Reportagem

Magistério Primário da ADPP é referência no ensino de qualidade

Victor Mayala | Soyo

Jornalista

Instituição de ensino adstrita à Organização Não-Governamental (ONG) Ajuda de Desenvolvimento de Povo para Povo (ADPP), a instituição recebe, anualmente, alunos provenientes dos mais diferentes pontos do país

12/07/2023  Última atualização 09H36
© Fotografia por: Adolfo Dumbo | Edições Novembro | Soyo

"Quando concluir o meu curso de professor, vou criar projectos que irão ajudar a sociedade, como, por exemplo, abrir um colégio para permitir que muitas crianças da minha região possam ter acesso ao ensino”. Este é, no essencial, o extracto de um diálogo que o Jornal de Angola manteve, no município do Soyo, com António Garcia José, 18 anos, estudante do 1º ano da Escola do Magistério Primário adstrito à Organização Não-Governamental ADPP.

Franzino, António Garcia José contou que, desde tenra idade, alimenta o sonho de ser professor, razão pela qual ingressou ao Magistério Primário da ADPP para tornar isso realidade.

"Sempre foi meu desejo estar aqui, para concretizar o sonho de ser um professor. A minha experiência aqui no magistério é boa”, disse António Garcia José, com olhos fixos no repórter, para mais adiante considerar um desafio enorme estudar numa instituição escolar que funciona em regime de internato.

Natural do município do Soyo, António Garcia José está muito próximo de concluir o curso de professor. De forma convicta, frisou que tem pautado pelo cumprimento cuidadoso dos procedimentos didáctico- pedagógicos, associado à realização de tarefas extra-curriculares necessárias à formação multifacetada dirigida aos professores.

"Estudar aqui é desafiante, mas com dedicação e força de vontade a adaptação fica fácil. Por outro lado, a relação com os colegas e professores tem sido muio boa”, disse António Garcia José.

Quem igualmente abraçou o desafio de estudar no Magistério Primário da ADDP é Délcia Joaquim Ambriz, 18 anos. Aparentemente tímida, mas com bastante facilidade no discurso, na ânsia de concretizar a sua paixão pela docência a jovem deixou o conforto da casa dos pais em Luanda, capital do país, e reside agora no internato do Magistério Primário da ADPP, que dista cerca de 12 quilómetros do centro da cidade que muitos denominam de petrolífera.

Ao Jornal de Angola confidenciou que no início foi difícil adaptar-se à rotina no internato. Segundo manifestou, foi primordial o apoio dos colegas que encontrou e a compreensão destes no desafio de coabitar com pessoas de diferentes regiões do país, com hábitos e costumes igualmente distintos. Délcia Joaquim Ambriz, que enalteceu a rigorosidade empreendida pelos professores na execução das tarefas escolares programadas, realçou que tal facto tem reflexos na qualidade e competência técnica dos finalistas da instituição.

"Em Luanda, fiz alguns cursos baseados na pedagogia, mas não foram tão abrangentes como aqui no Magistério da ADPP”, considerou.

Torres dos Santos Miguel, 19 anos, também estuda no Magistério da ADDP. De forma detalhada, contou que a convivência com os colegas e professores tem contribuído significativamente para moldar a sua personalidade.

"Estou a frequentar o 2º ano e, desde então, adquiri experiências que são de grande valia para mim. Esta é uma escola muito diferente das outras que já tinha frequentado, digo isso porque a ADPP atribui desafios que nos obrigam a esforços diários maiores. A escola exige que os alunos estudem em três períodos, não apenas para formação académica, mas também para absorver conhecimentos sobre a vida no geral”, referiu.


Cerca de mil professores formados

Em funcionamento há 22 anos, o Jornal de Angola apurou que, durante este período, o Magistério Primário da ADPP formou cerca de mil professores.

O director-geral da instituição, Wilson Jaime Sumbula, revelou que, deste número, 50 por cento foram enquadrados no sector da Educação, ao passo que os restantes encontraram emprego em outros ramos de actividade. Entretanto, no presente ano lectivo, foram matriculados 47 novos alunos, dos quais 13 do sexo feminino, que se juntaram aos 45 outros inscritos nos anos anteriores, perfazendo um total de 92 alunos internos.

"Somos uma escola formada desde 2001 e, durante este período, o nosso dever principal é trabalhar com o povo, garantir uma formação de qualidade, formar professores para o treinamento das populações na luta contra o analfabetismo. Formamos professores para o ensino primário, especificamente para as zonas rurais, por ser lá onde há maiores dificuldades de acesso ao ensino”, disse.

À frente dos destinos da escola  desde Agosto do ano passado, Wilson Jaime Sumbula mencionou que esta tem recebido candidatos de várias regiões do país, com particular destaque para as províncias do Uíge, Bengo, Luanda, Cabinda e Huambo.

Além de avançar que o programa de formação tem um período de quatro anos, dos quais no primeiro ano o aluno aperfeiçoa conhecimentos nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática e Filosofia, Wilson Jaime Sumbula reforçou que o segundo ano tem como designação o Ano Internacional do Professor. Neste ano, segundo manifestou, o futuro professor realiza um périplo pelas distintas províncias do país para conhecer a realidade social, económica e cultural de cada povo.

"Eles vivenciam as diferentes realidades do nosso país, nos domínios da educação, cultura, agricultura, saúde e outros, com o objectivo de buscar experiências e perceber como os outros lidam com diversas situações do quotidiano”, fez saber Wilson Jaime Sumbula, sublinhando que, no terceiro ano, os alunos iniciam a fase experimental do processo de ensino, enquanto o quarto ano está reservado ao processo de estágio.

"Existem práticas pedagógicas e estágios. A prática pedagógica, que é a fase experimental em que o aluno trabalha sob a orientação do professor titular, é feita nas escolas primárias daqui do Soyo. Quanto aos estágios, são feitos nas escolas das zonas de origem dos alunos”, esclareceu.


Avaliação de desempenho

Relativamente ao processo de estágio, o director-geral do Magistério Primário da ADPP explicou que, regra geral, a direcção da escola realiza visitas periódicas para avaliar o desempenho dos alunos.

A par daquilo que é a prática docente, Wilson Jaime Sumbula acrescentou que os estagiários desenvolvem duas práticas, nomeadamente, uma consubstanciada na implementação de um micro-projecto, que pode ser uma sala de alfabetização, e outra sobre o ensino à distância.

"Diante disso, afirmo categoricamente que não temos dúvidas da qualidade do professor que formamos aqui neste magistério”, realçou Wilson Jaime Sumbula, tendo lembrado que a avaliação do desempenho dos alunos é contínua.

Por outro lado, em função das tarefas atribuídas e de cumprimento obrigatório, a instituição tem planos semanais que variam em função daquilo que são as exigências e as necessidades do futuro professor.

"A nossa escola não se foca apenas naquilo que é a formação académica, mas sim olhamos na formação multifacetada, na medida em que pretendemos contribuir naquilo que é o desenvolvimento comunitário. Por exemplo, o nosso estudante precisa também de conhecer um pouco sobre o empreendedorismo, produção alimentar, saúde comunitária, os media e liderança”, referiu.


Número reduzido de professores preocupa direcção

Presentemente, a escola funciona com 12 professores, número que Wilson Jaime Sumbula considerou bastante reduzido para fazer face ao programa curricular composto por 27 disciplinas, das quais se destacam a Pedagogia, Psicologia, Filosofia, Língua Portuguesa, Matemática, Sustentabilidade e Estilo de Vida, Humanismo Solidário e Investigação Científica.

"O número de professores revela-se insuficiente para atender as necessidades. São necessários mais 27 professores para colmatar o défice, portanto, temos interagido com a Direcção Municipal e com a Direcção Provincial da Educação sobre a necessidade de aumentar o número de professores na nossa escola”, manifestou Wilson Jaime Sumbula, que, por outro lado, lamentou o facto de a escola não dispor até agora de energia da rede pública, mesmo tendo muito perto uma subestação eléctrica.

O deficiente apetrechamento da biblioteca com manuais específicos é outra dificuldade manifestada pela direcção da instituição. Situação quase idêntica acontece na sala de informática, onde, na maior parte das vezes, as aulas são realizadas sem recurso à Internet.

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