Sociedade

“Tornei-me pai e mãe muito cedo”

Alexa Sonhi

Jornalista

Aos 25 anos de idade, Abel Diogo perdeu a esposa durante o parto da segunda filha. Desempregado e sem experiência, o jovem não sabia como criar e educar sozinho as duas crianças.

19/03/2021  Última atualização 12H44
Osvaldo Singue - Bernardino Ngola © Fotografia por: DR
A partir daí, refugiou-se no consumo de bebidas alcoólicas, para afogar todas as mágoas que enfrentava na vida, no seu dia-a-dia.
Após à perda da mulher, foi crucial naquela fase a ajuda dos seus progenitores. Os avós acolheram os netos e orientaram o jovem pai a enfrentar a dura realidade da vida. E hoje, Abel Diogo orgulha-se no pai em que se tornou depois.

"Foi uma fase muito difícil da minha vida. A minha primeira filha tinha apenas dois anos e a segunda acabava de nascer. Definitivamente, perdi o Norte. Naquela altura, desejava ter sido eu a morrer no lugar da minha mulher, porque não conseguia cuidar das meninas sozinho”.

Mas, o tempo foi o melhor remédio para Abel Diogo que se foi acostumando com a perda prematura da esposa. Com a ajuda dos seus pais, aprendeu a cuidar das filhas e tempos, depois, conseguiu emprego e melhorou a condição de vida da sua família.

"Antes de ir trabalhar, deixava a mais velha na escola e a mais nova na creche. Orientava a ‘Babá’ delas para ir pegá-las e já em casa, no final do dia, ajudava as meninas a fazer as tarefas escolares, servia-lhes o jantar e depois disto contava histórias para adormecerem”, detalhou o jovem pai .
No cumprimento do calendário de vacinação, Abel Diogo levava as duas filhas ao hospital materno infantil, próximo de casa e noutras ocasiões, quando estivessem acometidas por qualquer doença, recorria a um hospital para consulta médica, alegadamente porque os seus pais já não tinham tanta força de fazer isso, a julgar pela idade de ambos.

"Tive essa rotina durante anos, ao ponto de esquecer de mim mesmo, porque só voltei a me apaixonar 13 anos depois, por insistência dos meus familiares e amigos”, revelou.
Abel Diogo rejeitava contrair novamente matrimónio, receando que a nova parceira viesse a maltratar as meninas ou perturbar a bela relação de afecto, amor, carinho e cumplicidade que desenvolveu com as filhas.   
"Mas graças a Deus, encontrei uma boa mulher”, disse para acrescentar que apesar de encontrar as minhas filhas já bem orientadas, educadas e instruídas por mim, "ela também tem sabido ser uma boa mãe”.

Passados 24 anos, desde o falecimento da primeira esposa, Abel Diogo diz com orgulho que soube ser um bom pai e mãe, em simultâneo, apesar das várias dificuldades que teve de enfrentar para que as filhas se tornassem nas mulheres adultas que são hoje.
 "As minhas filhas já são moças e muito bem orientadas na sociedade. As duas estão a estudar na universidade, sendo que a mais velha está a frequentar o último ano do curso de Direito e, inclusive, ela já está noiva, com o casamento marcado para o final do ano. Sinto que cumpri bem o meu papel de pai”, concluiu.

 
Um dia para reflexão
Apesar de Abel Diogo ter percebido apenas a sua importância como pai na vida das filhas, depois de perder a mulher, outros embora não tenham vivenciado as vicissitudes por que passou aquele jovem, reconhecem o papel crucial que os progenitores, no caso os pais, desempenham na estabilidade psico-emocional e social dos filhos.

O sociólogo Osvaldo Singue, que também é pai e ainda tem o progenitor em vida, disse, ao Jornal de Angola, que o Dia do Pai deve servir de reflexão, por tratar-se de uma figura incontornável dentro da estruturação da família, como núcleo forte da sociedade.

Na visão do Osvaldo Singue, o pai é aquele que cria e protege com toda a sabedoria e inteligência, baseando-se nos ensinamentos tradicionais e modernos, tanto na vida particular como pública .
Para Osvaldo Singue, é preciso que o pai continue a ser  ele mesmo, verdadeiro e responsável por todos aqueles que estão ao seu redor, apesar das dificuldades do quotidiano.
"O pai deve mostrar a sua determinação e esperança no seio da família, mostrando e provando que tudo é possível, quando existe vontade e se unem esforços para se ultrapassarem todos os obstáculos que surgem sempre”, exemplificou o sociólogo.  

Osvaldo Singue afirma ser preciso educar os mais jovens sobre o real papel do pai, de maneira que eles possam levar a bom caminho esta nobre missão de criar, proteger e educar, exigindo a cada progenitor a tarefa de contribuir de forma activa na vida harmoniosa das nossas famílias.


  Sou contra os lares de idosos   
Se os progenitores foram capazes de criar e dar amor a tantos filhos, apesar das dificuldades, então o processo deve ser recíproco. O pai, já na velhice, não deve ser abandonado pela família, disse o comunicólogo Bernardino Ngola, manifestando-se contra àqueles que colocam os idosos em lares da terceira idade.

"Considero falta de amor por parte dos filhos que abandonam os pais nos lares. Porque nas nossas casas deve ter sempre um lugar para cuidar dos nossos progenitores, apesar das responsabilidades que temos de cuidar dos nossos filhos”, lembrou Bernardino Ngola.

De acordo com o comunicólogo, essa cultura de colocar os idosos em lares de acolhimento, "não tem nada a ver com os nossos hábitos como africanos. É coisa importada, principalmente da Europa", sublinhando que após à aposentação ou entrar para a terceira idade, "é responsabilidade dos filhos cuidarem das suas necessidades emocionais e materiais”. 

 Eu também sou pai, tenho cinco filhos, lembrou para acrescentar que quando envelhecer "gostaria que os meus filhos cuidassem de mim com tanto amor e dedicação conforme eu cuido do meu pai”.
"Apesar das dificuldades da vida, esforço-me para ter uma excelente  relação de amizade, carinho, solidariedade com os meus filhos, para que eles aprendam com o meu exemplo, com a mensagem que passo no dia a dia”, concluiu Bernadino Ngola.

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