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Guerra no Sudão provocou uma das piores crises mundiais

A guerra no Sudão provocou "uma das piores crises humanitárias" no mundo desde há décadas, afirmou, sábado, o presidente internacional da Organização Não-Governamental (ONG) Médicos Sem Fronteiras, Christos Christou.

23/06/2024  Última atualização 10H25
Presidente internacional da ONG considera a resposta humanitária profundamente inadequada © Fotografia por: DR

A guerra eclodiu em Abril de 2023 entre o exército, liderado pelo general Abdel Fattah al-Burhane, e as forças paramilitares de apoio rápido (RSF) do seu antigo adjunto, o general Mohamed Hamdane Daglo.

O conflito causou dezenas de milhares de mortos e deslocou mais de nove milhões de pessoas, segundo a ONU. "O Sudão está a ser marcado por uma das piores crises a que o mundo assistiu em décadas e a resposta humanitária é profundamente inadequada", afirmou Christou na rede social X (antigo Twitter). "Há níveis extremos de sofrimento em todo o país e as necessidades aumentam de dia para dia", acrescentou.

Ambas as partes foram acusadas de crimes de guerra por terem deliberadamente visado civis, bombardeado áreas povoadas e bloqueado a ajuda humanitária, apesar da ameaça de fome que milhões de sudaneses enfrentam. Grupos de defesa dos direitos humanos e os Estados Unidos acusaram também os paramilitares de limpeza étnica e de crimes contra a humanidade.

Na semana passada, os Estados Unidos anunciaram 315 milhões de dólares em ajuda de emergência para o Sudão e apelaram a ambas as partes para que permitissem o acesso à ajuda humanitária, alertando para o facto de o país estar ameaçado por uma fome de proporções históricas. A embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, disse que a fome no Sudão pode atingir níveis nunca vistos desde a fome na Etiópia no início dos anos 80, que matou 1,2 milhões de pessoas.

"As projeções de mortalidade indicam que mais de 2,5 milhões de pessoas - cerca de 15% da população - em Darfur e Kordofan, as regiões mais afectadas, poderão morrer até ao final de Setembro", alertou. "Esta é a maior crise humanitária do planeta e ameaça agravar-se ainda mais com a aproximação da estação das chuvas", acrescentou.

As Nações Unidas estimam que cinco milhões de pessoas no Sudão estão a sofrer de fome extrema, enquanto a comida também escasseia nos países vizinhos, onde dois milhões de sudaneses se refugiaram. Os esforços repetidos dos Estados Unidos para pôr fim ao conflito falharam.

Vários países estrangeiros deram o seu apoio a ambos os lados. O Sudão expulsou diplomatas dos Emirados Árabes Unidos por suspeita de apoiarem as RSF, enquanto o Egipto, a Turquia e o Irão declararam apoiar o exército. De acordo com os MSF, os recentes combates em el-Facher, a última cidade do Darfur fora do controlo dos paramilitares, fizeram mais de 220 mortos.

Na semana passada, o Conselho de Segurança da ONU adoptou uma resolução exigindo o fim do "cerco" de el-Facher pelas RSF e apelou a "todos os Estados-membros  que se abstenham de qualquer interferência externa". Na terça-feira, o embaixador do Sudão na ONU acusou os Emirados Árabes Unidos, numa reunião do Conselho, de serem responsáveis pela continuação da guerra. O representante dos Emirados Árabes Unidos rejeitou a acusação. Os Médicos Sem fronteiras no Sudão informaram na rede social X que,  em Omdurman, o hospital Al-Naw, "apoiado pelos MSF", tinha sido alvo de um bombardeamento na quarta-feira, que fez pelo menos três mortos e 27 feridos. Segundo a mesma fonte, foram efectuados bombardeamentos intensos nos arredores da cidade.

O conflito no Sudão vai levar os países envolvidos a "aprender à própria custa" a importância de um sistema internacional baseado em regras, afirmou ontem o antigo secretário-geral adjunto da ONU, Mark Malloch-Brown. "Penso que o Sudão é extremamente difícil. É uma espécie de exemplo de como todos os tipos de potenciais actores regionais se estão a juntar e a acabar em conflito", afirmou, durante uma conferência organizada pelo Instituto de Relações Internacionais Chatham House, em Londres. Malloch-Brown lamentou que o "respeito por qualquer tipo de abordagem internacional a esta questão seja muito limitado".

"Os Estados do Golfo, o Egipto e o Irão terão de aprender à própria custa que é necessário um sistema baseado em regras, mesmo para lidar com o Sudão", vincou. No entanto, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Qatar e conselheiro do primeiro-ministro, Majed Al-Ansari, questionou o empenho dos países ocidentais, em especial os Estados Unidos, em resolver a situação.

"Estamos a ver que a comunidade internacional, em vez de intervir para mostrar como a ordem internacional baseada em regras pode resolver esta questão, está na verdade a retrair-se e a deixar [o Sudão] entregue a si próprio", acusou. Por outro lado, disse que "os actores que agora desempenham um papel negativo no Sudão compreendem como funciona a ordem internacional baseada em regras".

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