Opinião

Quem tudo quer pode tudo perder (1)

Carlos Calongo

Jornalista

Equipas como o Real Madrid, Barcelona, Benfica, Sporting, Porto, Liverpool, Manchester United, Arsenal, Chelsea, Juventus, etc., têm muitos adeptos em Angola, que muitas vezes sentem o revés das referidas equipas em doses industriais quando comparadas com os maus resultados das equipas angolanas de que são até sócios.

01/05/2021  Última atualização 09H51
A elevada qualidade do futebol desenvolvido pelos jogadores das equipas acima referidas talvez seja a razão fundamental do afecto que os angolanos estabelecem com clubes internacionais, ao ponto de muitos deixarem de comer, na sequência da derrota de uma delas.

Não estamos a dizer que, entre nós, os adeptos não tenham profunda paixão pelo 1º de Agosto, Petro de Luanda, Recreativo do Libolo, Sagrada Esperança, Progresso do Sambizanga, Atlético Sport Aviação, etc., para as quais até pagam quotas e são sócios de plenos direitos.

A verdade é que existe assinalável diferença na abordagem do fenómeno até mesmo por parte de alguns jornalistas, que mais e melhor dominam os meandros das equipas do futebol internacional que o da banda, numa manifesta e clara alusão de que, o melhor vem de lá...  Enfim, gostos são gostos e contra-gostos!...

Gostaríamos ver invertida esta tendência, até para termos um produto mais comercializado e consumido, pois estamos na era em que o futebol é uma verdadeira indústria lucrativa, e com os níveis de desemprego que registamos, davam uma boa escapatória.
Para muitos, a questão não se resume na ligação afectiva com os referidos clubes do velho continente. É muito mais do que isso. Transparece que uma vitória é mais do que simples resultado, e que o inverso é comparado ao dilúvio, com a merecida reconfiguração da componente histórico-religiosa.

Só assim se compreende a manifestação de tédio por parte de alguns adeptos do Porto e do Real Madrid, que há poucas semanas estiveram na condição de poder ganhar tudo, e num ápice verem invertido o quadro e perderem tudo, pelo menos a nível dos campeonatos locais e da liga dos campeões.

Vem o intróito, que melhor serviria às crónicas de jornais especializados em desporto, em função da história de vida de Mariana, menina a quem o Criador bafejou o rosto e o corpo com estridentes linhas de beleza, que atiçam a criatividade de qualquer artista e despertam o instinto libidinoso dos "ngombiris” que abundam na urbe luandense.

Órfã dos cuidados e ensinamentos do pai biológico que abandonou a mãe depois desta a ter dito que engravidara numa das aventuras da juventude, Mariana cresceu sob os cuidados da avó materna, que viria a falecer quando a menina preparava a transição académica do ensino médio ao universitário.

Impulsionada pelo sofrimento da velha que driblava as dificuldades da vida com o pouco que ganhava da venda de bombó com jinguba, à porta de casa, Mariana cresceu diferente de muitas das suas contemporâneas, que cedo se viram forçadas a "estacionar” os lápis e os cadernos para cuidar dos bebés, que "ganharam” na imprudência da adolescência destas meninas que já fazem coisas dos mais velhos.

Parecendo praga na rua Mariana, no bairro que a todo custo alguém quer rebaptizar por Tala Alice, ante a repulsa de muitos, entre os quais o articulista, as meninas tiveram dificuldades em fechar com êxito o ensino médio, pois no percurso surgiu sempre um malandro para as desencaminhar e, mais grave que isso, não situaram as filhas alheias, que na sua maioria acabaram em vendedeiras de esquinas, apenas para alimentar os kanukos.

Mariana que não teve esse azar, passou a ser o orgulho das amigas, vizinhas e até mesmo das mães das outras, que ela tem como dela também. Continuou a estudar, frequentando o primeiro ano da Faculdade de Medicina da Universidade Agostinho Neto, para onde se desloca contando os passos, por ter de escolher entre gastar os parcos recursos financeiros no táxi e comprar os fascículos do conhecimento.

Entre o quintalão do Hospital Américo Boavida e  as peripécias das idas e vindas da vida de jovens estudantes universitários, o que ocorreu com Mariana será narrado neste espaço, em que a história da aspirante "sótora” pode resumir-se em "quem tudo quer pode tudo perder”. Até lá.

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