Opinião

A qualidade de vida do trabalhador e o combate à pobreza

Pedro Tavares*

Colaborador

As Nações Unidas e o Banco Mundial estabeleceram, em 2022, que a métrica para determinar a pobreza extrema é um rendimento diário inferior a 2,15 USD por pessoa.

12/05/2024  Última atualização 08H56

O Eixo 4 do Plano de Desenvolvimento Nacional 2023-2027 colocou como meta da política até 2027, diminuir de 31% para 28% a população que vive abaixo dos 2,15 USD, reduzindo as desigualdades sociais e erradicando a fome e a pobreza extrema.

Para tal, o Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2024 alocou uma verba de 37,216 mil milhões de Kwanzas para acudir aqueles que vivem abaixo deste patamar (Dotação Orçamental por Programa 4.7.22.1.1.1).

Porém, há uma relação directa entre trabalhadores que auferem o salário mínimo nacional (SMN) e a extrema pobreza e, por isso, estes podem acabar por ser objecto dos programas de combate à pobreza quando deviam ser os empregadores a pagar salários justos e dignos que permitissem uma qualidade de vida aceitável e aliviassem o Estado dessa tarefa, redireccionando parte dessas verbas para outras prioridades.

Existem três níveis de SMN, compartimentados por agrupamentos económicos. O mais baixo é o do sector Agrícola, que é também o SMN garantido aos não enquadrados nos restantes agrupamentos.

Desde 2022, este valor é de 32,181 Kz, o que ao câmbio oficial actual médio (+/-828 Kz=1 USD) corresponde a 39 USD, o que dividido por 30 dias equivale a 1,3 USD/dia.

Para o agrupamento dos transportes, serviços e indústria transformadora, o SMN é de 40,226 Kz (equivalente a 48 USD), isto é, 1,6 USD/dia, ao passo que para o comércio e indústria extractiva, o SMN é de 48,271 Kz (equivalente a 58 USD), o que são 1,94 USD/dia, estando todos estes valores abaixo da linha vermelha dos 2,15 USD/dia.

A Lei Geral do Trabalho (LGT) introduz uma novidade na fixação do SMN. Além de se considerar a evolução dos preços, a necessidade de atingir um alto nível de emprego e produtividade, agora também deve-se ponderar sobre a qualidade de vida do trabalhador (artigo 241º, n. 3, al. c).

Aliás, isto está em linha com o art.4, n.4 da LGT que estabelece que "as condições em que o trabalho é prestado devem respeitar a dignidade do trabalhador, permitindo-lhe satisfazer normalmente as suas necessidades e as da sua família, proteger a sua saúde e gozar de condições de vida decentes” e o art. 76º, n. 2 da Constituição que determina que "todo o trabalhador tem direito a justa remuneração”.

Ora, a qualidade de vida só pode estar garantida se aquilo que o trabalhador aufere estiver, no mínimo, acima da linha que define a extrema pobreza e que são os 2,15 USD/dia, devendo tal valor ser achado ao câmbio médio actual.

Certamente, os representantes dos trabalhadores reivindicarão o máximo e os empregadores o mínimo possível, mas ao Estado compete ser prudente e firmar esta linha vermelha, sob pena de, por decreto, estabelecer um SMN abaixo do nível internacionalmente estabelecido e reconhecido por si da pobreza extrema.

 
*Jurista e professor

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