Cultura

Os novos talentos da guitarra

Analtino Santos

Jornalista

Mário Gomes, Yark Spin, Texas e Sankara tornaram-se nos principais rostos da nova geração de guitarristas. O primeiro pela sua entrega às sonoridades jazzísticas e, timidamente, à música angolana de raiz; o segundo pela capacidade de congregar outros jovens e a versatilidade na rítmica; o terceiro pela aparição, ainda miúdo, na Banda de Yuri da Cunha; e o quarto por ser muito solicitado nas produções de música angolana. A estes quatro jovens provenientes da safra de guitarristas da Igreja Tocoísta, ou seja, filhos do Nkembo, juntam-se outros nomes com potencial, como Nzangu-Nsau, Cláudio Click-Clack, Elias, Pascoal, Toty Samed, Clóvis Esteves, Dany e outros que hoje são opções nos mais diversos projectos musicais

23/05/2021  Última atualização 18H41
© Fotografia por: DR
Esta geração não se fica apenas pelos ritmos nacionais, onde agora está a apostar. Navega desde a Soul, Rock, Blues, Rumba Congolesa, Samba e outros estilos com forte influência do Jazz e suas ramificações, onde, aliás, muitos despontaram. É unânime que os seus expoentes são tecnicistas e estudiosos. Conseguem repetir o que já foi feito. Mas o que se espera deles é que no futuro possam criar temas próprios e que os produtores e promotores não os tenham como simples jovens que revisitam clássicos.

Não podemos esquecer que no passado Dúia (Gingas), Marito (Kiezos), Zé Keno (Jovens do Prenda), Nito - agora Belmiro Carlos (África Ritmos, África Show e Kissanguela), Mário Fernandes (Negoleiros do Ritmo), Sebastião Matomona (Ngoma Jazz), Constantino (Águias Reais), Baião (África Show e Jovens do Prenda), Dominguinho (Dimba Ngola), Jajão (Anjos), Botto Trindade (Bongos), Nelito (Os Astros), Zé Maria (Os Corimbas), Luizito, hoje Dikambu (Dimba Ngola), Brando (FAPLA-Povo e Kiezos), e outros, contribuíram para a redefinição e a caracterização da malha da música popular angolana. Posteriormente nomes como Teddy Nsingui, Betinho Feijó, Kintino, Pop Show, Zé Mueleputu, Nelson Santos, Nelas do Som, João Mário, e outros, nos finais dos anos 70 e princípio dos 80 vão seguindo e inovando, abrindo caminho para uma geração onde o miúdo Simmons Mancini, apadrinhado por Eduardo Paim, deixa a sua marca, assim como Pirica Dúia e, mais tarde, Isáu Baptista, que aparece um pouco mais cedo que os nomes mencionados na abertura deste texto e ganha visibilidade na Banda Maravilha.


Mário Gomes


A história deste executante no cenário musical começa com um vídeo que partilhou e chegou aos músicos Toty Samed e Nino Jazz, que sentiram a vibração do calibre de George Benson, Norman Brown e de outros mágicos da guitarra. É o jovem que motivou a frase de Dodó da Terrex, quando disse que a música angolana tem futuro. Foi projectado aos 18 anos de idade num concerto de Totó ST, que aconteceu na III Trienal de Luanda.
O produtor e pianista Nino Jazz o cooptou para as suas produções musicais e direcções artísticas. O miúdo Mário Gomes passou a ser o guitarrista dos principais nomes do Afrojazz nacional, como Filipe Mukenga, Totó ST, Sandra Cordeiro, Kizua Gourgel, Afrikkanitha, Vladimiro Gonga e outros.
O seu primeiro grande encontro com os aficcionados do Semba surgiu no Show do Mês dos Kiezos em 2019, onde solou Marito. Depois surgiu a rendição total dos amantes do Semba no Festival de Música Instrumental, onde dedilhou Mário Fernandes, Carlitos Vieira Dias, Botto Trindade e, novamente, Marito. Guitarrista do pessoal do Jazz nacional nos últimos três anos e eleito nas formações de Jazz standard e fusion de JJ Belo. Não é por acaso que é um dos instrumentistas de cartaz nas últimas comemorações do Dia Internacional do Jazz.

Yark Spin


É um guitarrista que combina muito bem o solo e o ritmo, um congregador de amigos em projectos musicais, como aconteceu com a Banda Prontidão. Nos últimos tempos tem usado as redes sociais para dar dicas de como tocar os ritmos angolanos. Aprendeu a tocar com os irmãos Chiquinho e Pedrito, que se ficaram apenas pela música religiosa. Há dez anos no activo, a sua carreira começou com uma curta passagem pelos Originais do Prenda, onde na altura era baixista. Depois foi levado pelos amigos Mayo (baixo) e Pascoal (solo), colegas no grupo Juventude Central, afecto à Igreja Tocoísta, para entrar na Banda Jabumba em substituição de Clóvis Esteves na viola-ritmo. Como outros ex-integrantes, considera que esta formação foi uma grande escola de aprendizado da música angolana. Com o fim deste projecto, com os amigos cria a Banda Kandengue e acompanham artistas como Eddy Tussa e Ary, quando estes, na altura, respectivamente, tinham como grandes sucessos os álbuns "Zenu Mutale” e "Sou Louca Por Ti”.
Fez ainda parte da banda Muzangola, acompanhando artistas como Pérola, Heavy C, Puto Português e outros, antes de montar a banda de Maya Cool e ser integrante da banda do Show do Mês.  Yark Spin tem como referências Teddy Nsingui, Botto Trindade, Zé Mueleputo, Alex Samba, Paulino, Kintino da Banda Movimento, Pirika e Betinho Feijó, este que lhe deu o traquejo de fazer o solo e o ritmo ao mesmo tempo. Outras referências suas são Carlitos Vieira Dias e, claro, Zeca Tirilene. Agora, com os seus colegas e amigos, está a criar a Banda Prontidão.

Nsangu Zanga

 
Começou a dar nas vistas como guitarrista de Ndaka yo Wiñi. Desde muito cedo sentiu-se atraído pelos artistas consagrados Carlos Lopes, Banda Maravilha, Papa Wemba, Lokua Kanza, Salif Keita, Bob Marley e, sobretudo, pela música gospel.
Começou na percussão com alguns materiais metálicos, simulando uma bateria. Foi depois influenciado para que aprendesse e tocasse uma bateria  verdadeira na igreja. Ainda no meio religioso, tornou-se dançarino, declamador e coreógrafo. Aos 18 anos começou a aprender guitarra com um dos estudantes finalistas do Instituto Nacional de Formação Artistica (INFA). Não parou de tocar bateria nas bandas TDC (onde se destacou pelo facto de ter sido o baterista do então "Movimento Artístico-Cultural Gospel no Ar” e, ocasionalmente tocava para nomes como Irmã Sofia, Dodó Miranda,  e outros) e Surpresa (criada pelo seu professor de guitarra).  
 De seguida, tornou-se guitarrista (ritmista) de Kyaku Kyadaff. Na sua lista de artistas que acompanhou constam  Ary, Roxanne, Coreon Du, Euclides da Lomba... Teve participação nos projectos  Bar da Luandina e outros ligados ao Jazz e à música alternativa. A passagem pelo Cape Town Jazz Festival, com Ndaka yo Wiñi, é um dos seus grandes feitos. Também tem apostado no canto.
Elias, integrante de uma das bandas da Polícia Nacional, é outro produto da Igreja Tocoísta, um bluesman e jazzman. Ao ouvi-lo a tocar sente-se a forte influência de George Benson. No passado partilhou o palco algumas vezes com Wyza, Filipe Mukenga, Pascoal Mussungo e outros do circuito do Jazz Fusion. Também navega pela música angolana de raiz. Colaborou com a Banda Maravilha e com ela teve passagens pelo Show do Mês. Durante a III Trienal de Luanda acompanhou nomes como Carlos Lamartine, Santos Júnior e outros artistas que passaram pelos palcos do Palácio de Ferro.
Sankara


O rapaz do Lobito que teve na viola pré-fabricada oferecida pelo avô Amândio Sachilepa o seu primeiro instrumento musical, começou a dar os primeiros toques em casa do professor Venâncio Chindombe, no bairro da Boa Esperança, no Lobito. Lá foi aprendendo os hinos religiosos.
 Mais tarde conheceu os professores Augusto Amaral e Dinho, no Alto Liro, ainda no Lobito, e posteriormente aconteceu o encontro musical com Ferro Doran, que pacientemente o ensinava como ao seu filho. Afirma-se no palco da Igreja Tocoísta no Lobito em 2005, com o apoio de Manuel Branco.
Sankara é eternamente grato a todos os mestres que o ensinaram. E é com esta humildade que enfrenta outros desafios. Afirma que embarcou na música como forma de sustento. A  partir de 2008 foi surfando por várias bandas locais: Banda Juvenil, Flamingo e Banda KS, todas do Lobito e Ondjango (Catumbela). Em Luanda desde 2010, dentre várias formações integrou  a Banda Voga, liderada por Flay, afecta à brigada artística da Força Aérea, onde teve a honra de aprender mais com o mestre França Camalengue.
Em palco tem acompanhado os principais nomes da nossa praça e, a nível internacional, da sua lista constam Jacob Desvarieux, Guilou, Eric Vidal, Luck Leandry, Jorge Neto, Micas Cabral, Beto Dias, Nando Cruz e outros.  Em estúdio tem trabalhado com muitos produtores nacionais, mas destaca Livongh. Um dos dias mais marcantes da sua carreira foi quando recebeu a guitarra Peerless, que lhe foi oferecida por Euclides da Lomba

Clóvis Esteves


É outro talentoso guitarrista, um rosto muito visível nos projectos de música de fusão, onde o Jazz, Funk, Soul e Rock estão em evidência, mas não fica apenas por aí. Também é chamado para projectos de música nacional, aliás, fez parte dos instrumentistas que acompanhavam os artistas nos programas da TV Zimbo e na Banda Jabumba, viveiro de muitos jovens que hoje estão no mercado. Smoth Jazz, Banda Etno Ngola, Clington Experience e Ixi Rises são alguns dos grupos onde tem demonstrado os seus vários lados de guitarrista. Tem a sua marca pessoal na concepção do projecto musical JazzéFixe.
Toty Samed
 
Ainda criança, impulsionado pelo pai, criou a Banda The Kings, que tocava Rock, MPB, Bossa-Nova, música alternativa e, depois, música angolana. Também é um destacado produtor. Ainda como guitarrista acompanhou nomes como Filipe Mukenga, Aline Frazão, Carlos Lopes, Sandra Cordeiro, Paulo Flores, Kizua Gourgel, Sara Tavares e outros. Depois do lançamento do EP "Ingombotas” tem apostado mais na carreira individual, com concertos em voz e violão.
Diego
 

É guitarrista e produtor. Durante muito tempo trabalhou com as principais referências da música jovem.   Actualmente opta também pela interpretação e tem o single "Bolo de Casamento” como o seu tema de apresentação.
Dany
Éoutro guitarrista que aposta na fusão. Solista de Hélder Mendes, é um exímio executante da Rumba Congolesa. Tem sido uma aposta de Dulce Trindade, este que unanimemente é considerado um dos grandes caça-talentos da música angolana.
Texas


Com apenas 14 anos, apareceu no Cine Karl Marx. Num espectáculo transmitido pela TPA e a RNA, o garoto surpreendeu ao tocar com perfeição "Mobali Nangai Azali Etudiant na Poto”,  um famoso tema de Francó, facto que deixou todo mundo admirado. Depois, o mesmo miúdo  notabiliza-se na banda de Yuri da Cunha, artista que não o larga. Hoje é tido como um dos jovens guitarristas que melhor tem absorvido da mestria de Betinho Feijó, casando o ritmo e o solo numa viola eléctrico-acústica. Texas é presença regular em muitas produções de música nacional. Aliás, não foi por acaso que, numa altura em que parte dos músicos que acompanhavam Yuri da Cunha eram integrantes do Semba Masters, foi chamado a ficar com o instrumento de Betinho Feijó, um dos mais criativos guitarristas angolanos e responsável por muitos sucessos do chamado Novo Semba, onde pontificavam nomes como Carlos Burity e  As Gingas do Maculusso, sem deixar de mencionar Bonga Kwenda. Um outro produtor e músico consagrado que o tem como guitarrista nos seus trabalhos de estúdio e palco é Lito Graça. O seu pai, o também guitarrista Ferro Doran, hoje baixista em várias formações artísticas, é reconhecido como um mestre e pai musical de muitos jovens de Benguela.
Johnny Master

É outro filho do Nkembo que tem seguido as peugadas de Simmons Mancini. Tem sido uma das principais opções de escolha de Eduardo Paim para reproduzir o que foi feito pelo então menino-maravilha da guitarra angolana nos idos anos 90. Johnny Master também apostou no canto, com o tema "Oportunidade”. Como intérprete é o Mukeko. 

Carlos Praia

É proveniente da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo no Mundo "Os Tocoístas”. Tem como sua praia o Jazz. Compositor, guitarrista, arranjista e produtor musical, licenciado em Jazz e Música Popular pela Faculdade de Letras da Tswane University of Tecnology, em Pretória, África do Sul, tem no mercado o álbum "New Grace”, onde explora muito a improvisação e a harmonia e viaja por vários estilos. Tem trabalhado com os principais nomes do Jazz de fusão em Angola e experimentado géneros como o Semba, Kizomba, Bossa-Nova e Kilapanga. Na próxima quinta-feira,  27, às 16 horas, vai actuar no Memorial Dr. António Agostinho Neto, num concerto intimista.
Estes são alguns dos nomes da vasta lista de guitarristas que têm o mérito de dar suporte e qualidade musical a grande parte dos cantores renomados e mediatizados da praça angolana e não só. Infelizmente, nem sempre são reconhecidos e respeitados. E como a cultura de apresentar os instrumentistas em palco ainda não está muito entranhada nos grandes cantores,  porque talvez pensem que lhes apagarão o brilho, cá estamos nós a fazer a nossa parte.   

Cláudio Click-Clack

É um solista que depois de beber da Rumba e de outros ritmos congoleses, tal como Teddy Nsingui, uma das suas referências, absorveu e entrou na música angolana com força. No Muzonguê da Tradição algumas vezes tocou com a Banda Movimento, substituindo Teddy Nsingui e noutras formações, onde o seu talento foi aprovado, tem acompanhado cantores como Lulas da Paixão, Calabeto e outros nomes de gerações diferentes. Actualmente é integrante de uma das bandas musicais da Polícia Nacional e um dos nomes apontados para assumir a guitarra solo nos Jovens do Prenda.
Pepelo

É outro jovem que se tem destacado como solista e ritmo. Passou pela Banda Jabumba e fez escola nos Jovens do Prenda. É actualmente da Banda Yetu e colabora com muitos artistas e projectos.

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