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Turquia tem dois meses para adoptar uma postura positiva

A União Europeia deixa o agravamento de medidas contra a Turquia em banho-maria e, para já, aposta na via do diálogo. Mas o Presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, diz que Ankara tem dois meses para cessar as provocações a Chipre e à Grécia.

03/10/2020  Última atualização 08H10
DR © Fotografia por: Bruxelas dá até Dezembro para que Ankara ponha termo às pressões sobre os vizinhos Chipre e Grécia.

“Consideramos que o mais tardar até Dezembro, antes do fim do ano, voltaremos a este assunto, ao nível do Conselho Europeu, e teremos em conta os desenvolvimentos, que esperamos positivos, que forem realizados até ao mês de Dezembro”, disse, na madrugada de ontem, no final do primeiro dia de cimeira, em declarações ao lado da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Esta, por seu lado, apontou um caminho a Ankara, que, no entanto, não exclui as sanções.

“Claro que a opção das sanções existe”, assegurou a presidente da Comissão, salientando que, “por outro lado, há o caminho construtivo que nós preferimos, e que queremos adoptar, por exemplo, modernizar a união aduaneira. (...), trabalhar com a União Europeia numa declaração sobre as migrações, e numa agenda comum que temos. É, por exemplo, melhorar o comércio entre a União Europeia e a Turquia. E achamos que este é o caminho a seguir”, disse von der Leyen.

A Turquia foi o tema dominante do primeiro dia de uma cimeira extraordinária dedicada à geo-política. Os líderes europeus demoraram-se nas discussões, sobre as mais recentes “provocações” da Turquia a Chipre e à Grécia. O tema deveria ter sido colocado para discussão à mesa do jantar. Mas, ao início da tarde, já se percebia, pelo tom de algumas declarações, que a paciência de alguns Estados-Membros, com o vizinho, candidato à adesão, está próxima do limite.

À chegada ao encontro, o Primeiro-Ministro grego, Kyriakos Mitsotakis, afirmou que “as provocações da Turquia já não podem ser toleradas”. E, por isso, entende que “chegou a hora de a Europa discutir com sinceridade e coragem, que tipo de relação quer ter com a Turquia”. “Uma coisa é certa: o comportamento provocador da Turquia, quer se manifeste por meio de acções unilaterais ou de uma retórica extrema, já não é aceitável”, vincou Mitsotakis.

Nas últimas semanas, o Mediterrâneo Oriental voltou a ser palco de tensões, com movimentações militares turcas na região, elevando o receio de Chipre e Grécia sobre um conflito. O tema ganhou destaque na agenda da cimeira e começou a ser debatido imediatamente após o arranque dos trabalhos. A chanceler alemã, Angela Merkel, que até ao final de Dezembro assume a presidência rotativa da União Europeia, diz-se empenhada na via do diálogo e promete que “fará um esforço para encontrar uma resolução pacífica”.

“Temos grande interesse em continuar a ter uma relação construtiva com a Turquia ao longo deste processo”, garantiu Merkel, admitindo como “importante resolver a tensão, através da diplomacia”. O Presidente francês, Emmanuel Macron, foi mais longe no debate, tendo afirmado mesmo que “a União Europeia precisa de repensar a política de vizinhança”, pois considera que “a solidariedade para com a Grécia e Chipre não é negociável”.

Por isso, vê a “necessidade da União se envolver noutra forma de diálogo com a Turquia”. Para o Primeiro-Ministro grego, a abordagem a este debate deve ter em conta que a actuação de Ankara “viola os direitos soberanos de dois Estados-Membros da União Europeia, nomeadamente, a Grécia e Chipre, mas também porque atinge importantes interesses geopolíticos europeus no Mediterrâneo”.

“Temos dois caminhos em aberto: o primeiro, o do diálogo, da diplomacia, apoiado no respeito do direito internacional e na prevenção de acções unilaterais, e o das relações de boa vizinhança”, apontou. Dramatizando o discurso, Kyriakos Mitsotakis avisou que “o outro caminho é a escalada de tensões, que resultará na adopção de medidas por parte da UE.

A Grécia mostrou a sua disposição de seguir o primeiro caminho, mas afirmou também que depende da disposição da Turquia de fazer o mesmo. Algo que, disse, “terá de ser consistente”. A presidente da Comissão Europeia reforçou as palavras do Primeiro-Ministro grego, confiante no “apoio dos Estados-Membros à Grécia e a Chipre”.

Ursula von der Leyen vincou também a ideia de que “existem duas possibilidades para o desenvolvimento das relações entre a UE e a Turquia: o aumento das tensões ou o abrandamento”, deixando em aberto que a via das sanções não está excluída. Porém, “a UE prefere um caminho de desaceleração e a construção de uma agenda positiva em conjunto”, embora admita que Bruxelas tem “a caixa de ferramentas necessária para qualquer situação possível”.

“É um momento de divisão das águas”, considerou o Alto Representante da União Europeia para a política externa, Josep Borrell, a falar sobre o relacionamento do bloco, com o vizinho turco, tendo como objectivo “evitar a escalada do conflito sobre a delimitação das águas territoriais”.

Sanções à Bielorrússia

Na mesma cimeira, a União Europeia conseguiu finalmente a unanimidade para avançar com sanções, depois de um resultado eleitoral que Bruxelas considera falso. “Através de procedimento escrito, iremos aplicar as sanções à Bielorrússia. E, como se sabe, o que está em cima da mesa é uma lista, de cerca de 40 nomes.

E gostaríamos de considerar que o povo da Bielorrússia tem o direito de determinar qual é o próprio futuro”, anunciou o presidente do Conselho Europeu.
Aliás, Josep Borrell elegeu este como tema principal da cimeira: o debate sobre a forma de a União Europeia “lidar com as sanções contra a Bielorrússia e como superar as importantes dificuldades que enfrentamos nos últimos tempos”.

O chefe da diplomacia europeia tinha incumbido os líderes europeus de discutir o tema, depois de há menos de duas semanas ter reconhecido que a União Europeia falhou a unanimidade para aplicar sanções àquele país. Num documento de trabalho, a partir do qual são elaboradas as conclusões da cimeira, que foi consultado pelo Diário de Notícias, lê-se no texto provisório que os líderes “concordam com a imposição de medidas restritivas e convida o Conselho a adoptar a decisão sem demora”.

O Conselho Europeu condena ainda “a violência inaceitável por parte das autoridades bielorrussas contra manifestantes pacíficos, bem como a intimidação, as prisões e detenções arbitrárias na sequência das eleições presidenciais, cujos resultados não reconhece”. 

O documento prossegue com uma manifestação de apoio ao “direito democrático do povo bielorrusso de eleger o seu Presidente através de novas eleições livres e justas, sem ingerências externas”, e com um apelo ao “fim da violência e repressão”, e pede que as autoridades “libertem todos os detidos e presos políticos, respeitem a liberdade dos meios de comunicação e a sociedade civil e iniciem um diálogo nacional inclusivo”.

Pressão sobre a China

Os líderes europeus aprovaram, “sem debate”, as declarações dos representantes do bloco europeu, na cimeira com o presidente Xi Jinping, e apelaram às autoridade chinesas para “assumir uma maior responsabilidade”, nomeadamente em matéria de clima, pedindo “a tomada de medidas mais ambiciosas”, depois de Pequim se ter comprometido a alcançar a neutralidade carbónica em 2060, uma década depois do compromisso europeu.

Nagorno-Karabakh

O conflito do território disputado de Nagorno-Karabakh foi um dos tópicos mais breves na discussão, em que os 27 apoiaram um apelo europeu “à cessação imediata das hostilidades e instara as partes a renovarem o seu empenhamento num cessar-fogo duradouro e na resolução pacífica do conflito”.

Alexei Navalny

Como se esperava, o Conselho Europeu “condenou a tentativa de assassinato de Alexei Navalny com um agente químico nervoso do grupo “Novichok”.
“O uso de armas químicas constitui uma violação grave do direito internacional. O Conselho Europeu apela às autoridades da Federação Russa para que cooperem plenamente com a Organização para a Proibição de Armas Químicas, afim de assegurar uma investigação internacional imparcial”.

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