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RASD acusa Marrocos de fazer política de apartheid

O embaixador extraordinário e plenipotenciário da República Árabe Saharaui Democrática em Angola, Hamdi El Jalil Aali, acusa Marrocos de fazer política de apartheid no continente, ao ocupar partes do território saharaui, pedindo apoio político e diplomático de Angola na luta contra a ocupação do seu território, que já dura cerca de quatro décadas.

16/05/2021  Última atualização 07H00
Embaixador extraordinário e plenipotenciário da RASD, Hamdi El Jalil Aalil © Fotografia por: DR
Em entrevista ao Jornal de Angola, para esclarecer a rejeição da RASD do candidato a medianeiro das Nações Unidas para o diferendo com o Marrocos, o diplomata saharaui acusa Luís Amado de no exercício das funções de chefe da diplomacia portuguesa ter tomado posições claramente favoráveis a Rabat.

Marrocos ocupa as cidades de El Aiun (capital da República Árabe Saharauí Democrática), Dakhla e Smara, que o embaixador Hamdi El Jalil  Aali diz terem sido transformadas, pelas autoridades marroquinas, em grandes centros de concentração, ao estilo dos campos prisionais do antigo regime do apartheid, interditas a jornalistas internacionais, organizações de  defesa dos direitos humanos e parlamentares estrangeiros.

E essa postura de apartheid, disse o embaixador Hamdi, afecta todos os aspectos da vida do povo saharaui, uma vez que Marrocos continua a explorar ilegalmente as suas riquezas, que são utilizadas para financiar as forças de ocupação.
"O nosso país é rico em matérias-primas, é vasto, com cerca de 266 mil quilómetros quadrados, com mais de 1.300 quilómetros de costa atlântica e com um subsolo riquíssimo, razão pela qual o Marrocos insiste em dominar o Sahara Ocidental”, sublinhou o embaixador.

Reafirmou, por outro lado, que o seu país não pode aceitar que alguém com posições próximas a Marrocos seja medianeiro de um processo tão importante como é o caso do diferendo que opõe os dois países.
Lembrou que o conflito entre os dois países já dura cerca de quatro décadas e ao longo deste tempo Marrocos, pela sua intransigência em não querer abandonar os territórios ocupados, foi expulso por cerca de 32 anos da União Africana, organização a que o Sahara Ocidental é membro de pleno direito.

O diplomata salientou que Marrocos ocupa militarmente o Sahara Ocidental há cerca de 40 anos e durante este tempo todo a situação no território continua de guerra, os saharauis continuam a resistir às forças invasoras de armas na mão. A RASD evoca que a questão é de descolonização e exige a Marrocos o cumprimento da Carta da União Africana sobre a retirada deste país dos seus territórios e condena, de forma veemente, a sua presença no país..

As autoridades saharuis consideram que para pôr fim a este diferendo, o Marrocos deve, em primeiro lugar, respeitar as leis internacionais, que estabelecem o respeito das fronteiras herdadas do colonialismo.
Segundo o diplomata, apesar dos apelos dos saharauis e da comunidade internacional, Marrocos insiste em manter-se à força nos territórios da antiga colónia espanhola, tendo violado, a 13 de Maio de 2020, o acordo de cessar-fogo assinado pelos dois países no dia 9 de Setembro de 1991.

"Diante disso, não resta outra alternativa ao povo saharaui senão continuar a luta armada até ver o seu território livre das forças de ocupação marroquinas”, realçou o embaixador Hamdi.
Reza a história que em Outubro de 1975 Marrocos invadiu e partilhou o território saharaui com a Mauritânia, algo que os sharauis não admitiram, tendo iniciado a luta armada de libertação nacional.

"A guerra começou devido à invasão militar marroquina, que durou 16 anos, isto é, de 1975 a 1991. No dia 9 de Setembro de 1991 o Marrocos e a Frente Polisário assinaram um acordo de cessar-fogo, sob a égide das Nações Unidas, que apresentaram um plano de paz e exigiu o fim das hostilidades  para a organização de um referendo sobre a autodeterminação do povo saharaui”, frisou Hamdi El Jalil Aalil, sublinhando que por esta razão é que foi colocado no território a Missão das Nações Unidas para o Sahara Ocidental (MINURSO), mas  Marrocos "colocou sempre obstáculos para impedir a realização do referendo, porque sabe que o povo saharaui ia votar na autodeterminação e independência”.

O diplomata realçou que em 2006, Marrocos chegou mesmo a expulsar 84 membros da Missão das Nações Unidas para a organização do referendo na República Árabe Saharaui Democrática.
O embaixador lembrou, ainda, que a 9 de Março de 2021 o Conselho de Paz e Segurança da União Africana, numa reunião presidida pelo Quénia, tomou decisões importantes, tendo concluído que a questão do Sahara Ocidental é de descolonização e do direito de reafirmar a sua autodeterminação.

Na altura, os representantes quenianos pediram que Marrocos reabrisse os escritórios da União Africana na cidade  de  El Aiun, capital do Sahara Ocidental, e permitisse o regresso dos funcionários da MINURSO. Na mesma ocasião, o Conselho de Paz e Segurança da União Africana pediu ao Secretário-Geral da ONU, o português António Guterres, o envio, o mais rápido possível, de um representante especial para o Sahara Ocidental e solicitou, igualmente, à ONU permissão para a abertura de consulados de Estados-membros no território do Sahara Ocidental.

Hamdi El Jalil Aalil denunciou que a 13 de Novembro de 2020, Marrocos violou o cessar-fogo na região de Guerguerat. Em resposta a esta violação, a Frente Polisário respondeu e começaram as operações militares. "Marrocos, infelizmente, substituiu os antigos colonizadores espanhóis, ocupando pela força militar o território de uma país vizinho, membro fundador da União Africana. Peço a todo o povo angolano que apoie a luta legítima do povo saharaui, sob a liderança da Frente Polisário, para pôr fim à ocupação marroquina do nosso país e acabar com o colonialismo em África”, apelou o representante da RASD em Angola.

O embaixador lembra que a RASD é membro fundador da União Africana (UA), reafirmando que a lei é clara e que a questão saharaui, por se tratar de um caso entre dois países membros da mesma organização continental, poderia ter sido resolvido de outra forma, evitando a força militar.

Interferência das potências coloniais
Em declarações ao Jornal de Angola, o diplomata saharaui vai mais longe e acusa as antigas potências coloniais europeias de apoiarem cegamente Marrocos, porque tiram grandes dividendos económicos do território. Hamdi El Jalil Aalil aponta o dedo acusador a França, que não respeita as leis internacionais, apoiando incondicionalmente todas as posições de Rabat, tanto no plano doméstico, quanto em fóruns internacionais, apesar de o Tribunal Europeu ter proibido a assinatura de quaisquer acordos económicos com Marrocos que incluam o Sahara Ocidental e as importações dos seus recursos agrícolas e minerais.

"A influência francesa no Conselho de Segurança da ONU é tão elevada que faz com que Marrocos deixe de colaborar e, sobretudo, não respeite as decisões da comunidade internacional”, reforçou o embaixador da RASD em Angola.
Além de acusar Marrocos de prática de apartheid, o diplomata da RASD acusa, ainda, a França de estar por detrás da continuação do conflito, pelo apoio, a todos os níveis, militar, político e diplomático, que presta a Rabat.

O embaixador pede aos países africanos maior vigilância e boicote às mercadorias marroquinas vindas do Sahara Ocidental, principalmente os fertilizantes que Rabat se propõe vender a estes países. "Precisamos de sensibilizar os nossos amigos que a riqueza do Sahara Ocidental não pode ser admitida no mercado africano, porque é explorada ilegalmente por uma força de ocupação, que é o Marrocos, infelizmente”, rematou o representante da República Árabe Saharaui Democrática em Angola.

António Canepa

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