Opinião

A liberdade de imprensa e o desafio das redes sociais

Filomeno Manaças

Nos tempos que correm, na abordagem sobre a importância da liberdade de imprensa na construção da democracia, é incontornável que se fale e se discuta sobre o papel e o impacto das redes sociais na facilitação do acesso à informação por parte do público. Do mesmo modo que com o surgimento da imprensa, entendida em sentido lato, assistimos a uma maior difusão de ideias, de cultura e de conhecimentos, com o aparecimento das redes sociais a divulgação de factos e acontecimentos ganhou outra dimensão.

17/05/2024  Última atualização 13H25

Essa outra dimensão é reflectida na velocidade de transmissão da mensagem, na instantaneidade com que ela ocorre, no número de usuários que pode alcançar, na grande capacidade de cobertura e de divulgação - que as redes sociais oferecem - de assuntos que normalmente escapam à media tradicional, quer porque não contemplados na agenda desses órgãos de comunicação social, quer porque, muitos deles, espontâneos, portanto, imprevistos.

As redes sociais deram a oportunidade de qualquer indivíduo reportar, de escrever estórias e partilhá-las, mesmo sem ter formação jornalística, sem ter o domínio apurado das técnicas do Jornalismo, o que deu origem, nos países anglófonos, à expressão "citizen journalism (jornalismo feito pelo cidadão)”. Diga-se de passagem, muito contestada, porque entende-se que Jornalismo só há um.

A verdade é que as redes sociais vieram impôr uma outra dinâmica na forma de tratamento da informação, representando tanto um desafio para a media tradicional como para as instituições públicas e privadas. Para fazer face ao desafio das redes sociais a media tradicional (jornais, televisões, rádios e revistas) viu-se obrigada a marcar presença também nas plataformas digitais e a optar pela actualização permanente da informação, além de apostar na diversificação da oferta de produtos informativos e formativos.

As instituições públicas e privadas foram, por sua vez, compelidas a apostar forte em pessoal com competências técnicas em termos de comunicação com o público, ao mesmo tempo que também investiram no on line, criando páginas nas plataformas digitais para publicitação dos seus serviços e interacção com o consumidor. O escrutínio  da qualidade do serviço prestado passou a ser maior.

Apesar das críticas que por vezes são feitas, o papel que as redes sociais jogam no ecossistema de informação é de particular importância, havendo necessidade de se proceder à decantação do que é falso do verdadeiro; do que é material tóxico e nada acrescenta como valor informativo, como valor notícia, daquilo que realmente interessa e serve como base para discussão em prol do avanço, da evolução que o país precisa realmente de fazer.

As redes sociais são um campo de vícios e virtudes, são à imagem e semelhança do ser humano. Um campo de excelência para o exercício da liberdade de expressão, um direito muito caro à democracia, sem o qual de nada adianta falar em democracia. Mas é também pelo conteúdo dessa liberdade de expressão que aferimos a qualidade da nossa democracia.

Entre nós há exemplos maus e bons.

Os exemplos maus são a desinformação (as fake news), os ataques pessoais, os assassinatos de carácter, entre outras práticas que tendem para que haja e prevaleça um ambiente tóxico. Os exemplos bons são o contrário disso tudo. A discussão com elevação, com urbanidade; os questionamentos em busca de respostas para problemas concretos, as denúncias de casos que sabemos ocorrem e precisam de ser resolvidos, o combate que é necessário levar contra a corrupção, a má gestão, etc.

Se as redes sociais são um perigo pelo que representam de negativo, são também um instrumento poderoso de defesa da democracia, das boas práticas que a sociedade precisa de cultivar, sempre e sempre, para que as liberdades de que o sistema democrático carece para subsistir em ambiente saudável não sejam postas em causa. E entre todas essas liberdades estão a de expressão e de imprensa.

Um dos grandes desafios que se coloca à media tradicional - e esse é um debate quando se discute em particular a sobrevivência dos jornais face à evolução tecnológica que temos vindo a assistir nos últimos tempos -, reside na sua capacidade de determinar as agendas informativas, e, com isso, fazer deslocar para o seu espaço a abordagem de temas muitas vezes aflorados nas redes sociais, porém não com a abrangência e profundidade que em certos casos reclamam ser tratados.

A luta para determinar as agendas informativas está ligada ao conceito de imprensa vibrante, capaz de, face à concorrência das redes sociais, atrair para si a maior fatia da atenção do público consumidor (leitores, radiouvintes, telespectadores, internautas); contribuir para informar e formar a sociedade sobre os factos e fenómenos em curso de uma forma objectiva e esclarecedora; contribuir para um melhor escrutínio dos poderes públicos e privados, e, com isso, determinar uma outra dinâmica da própria sociedade, criando expectativas certas e com a certeza jurídica garantida pelo Direito.

As redes sociais assumiram uma importância tal, hoje em dia, que falar de uma sociedade sem elas é como recuarmos à Idade da Pedra. Seria o caos!

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