Sociedade

Mais de 200 mil pessoas afectadas pela estiagem

Hermínio Fontes | Benguela

Jornalista

Nos dez municípios que compõem a província de Benguela, pelo menos 278 mil e 875 pessoas enfrentam dificuldades alimentares decorrentes dos efeitos da estiagem, que eclodiu, em Outubro do ano passado, logo após o arranque da campanha agrícola 2020/2021, disse ao Jornal de Angola o presidente da União Nacional dos Camponeses Angolanos (UNACA) - Federação de Benguela.

11/02/2021  Última atualização 15H40
© Fotografia por: DR
Simão Januário, que falava no final da visita que efectuou aos vários campos agrícolas de um total de 13 das 33 comunas que a província possui, disse que "a situação é lastimável” porque os números podem aumentar se neste mês de Fevereiro não chover.

"Nesta altura, pelo menos 25 mil e 735 hectares de terra encontram-se irrigados e os camponeses esperam colher algumas quantidades de alimentos. Mas se não chover, os camponeses locais vão ficar sem água, e os aquíferos vão baixar, consideravelmente.

Segundo o responsável da UNACA em Benguela, neste momento, apenas a bacia hidrográfica da Catumbela assegura a agricultura por regadio sem sobressaltos na bacia do Coporolo, com dez mil hectares de terras cultiváveis, e nas localidades da Bandeira e do Cuio, onde as motobombas já não conseguem sugar a água, porque o nível freático baixou muito.

"Na bacia do Cavaco, a situação não é diferente, praticamente já não há água. As bombas de sucção apenas puxam a água no período que vai das cinco da manhã às 12 horas, e depois já não se consegue mais nada”, explicou.Simão Januário referiu que, nesta Campanha Agrícola 2020/2021 somente o sector cooperativo, que congrega 620 organizações, com um total de 54 mil e 775 membros inscritos, perspectivou colher pelo menos 77 milhões e 431 toneladas, entre cereais e produtos diversos.

Referiu que os filiados da UNACA prepararam cerca de 103 mil e 166 hectares de terra, com diversas culturas, e que as perdas poderão ultrapassar os três mil milhões de kwanzas, que incluem os investimentos imputados na preparação de terras, custos com a mão-de-obra e sementes na proporção de 25 quilogramas implantados em cada hectare cultivado.

Desassoreamento do rio Catumbela

O Governo Provincial de Benguela, em parceria com as Empresas de Águas e Saneamento do Lobito e Benguela e a DTAGRO, lançaram mãos aos trabalhos de desassoreamento do rio Catumbela, para facilitar o aumento da quantidade de água no canal que alimenta os campos agrícolas, e a sua distribuição às populações do litoral da província de Benguela.A acção incide sobre o levantamento das barreiras, para maior acumulação das águas na albufeira, e o desassoreamento de sete quilómetros e meio de valas, que beneficiam mais de seis mil famílias camponesas.
Uma nota do Gabinete de Comunicação e Institucional e Imprensa do Governo Provincial indica que, a primeira fase decorreu no princípio do mês em curso, sob a égide da Administração Municipal da Catumbela, e contou com a participação de 1.500 camponeses da localidade, tendo os trabalhos incidido na reposição do dique de retenção da represa do rio Catumbela, assim como a remoção da vegetação ao longo do canal de adução da água.O desassoreamento do rio vai permitir que haja maior fluidez da água, uma vez que as fortes chuvas que se registaram no ano passado causaram a erosão do dique de contenção, o que implicou a diminuição da quantidade de água, prejudicando tanto a agricultura como o seu fornecimento à população.

Dados elaborados e apresentados recentemente, pelo Gabinete Provincial da Agricultura, Pecuária e Pescas sobre os efeitos da estiagem na província, indicam que o fenómeno afecta cerca de 85 por cento de toda a produção realizada na primeira fase da Campanha Agrícola 2020/2021.De acordo com o director do Gabinete Provincial da Agricultura, Pecuária e Pescas, José Gomes da Silva, o plano visa salvar a segunda fase da campanha agrícola em curso. "Vamos apostar em culturas de pequenos ciclos, com espécies como a massambala, massango, batata-doce e milho, por serem culturas que levam apenas três a quatro meses de produção”, explicou.

José Gomes da Silva admite que, agricultores e camponeses que cultivam nas bermas dos rios terão alguma possibilidade de colheitas no final do primeiro ciclo da campanha agrícola. "Visitamos os campos agrícolas e verificamos que as culturas continuam a secar, principalmente do milho, e o diagnóstico mostra que ainda que a chuva caia nos próximos dias, não conseguiremos salvar nenhuma cultura, porque já perderam o seu ciclo vegetativo de crescimento”, lamentou.
Além da escassez alimentar decorrente da estiagem, o responsável do sector agro-pecuário da província de Benguela disse que o fenómeno já afectou a qualidade do pasto e da água para o abeberamento dos animais, por isso acredita que se a situação prevalecer o gado vai começar a morrer em grande escala, na região, e haverá perdas de valores financeiros avultados por parte dos criadores e, consequentemente, provocar a subida do preço da carne.

Sobre a seca, o director do Gabinete Provincial da Agricultura, Pecuária e Pescas, José da Silva, lembra que a província possui um histórico negativo. Em 2014, por exemplo, houve um período de estiagem severa que culminou com a morte de centenas de cabeças de gado bovino, no município do Caimbambo."Por esse motivo, o plano de mitigação que apresentamos ao governador provincial passa, também, pela abertura de chimpacas”, assegurou o responsável. Para evitar a dependência das chuvas, José da Silva referiu que o governo deverá optar por uma agricultura de regadio, com uso de motobombas e outros meios e equipamentos mais apropriados.

Bocoio e Balombo


Mais de 50 mil famílias camponesas dos municípios do Bocoio e Balombo correm o risco de enfrentar uma crise alimentar devido à estiagem. Falando, há dias, à Rádio Lobito, o responsável da Agricultura e Pecuária no Bocoio, Evaristo Félix, revelou que pelo menos 24 mil famílias camponesas poderão perder as suas culturas."Para este ano agrícola, foram preparados 85 mil hectares para cultivo de produtos diversos e cerca de 80 por cento da produção já estragou, devido à falta de chuvas”, informou.

Segundo Evaristo Félix, os camponeses que aproveitaram as primeiras chuvas ainda poderão colher alguns produtos para o seu auto-sustento, mas esses são uma minoria. Sobre o potencial agrícola do Bocoio, destaca-se a produção de milho, batata-doce, feijão e ananás em grande escala.Já no Balombo, mais de 43 mil hectares de culturas diversas foram preparadas para esta campanha agrícola e os camponeses estão igualmente desesperados, clamando por apoios. De acordo com Celestino Huambo, que na altura interinava a direcção municipal da agricultura, "a situação é grave, na medida em que a maior parte da população deste município vive da agricultura”.

O Balombo produz maioritariamente feijão, batata-doce e rena, amendoim e hortícolas. A campanha agrícola 2020/21 foi lançada em Outubro deste ano, pelo governador provincial Rui Pinto de Andrade, na comuna de Makamombolo, que dista 28 quilómetros da sede do município de Balombo.

 Hermínio Fontes e Adão Faustino | Benguela


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