Desporto

Patrícia Costa: “Sempre fui uma mulher do desporto”

Sérgio V. Dias | Huambo

Jornalista

Ex-árbitro e hoquista do Petro de Luanda assume actualmente funções de presidente da Associação da modalidade na capital.

09/01/2021  Última atualização 17H00
© Fotografia por: Dombele Bernardo | Edições Novembro
Patrícia Costa é uma referência obrigatória no país, quando o assunto nos remete à prática do desporto feminino. Em entrevista ao nosso jornal, assumiu que sempre foi "uma mulher do desporto”. Como praticante de hóquei em patins, marcou presença em dois Campeonatos do Mundo. Ostenta, ainda, o estatuto de árbitro mais mundialista do hóquei e no cômputo das demais modalidades, só é superada por Carlos Júlio e Soares Campos. Hoje nas vestes de líder da Associação de Patinagem de Luanda, a também ex-praticante de futsal não esconde a insatisfação pelo momento menos bom do desporto no país. "Olho para o desporto nacional com tristeza”, abriu o livro à nossa entrevista.
Para começar, gostávamos que nos falasse  da sua carreira profissional, especialmente quando representou a Selecção Nacional em Mundiais de Hóquei em Patins?

Na verdade a minha carreira profissional (em termos de formação) não tem a ver com o desporto e, infelizmente. Sou bancária de profissão. Agora no que toca a minha trajectória enquanto atleta, apraz-me dizer que sempre fui uma mulher do desporto e o hóquei em patins foi uma das modalidades por mim praticadas, já que desde muito cedo abracei a ginástica acrobática, no Petro de Luanda. O ponto alto da minha carreira foi, obviamente, a representação da  Selecção Nacional, nos Campeonatos do Mundo de 1994 (em Portugal), como sub-capitã, e de 1998 (Argentina), já com a braçadeira de capitã. Nessa última prova, recebi depois o convite para jogar pelo Hóquei Clube de Sintra, de Portugal, que não se efectivou, na altura, por alguma imaturidade minha.

Já agora fale-nos, também, um pouco da sua experiência como ex-futebolista?

A nível do futebol nunca cheguei a internacional pela Selecção Nacional. Joguei futsal e cheguei a ser convocada para a selecção provincial de Luanda e posteriormente para o combinado nacional de Angola da modalidade, mas esta participação que seria a única do país, também não chegou se efectivou por motivos de força maior.
Além da Selecção Nacional que clubes representou a nível do hóquei em patins?A nível do hóquei em patins representei apenas o Petro de Luanda. 
E no tocante ao futsal, em que equipas chegou a actuar?

A nível do futsal representei as equipas da Rádio Nacional de Angola (RNA), da Força Aérea, Empresa Provincial de Águas de Luanda (EPAL), a Clínica Sagrada Esperança, a Coprat e por fim a Marinha de Guerra de Luanda, quando depois parei de jogar.
Que títulos ou feitos mais relevantes obteve numa e noutra modalidade respectivamente?

A nível do hóquei em patins cheguei a competir num Campeonato Nacional Experimental em que naturalmente nós fomos campeãs, porque na verdade o Petro detinha a hegemonia na altura, pelo menos a nível do hóquei feminino. Já no futsal, felizmente, habituei-me a ser melhor marcadora das equipas, por onde passei e apenas por duas vezes fui considerada a melhor jogadora e marcadora de Angola. Mas infelizmente nunca cheguei a ser campeã nacional, apenas atingi os lugares do pódio.
O que ganhou ao longo desses anos como pessoa ligada à prática do desporto? Refiro-me do ponto de vista financeiro e de projecção na sua carreira.

Infelizmente o desporto carece de muita atenção. Eu defendo a profissionalização do desportista. Por isso, a nível do desporto, felizmente como pessoa, sim ganhei muito, mas, financeiramente, não posso dizer o mesmo (risos).
Onde esteve o segredo da brilhante carreira que fez ?

Apenas no amor que aprendi a nutrir pelo desporto.
E hoje sente-se realizada profissionalmente?

Profissionalmente enquanto estiver no activo, como dirigente desportiva, continuarei a dedicar-me para chegar o mais longe possível. Portanto, a realização pessoal depende sobretudo do meu estado e não da satisfação. Resumindo, ainda não estou satisfeita.
Como surge a ideia de optar mais tarde pelo dirigismo desportivo?

Na verdade não foi ideia. Diria que foi apenas uma intenção concretizada. A semelhança do que acontece em relação a arbitragem, mantenho firme a intenção de não abandonar a modalidade de hóquei em patins, que representa a de minha eleição.
Como vê hoje o nível do nosso desporto, no geral, e do hóquei em patins, em particular?

Para mim que vivi os melhores anos do desporto com muitas conquistas, pelo menos pelo que transpirava cá para fora, hoje olho para o desporto nacional com tristeza por estar muitos furos abaixo daquilo que se observava anteriormente. Adormecemos à sombra da bananeira e depois tivemos de partir para o imediatismo. Isso fez com que deixássemos de formar e fomentar. Infelizmente é essa a visão que tenho (risos)…
Que estratégias tem em carteira, como presidente da Associação Provincial de Hóquei em Patins de Luanda?

A maior estratégia é a perseverança. Nós temos de nos alinhar e criar normas de competição que nos façam chegar aos mais altos patamares, ainda que tenhamos, para efeito, poucas equipas conforme se vislumbra no horizonte. Temos, acima de tudo, que apostar na formação e daqui a uns anos colheremos os frutos. É este o meu anseio.
Como vê a projecção do hóquei em patins no nosso país?

Eu acho que a nível interno o hóquei em patins devia ser mais respeitado e até venerado. Além de ser, no país, a modalidade mais mundialista, o hóquei é também a melhor posicionada no ‘ranking’ nacional. Angola está entre as melhores selecções do mundo e é bastante respeitada, a esse nível. Agora nós temos é que resgatar esta mística internamente. É imperioso assumir isso.
Acha que o trabalho de casa tem sido bem feito?

Claro que não. Se dissesse que sim, teria de admitir que está tudo bem, mas na verdade não está. Temos um trabalho aturado pela frente, a começar pela formação do atleta e do próprio homem. Isso é inequívoco e é necessário desencadear já acções nesse sentido.
Se a nível do sector masculino, salta à vista uma maior projecção do hóquei em patins no país, o que se pode dizer em relação ao sector feminino?

Claramente a nível do sector feminino não se pode dizer o mesmo em relação à prática do hóquei em patins no país. Para ser honesta, sou um pouco céptica em relação ao reaparecimento do hóquei feminino. Não acho impossível, mas acho muito difícil...

  A senhora que mais apitou em Mundiais por Angola


Num outro ângulo da abordagem feita com o Jornal de Angola, Patrícia Costa manifestou-se regozijada por ser a árbitro angolana com mais presenças em Mundiais de Hóquei em Patins. Nesse quesito, lembrou que apitou nas edições dos Campeonatos do Mundo de 2010 (que teve como sede Angola), 2015 (França) e o de 2019 (Barcelona, Espanha), respectivamente. Aliás, de uma forma geral, no desporto nacional, Patrícia Costa só fica atrás de Soares Campos e Carlos Júlio, ambos do basquetebol, que chegaram a ajuizar mais Copas do Mundo, da «bola ao cesto». 
Que sentimento lhe vai à alma, ao granjear o feito de mulher árbitro mais mundialista do  hóquei e de todos os desportos no país? 

O sentimento de dever cumprido para aquilo a que me predispus atingir. Orgulho-me por tudo isso e ao saber desta distinção, muito mais ainda, porque além de ser respeitada internamente, fui muito honrada internacionalmente. Claro que me sinto lisonjeada.
Como encara o momento actual por que passa o nosso desporto, sobretudo pela situação de calamidade que o país enfrenta devido à propagação de casos de Covid-19 no mundo, em geral, e no país, a título particular?

Encaro com bastante frustração, porque o desporto está praticamente parado e há modalidades que correm o risco de entrar em falência técnica. Mas o que me preocupa realmente são as famílias e aqueles desportistas que, de repente, se podem ver no desemprego. É uma situação extremamente difícil. 
Como resumiria a figura de Patrícia Costa, quer como ex-atleta, quer a nível do dirigismo desportivo e como mulher designadamente?

Relativamente à figura de Patrícia Costa, eu sou a pessoa suspeita para falar de mim. Ainda assim, acho-me uma pessoa bastante tranquila, que respeita muito as diferenças e o espaço dos meus semelhantes. Sou amiga dos meus amigos e não me considero assim tão expansiva. Porém, dentro daquilo que é a convivência humana, julgo que os meus próximos, não têm absolutamente razões de queixa da minha pessoa.
Título
Nome: Patrícia Lara Amaro da Costa "Tuxa”
Filiação: Augusto Santana  da Costa Neto e de Maria Raul Amaro da Costa Neto
Local de nascimento: Luanda
Data: 26 de Novembro
Títulos: Campeonato Nacional Experimental de hóquei pelo Petro de Luanda (1999)
Formação: Bacharel em Direito (pela Universidade Agostinho Neto)

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