Reportagem

Instalação de energia da rede pública reduz custos de produção do sal

Arão Martins / Benguela

Jornalista

As salinas Calombolo, no município da Baía Farta, em Benguela, existem há quase um século e, segundo o empresário Adérito Areias, é a primeira vez que a zona recebe energia da rede pública.

20/07/2023  Última atualização 07H40
Grupo empresarial Adérito Areias quer aumentar a produção das actuais 200 mil toneladas de sal/ano para 400 a 500 mil toneladas, com a energia eléctrica da rede pública © Fotografia por: Arão Martins | Edições Novembro | Benguela

A produzir sal numa área superior a 2.500 hectares, as Salinas Calombolo, que empregam três mil pessoas, têm agora um Sistema de Eletrificação da Central de Bombagem com capacidade de 630 KVA, inaugurado recentemente.

Adérito Areias, responsável pela produção de 80 por cento do sal no país, explicou que as Salinas Calombolo completam 100 anos no dia 23 do próximo mês. O novo sistema de energia eléctrica, disse, vai contribuir na redução dos custos de produção de sal, com a poupança de mais de cinco mil litros de gasóleo por dia.

Para o sucesso da interligação, explicou, o Grupo Adérito Areias investiu, da rede até à instalação do Posto de Transformação (PT), cerca de 250 mil dólares.

"Antigamente produzíamos 10 mil toneladas/ano ou nem tanto, porque o nosso sal era vocacionado apenas para a transformação do peixe seco. Hoje produzimos a sério e o objectivo é atingir as 500 mil toneladas por ano”, garantiu.

O empresário enalteceu a acção do Governo de expandir a rede pública até Chamume. "Temos que agradecer ao Governo, por ter colocado aqui a linha e solicitamos que continue com esta linha até ao Muhaningo, para podermos beneficiar mais 20 salinas que estão neste momento a fazer grandes investimentos nesta zona da cidade do sal”, solicitou.

Cidade do Sal está a crescer

Adérito Areias afirmou que a Cidade do Sal está a crescer e a criar as condições necessárias para um bom ambiente de negócios.

Esclareceu que apesar dos custos com os combustíveis, o grupo produzia mais ou menos 200 mil toneladas de sal/ano. Com a energia eléctrica da rede pública, informou, o objectivo é atingir entre 400 a 500 mil toneladas de sal anualmente.

"Este será o nosso foco. O país tem desafios na produção nacional e nós temos que ser o grande produtor de sal em África”, garantiu.

Adérito Areias disse que há necessidade de enquadrar mais de 500 jovens e a principal preocupação é a transportação do pessoal. Por isso defendeu a criação de uma linha de transportes públicos de passageiros da sede municipal da Baía Farta até ao Muhaningo.

Importância estratégica do sal

Adérito Areias, que é, igualmente, presidente da Aliança Empresarial, destacou a importância estratégica do sal para o país.

"Não temos que ver o sal só para comer. Temos que ver o sal como um conservante, produto para os petróleos, para fazer soda cáustica e para fabricar fertilizantes”, salientou, frisando que com a pandemia da Covid-19 os consumos foram "extremamente” altos.

Lamentou o facto de o país ainda importar soda cáustica, quando há potencial para se transformar localmente.

Destacou a importância do Corredor do Lobito, que considera ser um meio oportuno para fazer circular o sal para os países vizinhos de Angola, como a República Democrática do Congo (RDC).

Petrolíferas compram cada vez mais sal

O empresário Adérito Areias informou que há cada vez mais interesse das empresas petrolíferas que actuam no mercado nacional pelo sal produzido nas salinas de Benguela. "Muitas empresas do sector petrolífero estão a fazer determinadas prospecções, o que consome muito sal. Estamos felizes com o ganho”, enalteceu.

Actualmente, garantiu, todas as salinas já estão a fazer fornecimento de sal às empresas petrolíferas, através da Associação de Produtores e Transformadores de Sal (APROSAL), que faz a gestão e a distribuição por cada uma das salinas de quem fornece.

Segundo o responsável, além das Salinas Calombolo, todas as salinas com sal em boas condições estão no mesmo processo.

"Por isso é que digo que o sal é um bom negócio. As petrolíferas vão precisar de muito sal. Estão a ser feitas prospecções muito grandes, então vamos colocar mais gente para o sal”, defendeu.


APROSAL destaca impacto positivo no ambiente

O presidente da Associação dos Produtores de Sal de Angola (APROSAL), Tottas Garrido, reconheceu que Chamume é o ponto fulcral da produção de sal no país e que a utilização de energia eléctrica da rede pública contribui positivamente no ambiente.

"Depois de muitos anos de luta para se ter energia eléctrica no Chamume, uma área onde sai quase 80 por cento do sal, este passo mostra que estamos no caminho certo”, salientou.

Lembrou que esta é a segunda ligação da rede pública que foi feita, estando previstas, nos próximos três meses, mais duas ligações.

"Isso vai permitir que haja uma redução significativa nos custos dos nossos associados, quer em termos de transporte de combustível, quer em termos de impacto ambiental”, sublinhou.

Na vertente ambiental, referiu, há vantagens porque vai se começar a usar energias limpas para a produção do sal.

"Não vamos sentir o impacto de ter energia da rede pública já hoje, mas sim, a curto prazo, já que, a partir deste momento, os associados irão partir para um investimento para a mudança do material que usavam na produção de sal”, esclareceu.

A APROSAL é uma associação de âmbito nacional e controla 17 associados nas províncias do Bengo, Namibe, Cuanza-Sul, Namibe e Benguela (com maior número).

ENDE vai continuar a expandir a rede

O director de exploração e manutenção de alta e média tensão da região centro da Empresa Nacional de Electricidade (ENDE), José Lopes, disse que, com a interligação, os empresários vão deixar de suportar custos às manutenções constantes de geradores e ter energia da rede, que é mais barata.

Explicou que a interligação feita na Salina Calombolo faz parte da primeira fase, que inclui 20 quilómetros de rede até à central das Salinas Calombolo. O objectivo, disse, é lançar uma rede superior a 22 quilómetros, para abranger toda a área onde estão instaladas as restantes salineiras.

José Lopes lembrou que numa das visitas que o ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges, efectuou à cidade do Sal, orientou a ENDE a fazer a instalação de alguns Postos de Transformação.

"Já instalamos alguns Postos de Transformação de 160 Kva, falta apenas a ligação de baixa tensão. Vamos continuar a trabalhar nesse sentido junto das entidades afins”, garantiu.

Apelou aos empresários a cumprirem com os pagamentos da energia, para que mais projectos sejam concretizados.

Contributo das salinas

A administradora municipal da Baía Farta, Miraldina Torres, destacou o contributo das Salinas Calombolo na criação de renda das famílias, com o emprego de jovens, não só do município, mas de vários pontos do país.

Miraldina Torres afirmou que a inauguração do sistema de electrificação da central de bombagem com capacidade de 630 KVAs beneficia, de forma directa ou indirecta, também, a comunidade de Chamume, uma demonstração clara de que as instituições do Estado caminham de mãos dadas com o empresariado local na resolução dos problemas do povo. Garantiu o compromisso do Governo provincial de estender a rede eléctrica pública até ao Muhaningo, Bandeira e Saco.

Vidas transformadas pelo sal

A casa construída com o salário proveniente da histórica empresa das Salinas Calombolo, uma das referências na cidade do Sal, no município da Baía Farta, motivou Fátima Navilemba, 55 anos, a fixar residência na província de Benguela.

Fátima deixou o Bié, sua terra natal, em 2004. É no Chamume onde fixou residência e a fazer a sua vida e criar família. Na salina, começou a trabalhar na área de encher sacos. Com o tempo e à medida que a idade foi aumentando, explicou, para evitar muito esforço físico, foi transferida para a área de limpeza.

Há 19 anos a trabalhar nas salinas, Fátima Navilemba conta que nunca lhe passou pela cabeça deixar para trás o hábito de pastar gado, ir à lavra e outras importantes atrações na aldeia de origem para fixar residência no Chamume (Baía Farta).

"Para uma viagem que era de apenas uma semana, em visita a uma irmã, decidi ficar duas semanas. Com o tempo, criei amigas e então tive tempo de sobra para descobrir o que fazer em Chamume, onde surgiu a oportunidade de emprego”, disse.

Além de ter construído a casa própria, os rendimentos das salinas permitem-lhe suprir outras necessidades e custear os estudos dos filhos.

"A experiência é positiva", disse. "Encontrei e criei uma família em Benguela. Ganho mais de 50 mil kwanzas. Com o dinheiro é possível suprir algumas necessidades das crianças, sobretudo, na doença, roupa, caderno e livros para a escola das crianças”, sublinhou.

Constantino Sambambi, 28 anos, é outro trabalhador das Salinas Calombolo. O jovem foi colocado na Central de Carregamento.

Natural do Huambo, Constantino conta que trabalha na empresa há 1 ano. Explicou que soube da oportunidade de emprego por intermédio de uma tia, Cristina Canjala, que vive em Benguela.

"A minha tia vive no Chamumue há vários anos. Numa visita que efectuou à nossa aldeia, no Huambo, mencionou a salina que tem dado oportunidade de emprego a vários jovens”, disse, mostrando-se feliz ao encontrar vários amigos com quem brincava no Huambo.

A sua função é carregar camiões de sal que partem para diversos pontos do país. Disse que a experiência é positiva e o salário corresponde ao trabalho que faz.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Reportagem