base de vida com qualidade, pela disponibilidade de bens e serviços.
Em sua opinião, deve olhar-se mais para esta componente, para que as cidades deixem de ser dormitórios. A empresa está focada no desenvolvimento, num país, com cidades ordenadas, com mobilidade interna e entre o centro e as centralidades.

Preços e títulos

Os preços de comercialização dos terrenos infra-estruturados estão em análise e giram em torno dos 214 dólares por metro quadrado, no Kilamba. O valor está alinhado ao custo das infra-estruturas, embora o de mercado esteja acima disso, principalmente naquela zona. No Sequele e na zona residencial do Camama, 90 dólares, em média, tendo em conta a localização e a finalidade da solicitação. A grande preocupação, para o lançamento da campanha, tem a ver com o problema da regularização dos direitos fundiários, acesso à escritura pública e aos direitos de superfície. Durante a entrevista, Pedro Cristóvão lembrou que hoje o superficiário leva, em média, dois anos, ainda que tenha documentação para obter títulos, prometendo reduzir este tempo para duas semanas.
“Precisamos de encurtar o tempo, de dois anos para uma ou duas semanas, isto é, desde a concessão ao registo predial. Com isso, em menos de um mês, o cliente terá segurança jurídica e poderá construir e investir no espaço”, realçou.O responsável dá ênfase à vantagem de a empresa vender espaços em estrito contacto com os governos provinciais e as entidades licenciadoras, de construção e de loteamentos.
Desta forma, explicou, uma vez concedidos os direitos fundiários, o cliente terá, num curto espaço de tempo, as devidas licenças, contrariando o ainda prevalecente cenário em que o investidor não tem acesso à escritura pública.
“Queremos que as pessoas façam negócios, construam com direitos fundiários e segurança jurídica garantidas e possam ir à banca solicitar investimentos com confiança, em caso de hipoteca do imóvel”, reforçou.

Pedidos oscilam entre os 75 e 80 por mês

Os pedidos de terrenos, para habitação aumentam todos os dias. Em média, são registados, diariamente, três a quatro solicitações, o que corresponde a um total de 75 a 80 por mês, na maioria de pequenos espaços, que, geralmente, não ultrapassam os 300 metros quadrados de área total. As solicitações são de renda média ou renda média-alta, geralmente feitas por jovens. Não há solicitações de rendas baixas, por estarem localizados num espaço infra-estruturado e urbanizado, onde podem ser erguidas casas numa área bruta de mais de 75 metros quadrados, com uma margem de 35 a 40 por cento de índice de implementação.
A empresa estrutura-se, cada vez mais, para disponibilizar terrenos para a construção de habitações multifamiliares, na horizontal ou na vertical, bem como pequenas habitações individuais. Outro maior número de pedidos incide sobre terrenos para edificação de espaços para comércio de pequena dimensão, designadamente lojas de proximidade, barbearias, cafés, escritórios e prestação de serviços. Um terceiro tipo de pedido destina-se a terrenos para a construção de escritórios no corredor central.
O gestor apelou aos clientes que evitem a compra de terrenos em lotes destinados à construção de casas de rés-do-chão, quando pretendem construir mais de um andar. Advertiu que quem assim proceder - uma vez que está definido por instrumento legal - incorrerá em ilegalidade.
“Não será multado, mas terá a casa demolida pelos serviços competentes da administração do distrito, depois do devido processo administrativo ou judicial, se for necessário. O terreno definido para vivendas há-de ser para vivendas, onde for para a construção de um andar a mais, também assim será. Desta forma, teremos terrenos ordenados e destinados para os fins definidos previamente”, esclareceu. A situação que se vive hoje, onde num espaço definido para erguer vivendas são levantados edifícios, deverá conhecer o seu termo. Afinal, serão definidas infra-estrutura para suportar habitações de pisos terrenos, para evitar obstrução ao escoamento das águas residuais, pluviais e abastecimento de outros serviços.
Para o efeito, a EGETI quer trabalhar com as empresas construtoras ou mesmo formar um consórcio para construir casas ao gosto dos clientes, sem violar os padrões de construção estabelecidos.


Vantagem económica

Pedro Cristóvão deixa claro que a EGTI, na sua actuação, não interfere, nem anula a actividade da administração local, distrital e municipal. “Não interferimos, na medida em que a nossa gestão é comercial. Não emitimos licenças de construção, nem temos poder de polícia”, explicou.
As licenças e os impostos, prosseguiu, são tarefas das administrações locais e entidades afins. “Nós simplesmente criamos as condições para que estas administrações sejam auto-sustentadas, com recursos adquiridos da venda de terrenos infra-estruturados”, assinalou.
Ao reinvestir nas infra-estruturas, a empresa não só cria novas estradas, como aumenta a capacidade de distribuição de equipamentos, como água, energia, saneamento básico, estações de tratamento de águas residuais e pontes, esclareceu Pedro Cristóvão. Lembrou que, em muitas ocasiões, encontram terrenos totalmente abertos, sem planos e usos, o que obriga a criar investimentos para depois recuperar.
Neste processo, explicou, são entregues terrenos às administrações, já com tudo, isto é, energia, água e prontos a construir.
“Com isso, a apetência de vender terrenos vai acabar, porque ninguém vai desejar comprar um terreno sem infra-estrutura. Estamos na fase de homologação do nosso relatório e contas do exercício 2018, que foi aprovado com reserva”, disse e sublinha que, até ao momento, os que melhor pagam são os que adquirem terrenos pequenos.
Com 40 trabalhadores, a empresa tem a sede em Luanda, apesar da abrangência nacional. Para isso, criará serviços desconcentrados, que actuarão de modo local. Actualmente, encarregada da gestão de espaços infra-estruturados em 20 cidades de 12 das 18 províncias, a EGTI posiciona-se como instrumento público para as políticas de desenvolvimento urbano.

Construir para realojar

A EGTI deve construir, em breve, mil habitações no Sequele, das quais 350 T2 evolutivas, na fase conclusiva. As restantes estão condicionadas a questões financeiras. As habitações erguidas são para realojamento de cidadãos.
“A empresa tem também a componente de construção, quando chamada a atender o realojamento. O Estado atribui a requalificação à EGTI e esta, por sua vez, verifica se é necessário o realojamento”, disse Pedro Cristóvão. Acrescentou que a maior parte dos activos atribuídos à empresa não tem plano urbanístico ou director, nem de pormenor, o que dificulta a sua gestão comercial. Por isso, a EGTI tem a missão de analisar, onde colocar uma escola, um posto médico, centro desportivo.
“Esse é o nosso ponto de acção, que passa por identificar as potencialidades e ver a envolvente, refazer o esquema de ocupação destas áreas e permitir que tenham todos os espaços necessários para ser considerada uma cidade”, realçou Pedro Cristóvão.
O responsável salientou o facto de a empresa participar, também, na segunda fase de construção da infra-estrutura da cidade do Kilamba, a ser desenvolvida pelo Gabinete de Coordenação para a Construção e Desenvolvimento Urbano das Cidades do Kilamba, Camama e Cacuaco (GCKCC).
O retorno do valor investido pelo Estado em infra-estruturas nas cidades do Kilamba, Sequele e Camama já se faz sentir. Segundo Pedro Cristóvão, no exercício económico de 2018, até 31 de Dezembro, o fluxo de caixa da empresa foi de 8,2 mil milhões de kwanzas, resultado das actividades operacionais, como pagamentos respeitantes a imobilizações corpóreas e incorpóreas, investimentos financeiros e outras rubricas.
Comparados com o exercício do ano anterior, a empresa registou um aumento de mais de três mil milhões de kwanzas, num cenário em que uma das atribuições da EGETI é a gestão e o estudo do mercado, para ver até que ponto pode recuperar o investimento. A ocorrer, devolve directamente aos cofres do Estado, investe em novas infra-estruturas, rentabiliza e expande cidades.
“A ideia é tornar as cidades angolanas auto-sustentadas, para reduzir a pressão sobre os grandes centros urbanos. Além disso, pretende-se reduzir a pressão sobre o OGE, no processo de desenvolvimento de cidades sustentáveis”, realçou.
Com quatro anos de existência, a EGTI foi concebida para fazer a gestão de terrenos infra-estruturados com carácter estratégico. Pedro Cristóvão explicou que, durante algum tempo, o Estado fez investimentos em infra-estruturas, principalmente nas novas centralidades, e olhou para a necessidade de se fazer uma gestão específica, que é gerir terrenos na perspectiva de garantir o retorno do investimento. Neste campo, à EGTI foi atribuída a gestão, comercialização e a regularização dos direitos fundiários.
“A empresa não gere o território nacional no seu todo, apenas aqueles espaços que o Estado atribuir e regulariza os direitos fundiários. De acordo com a legislação do planeamento territorial, os terrenos precisam de ter planos de pormenor, urbanísticos e directores, que definam o uso dos solos”, esclareceu o gestor. Realçou o facto de nem todos os terrenos estarem aptos para comercialização, por falta destes instrumentos de ordenamento do território.
A empresa já requalificou o terreno para realojamento na zona do Sequele.

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