Cultura

Memórias de uma aspirante a condutora

Ano 2006. Uma jovem chega, às primeiras horas da manhã, às instalações da Direcção Nacional de Viação e Trânsito (DNVT). Era o dia do seu exame de Código de Estrada. Ansiosa, dá uma mirada pelo local, em busca da sala de exames, enquanto olha para o relógio. É cedo ainda, pensou.

07/02/2021  Última atualização 15H07
Condução, cuidada que garante-lhe atenção à distância entre os carros. © Fotografia por: Arquivo
 Ao lado, um jovem senhor, fardado, observa-a instantaneamente, enquanto atende a um telefonema. Aguarda que o polícia termine a conversa ao telefone e dirige-se-lhe:
"Bom dia. Por favor, estou à procura da sala de exames. Pode ajudar-me?”, pergunta.
"Bom dia. Posso, sim. É aquela ali”. O homem aponta para uma sala à sua esquerda. "Tem exame hoje?”.

A jovem responde afirmativamente. "Boa sorte”, deseja-lhe o polícia, ao que ela agradece, dirigindo-se à sala. A avaliação tem início, pontualmente, à hora marcada. Uma instrutora distribui perguntas a cada um dos cinco presentes na sala.
"Que sinais são esses?” Os dois primeiros estudantes não acertam nas respostas. A jovem, que passou a semana toda a ler o Código de Estrada e a exercitar na escola de condução que frequentava, responde: "proibido parar e proibido parar e estacionar”. "Certo”, responde a professora. Até àquele instante, estava "uma pilha de nervos”.

Entretanto, com a resposta à primeira pergunta validada, a jovem começa, finalmente, a relaxar. Ao seu lado, um estudante dá mostras de que também fez as tarefas de casa. Responde acertadamente. A instrutora dirige mais uma pergunta a cada um dos jovens bem-sucedidos. "Se acertarem, estão aptos e podem ir para casa”.
Qual é a diferença entre parar e estacionar? Era para a jovem, que sorri, no seu íntimo, e responde acertadamente. A caminho do exame, no táxi, foi a última pergunta que leu. "Pode ir para casa, vê-se que estudou. Regresse amanhã, para o exame de condução”, diz a professora. O estudante ao seu lado teve o mesmo desempenho. Minutos depois, deixou, igualmente, a sala de exames.

No dia seguinte, antes mesmo da madrugada dar lugar ao dia, abandona, ansiosa, o conforto da cama e prepara-se para a segunda e última avaliação. O receio de cometer erros e ser reprovada no exame de condução leva-a a aprontar-se antes mesmo do raiar do sol. Ao menos não ia "reprovar” por atraso. Pensou. Chega ao local 30 minutos antes do instrutor de condução, que a tranquiliza. "Vai correr tudo bem”, garante-lhe. "Atenção à distância entre os carros. Aqui dentro da Viação e Trânsito não se buzina. Se o fizeres, reprovas imediatamente!”, orienta o professor.

"Bom dia! Vejo que passou no exame de ontem. Está de parabéns!”. Era o polícia que, no dia anterior, indicou à jovem a sala de exames de Código de Estrada. "Bom dia, sim. Muito obrigada. Agora falta ser aprovada na condução”, responde a quase condutora.
"O exame de condução é mais fácil; vais conseguir. Boa sorte”, despede-se o polícia.

A jovem agradece-lhe pela simpatia e pelas palavras de incentivo. Ao volante do carro da escola de condução, aluna e instrutor deixam o local e rumam à Nova Marginal, seguindo pela Praia do Bispo. O receio da jovem se concretiza: o professor encontra uma elevação e pede à instruenda que faça o ponto de embraiagem, o terror dos aspirantes a condutor. "Se tiveres calma e te concentrares, consegues. Não há necessidade de entrares em pânico”, tranquilizou-a. Apesar do receio, a  jovem realiza, com sucesso, a difícil manobra para quem tem pouco tempo de estrada. "Está aprovada!”. O professor dá a boa nova. O regresso ao ponto de partida, a DNVT, ocorre em clima festivo. Antes de se despedir da nova condutora, o instrutor faz três perguntas: "De onde conheces o Director Nacional dos Serviços de Viação e Trânsito?”
"Não conheço”, responde a jovem.

"Como não conheces, se antes do exame conversaste com ele? Ainda te desejou boa sorte e tudo! Não conheces o Inocêncio de Brito?” (Actualmente noutra função). A jovem, boquiaberta, olha para o professor, sem conseguir responder às últimas questões. A caminho de casa, pergunta a si mesma se teria coragem de se dirigir ao polícia com quem conversou durante os dois dias de exame, se soubesse que se tratava, afinal, do responsável máximo do local onde se encontrava. É muito provável que não. Escolheria, com certeza, outro polícia para pedir ajuda.

Edna Cauxeiro 

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