Opinião

O sentido do debate

O papel de alguma oposição nestes dias de discussão sobre a revisão pontual da Constituição da República lembra muito aqueles filmes que, de tanto assistirmos, já lhes conhecemos a narrativa, os diálogos e o final. Não é preciso olhar para a tela, para identificar o protagonista da fala. Contam-se nos dedos de uma só mão os assuntos do país em que se avançou na discussão.

28/03/2021  Última atualização 11H27
Os orçamentos são bem o exemplo disso. Uma evidência clara ocorreu, no passado, com a aprovação da Constituição da República, que hoje está a ser alvo de debate para uma revisão pontual.
Depois de meses a fio a discutir linha por linha (se não mesmo palavra por palavra), depois de longas discussões, muitas horas de trabalho conjunto, para encontrar pontos convergentes, eis que uma parte que concordou com a quase totalidade do documento (com propostas de todos os partidos) decidiu abster-se na votação final. No momento decisivo, decidiu não validar o documento, que hoje serve de guia para a vida de toda a nação.

Outro exemplo recente (no Google há tantos) foi da definição da aplicação das autarquias, gradual ou geral. Sem consenso (enquanto o povo aguarda), eis que surge a iniciativa do Presidente da República para ultrapassar este obstáculo, trazendo à discussão a retirada da norma da Constituição, através de uma revisão pontual, daqueles artigos que provocavam o impasse nas grandes questões do país. Agora, a exigência é outra. A revisão deve ser mais abrangente, abarcar outros pontos nunca discutidos!

Se as questões propostas na revisão pontual constituíram, até muito recentemente, barreira para o estabelecimento de consensos em questões fundamentais, como as autarquias ou a harmonização do processo democrático, com acusações de excesso de poderes do Presidente da República ou a necessidade de fiscalização dos actos do Executivo, o sinal para a remoção destes obstáculos devia ser saudado, comemorado. A discussão não é se a revisão deve ser pontual ou se é a mudança de todo o texto constitucional, mas o impacto do trabalho a ser feito na busca de soluções para o povo.

Porque a vida não é estática; o que hoje é avançado como profundo, certamente não será amanhã. Nem é preciso aguardar o término das discussões para o contexto que motivou a proposta inicial se alterar, ao ponto de chegar à decisão final com a eficácia reduzida ou comprometida. O caminho faz-se caminhando. É importante não retroceder nas conquistas alcançadas. Isso é consolidar a democracia. O povo foi às urnas, porque confiou nos senhores e precisa de sentir que valeu a pena dar-vos esta responsabilidade. Não o tomemos por ignorante. Ele sabe que não há soluções prontas para todos os seus problemas e espera dos seus representantes seriedade e responsabilidade no tratamento das questões.

Discutir o que realmente importa, para a remoção dos obstáculos que impedem o bem-estar. Discussões eternas em nada ajudam. Um debate com elevação é o mínimo que se pode esperar. É preciso acabar com esta mania de pensar que ser de outra família política só faz  sentido se contrariar. É verdade que as divergências existem e vão sempre existir. Mas, em política, oposição não significa, somente, opor-se a iniciativas de outrem. Virar sempre à esquerda, quando o outro vai à direita, muitas vezes por incapacidade de ver as coisas ou  baralhar para esconder a insuficiência intelectual.

Será que ainda não perceberam que esta postura de estar sempre do lado contrário, além de beliscar a imagem do partido, mais prejudicado que ajuda o país?  Não quero acreditar que seja apenas vontade de baralhar as mentes para que os eleitores não se apercebam da incapacidade dos senhores em participar neste debate para encontrar os melhores caminhos para o país. As discussões não precisam de ser intermináveis.
O país precisa de avançar, senhores!

Cândido Bessa

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião