Especial

Produção de cacau atrai centenas de famílias camponesas em Cabinda

Bernardo Capita|Cabinda

Jornalista

O cultivo de cacau na província de Cabinda regista uma adesão bastante assinalável de produtores, por ser uma cultura que está a gerar rendimento sustentável para muitas famílias.

25/11/2023  Última atualização 08H15
Implementado no âmbito do fomento de culturas comerciais, o programa também tem o foco voltado para a produção de óleo de palma © Fotografia por: António Soares | Edições Novembro
Uma das razões da adesão de produtores é o facto de a cultura do cacau garantir cinco a seis colheitas ao ano. Segundo o coordenador nacional do Projecto de Desenvolvimento das Cadeias de Valor Agrícola da província de Cabinda, engenheiro agrónomo José Fernandes, as cinco ou seis colheitas ao ano são feitas num intervalo de dois meses e com uma produção de 500 quilos de cacau em fruta.

Cada monte de 500 quilos de cacau em fruta, que equivale a um período de colheita de dois meses, permite ao agricultor arrecadar cerca de 200 mil kwanzas, uma vez que cada quilograma no mercado local é vendido ao preço de 400 kwanzas.

"O cacau está a transformar-se, efectivamente, numa cultura de renda de eleição em Cabinda”, disse a fonte, acrescentando que as famílias camponesas produzem, em média, 500 quilos de cacau de dois em dois meses.

O gestor informou que o cacau está a ser cultivado em toda extensão da província de Cabinda, com destaque para os municípios de Buco-Zau e Belize, envolvendo uma área global de 495 hectares. Para o efeito, foram distribuídas 550 mil mudas, no âmbito do projecto de Cadeia de Valores Agrícolas, em curso na província há cerca de cinco anos.

Em toda a cadeia de produção de culturas comerciais, que inclui café, palmar e cacau, o projecto de Desenvolvimento das Cadeias de Valores da Agricultura prevê a participação de 51 mil famílias. Segundo a fonte, até ao momento 41 mil beneficiários participaram no processo de cultivo generalizado, sendo que 71 por cento são mulheres e produtores ligados ao processo de cultivo do cacau.

 Transformação do cacau

Com o "boom” da produção do cacau, impõe-se, agora, a necessidade de criação de pequenas indústrias locais de transformação deste produto, com o objectivo de lhe conferir um valor acrescentado, de modo a torná-lo mais rentável e, por outro, criar-se mais postos de trabalho.

José Fernandes anunciou estar em curso, no âmbito do projecto, a montagem de uma "fábrica de pasta de cacau bruta”, ou seja, uma pequena unidade de beneficiamento, que passará a transformar o cacau em massa pronto para ser exportado.

O projecto de Cadeias de Valor Agrícola contempla três focos de intervenção, nomeadamente o de fomento de culturas comerciais como café, cacau e palmar, o alimentar, que abarca milho, amendoim, soja, feijão e mandioca, com introdução de espécies melhoradas e o animal, que envolve a criação de porcos, cabritos, gado bovino, aves (galinha) e piscicultura.

Segundo José Fernandes, a instalação de uma fábrica de transformação do cacau será um marco importante, porque vai representar uma clara demonstração do desenvolvimento da cadeia de valor do cacau na região.

A estratégia do projecto de Cadeia de Valor Agrícola, no domínio de produção do cacau, segundo o coordenador, é transformar Cabinda num modelo de produção nacional. A par disso, continuou, o projecto já levou ao Ghana, maior produtor africano depois da Cote d’Ivoire, produtores locais dos quatro municípios para troca de experiência, não somente na área de produção, mas também na de transformação.

"Neste momento o desafio do projecto em relação às culturas comerciais é efectivamente a transformação”, notou.

Ainda assim, José Fernandes anunciou que no domínio das culturas alimentares (milho, amendoim, soja, feijão, mandioca e banana), o projecto está a montar, no município de Cacongo, uma fábrica de transformação da banana, com capacidade de absorver 500 quilogramas de banana por hora.

Os trabalhos de montagem da fábrica, acrescentou, vão ser concluídos dentro de dois meses e a unidade está capacitada para absorver a banana e todo tipo de raízes ou tubérculos, como mandioca e batata. "É uma fábrica com quatro linhas de transformação em projecção no município de Cacongo”, disse José Fernandes, referindo que o investimento está avaliado em 350 mil dólares, que inclui a compra do equipamento, montagem e instalação de outros componentes técnicos adicionais.

Produção de café

No domínio do café, outra cultura de aposta do projecto, foram distribuídas 550 mil mudas (plantas) e preparados 495 hectares de terra. Na vertente do palmar, a fonte indicou que 350 mil mudas é a quantidade de plantas multiplicadas para um universo de 3.153 hectares, como também foram distribuídas 55 mil árvores frutíferas (manga e frutas cítricas) cobrindo mais de 137 hectares.

Pecuária

O projecto de Desenvolvimento das Cadeias de Valor de Agricultura enquadra-se na visão estratégica do Executivo angolano e é concretizado através de um empréstimo do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), no valor de 101.070.000,00 (cento e um milhões e setenta mil dólares) e uma compartição do Governo angolano no valor 19.910.000,00 (dezanove milhões e novecentos e dez mil dólares) e 2.170.580,00 (dois milhões cento e setenta mil e quinhentos e oitenta dólares) dos beneficiários, totalizando um montante global de 123.150.580,00 de dólares.

A alocação do orçamento é feita de forma percentual e dividida em três componentes: a agricultura, incluindo a pecuária e a criação de aves, beneficia de 30 por cento do valor, para aumentar a produtividade agrícola e não só. O desenvolvimento de infra-estruturas está com 60 por cento do montante, enquanto a gestão de projectos está com 10 por cento do valor global.    

Parte do montante cabimentado para a agropecuária, segundo o coordenador, está a ser investido em três eixos da pecuária eleitos pelo governo da província, que incide em animais de pequeno porte, como cabritos, galinhas e porcos, para tornar a província auto-suficiente em termos de proteína animal e num "centro satélite de produção de animais”.

"Quando o projecto arrancou, as matrizes de porcos, galinhas, cabritos, inclusive de ovos ralados, vinham de Luanda”, disse José Fernandes, acrescentando que, com o fomento da pecuária na província, o cenário mudou radicalmente, com a criação de três centros satélites de produção de animais.

Destacou o centro satélite de produção de aves adstrita à empresa Apolónia, de produção de porcos da fazenda "JB”, no município de Cabinda e o de produção de caprinos da empresa HALL do grupo Abílio de Amorim, na aldeia do Mandarim, no município de Cacongo.

Os três centros satélites, disse, permitiram que Cabinda, neste momento, seja sustentável na produção de animais para serem distribuídos às famílias para criação, por um lado e por outro, para que num curto espaço de tempo ser também auto sustentável na produção de proteína animal.

Famílias envolvidas no projecto

Das 15.625 famílias previstas pelo projecto, que deveriam estar envolvidas no sector da criação animal, neste momento estão apenas 5.897, representando cerca de 38 por cento da meta global.

O responsável do projecto referiu que a percentagem atingida é um mal menor por se tratar de um processo evolutivo e que o mais importante neste momento é que " já não se compra, a partir de Luanda ou mesmo de outras paragens, galinhas, ovos e cabritos”.

"Cabinda já está a fazer produção de matrizes melhoradas de animais, para serem distribuídos às famílias envolvidas no processo de criação e isso já é muito bom”, disse.

Outro elemento destacado por José Fernandes, que a cadeia de criação animal está a produzir, é a geração de empregos na província, tendo sublinhado que neste momento estão a trabalhar nos centros satélites de produção de galinhas, cabritos, porcos e aves um total de 50 pessoas, além de 1.200 trabalhadores indirectos.

Produção de galinhas

Segundo a fonte, a par da produção do cacau, que regista uma adesão crescente de produtores, a criação animal não foge à regra. Para fomentar a criação de aves (galinha), o projecto disponibiliza, de forma gratuita, a cada beneficiário, 20 galinhas. Depois do processo reprodutivo, que dura entre quatro e cinco meses, este é obrigado a dar 10 galinhas gratuitamente a um outro interessado para procriação.

"O beneficiário tem a responsabilidade de pegar os animais depois do processo reprodutivo, dar ao seu vizinho e assim sucessivamente”, notou.

  Ração animal

Para possibilitar a adesão de mais criadores ao processo de criação animal, José Fernandes disse que o projecto disponibilizou 4 milhões de dólares ao Banco Sol, para gerir uma linha de crédito para apoiar os produtores locais com iniciativas empreendedoras, sobretudo no domínio produtivo.

Com base nisso, acrescentou, oito mil produtores locais já beneficiaram de metade do financiamento.

Entre os beneficiários do crédito, a fonte citou o investimento feito por dois jovens empreendedores locais na criação de duas fábricas de ração animal, para manter sólida a cadeia de criação animal.

Para que as duas unidades fabris tenham matéria-prima suficiente para a produção de ração, disse, o projecto está a introduzir, no domínio de produção agrícola, variedades melhoradas de milho e de soja, "para permitir que as famílias possam produzir essas culturas em grande escala e vendê-las às duas fábricas, no sentido de produzirem muita ração, que é utilizada para a criação animal”, notou.

"Não haverá fomento de criação animal se não tivermos um mercado sustentável de ração”, disse José Fernandes, sublinhando que o papel do projecto é de criar capacidade interna para que Cabinda comece a produzir ração animal.

Óleo de palma

O projecto de Desenvolvimento das Cadeias de Valor da Agricultura, no âmbito do fomento de culturas comerciais, tem o foco virado também no cultivo do palmar, para a produção de óleo de palma, com vista a tornar a província auto-suficiente neste produto.

A Fazenda HALL, do grupo Abílio de Amorim, localizada na aldeia de Mandarim, no município de Cacongo, é uma das parceiras do projecto, que está a notabilizar-se no cultivo de palmar.

A produção de palmar está a ser desenvolvida numa área de aproximadamente 400 hectares, com mais de 50 mil palmeiras melhoradas já em fase de produção e colheita.

Falando ao Jornal de Angola, aquando da recente visita da governadora da província, Mara Quiosa, àquela unidade agrícola, o proprietário da fazenda, Herculano de Amorim, disse que vai continuar a expandir a plantação de palmar para potenciar a futura fábrica de óleo de palma que tenciona instalar na província até 2025.

A fábrica de óleo de palma em perspectiva, segundo Herculano de Amorim, terá como fonte primária de matéria-prima o dendém produzido pelo palmar da sua fazenda e de toda a produção da província, uma vez que a mesma terá a capacidade de produzir cerca de duzentas mil toneladas de óleo de palma por ano.

"Estamos a negociar com as instituições financeiras e não só para que consigamos ter a fábrica a funcionar em 2025”, disse o fazendeiro, acrescentando que, além da vasta extensão de hectares cultivados com palmar, a fazenda dispõe ainda de um viveiro com a capacidade para um milhão de mudas (plantas), para fornecer a agricultores dos quatro municípios da província (Cabinda, Cacongo, Buco-Zau e Belize).

"Celebramos um contrato com o projecto de Cadeia de Valores Agrícola, como fornecedor de mudas de várias espécies, incluindo de frutas e plantas nativas para repovoamento florestal”, notou.

A par do perímetro onde o fazendeiro está a cultivar o palmar, a unidade agrícola tem ainda uma área de 15 hectares de goiabeiras, sete de culturas diversas, entre cajueiros, abacateiros e mangueiras.

A fazenda HALL do grupo Abílio de Amorim não se dedica somente à actividade agrícola, mas também é tida como um dos maiores centros satélites da província na reprodução de caprinos para o fomento pecuário.

"Em termos de produção animal, temos uma parceria com o projecto Cadeia de Valores Agrícola, em que nós servimos de polo de acomodação de toda a população animal que o projecto adquire e depois é distribuída para os vários municípios”.

A fazenda dedica-se, também, à produção de peixe tilápia, a partir de um dos afluentes da lagoa de Tchissise. Não se sabe ao certo a quantidade de peixes em reprodução, mas segundo apurou o Jornal de Angola, quantidades consideráveis de peixe têm sido comercializadas no mercado local a preços bastante competitivos.

A fazenda conta com 50 trabalhadores, número que, segundo o seu proprietário, poderá aumentar futuramente para 200, quando a unidade agrícola estiver em pleno funcionamento.

Herculano de Amorim disse que já investiu na fazenda mais de 500 milhões de kwanzas, cifra que poderá aumentar ainda mais com a implementação de outros projectos.

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