Opinião

África 2021: tornar a excepção uma regra

Adebayo Vunge

Jornalista

Na véspera da celebração do dia da unidade africana, o 25 de Maio, julgo que não vale a pena “chover no molhado”. É que quando falamos de África caímos sempre no mesmo discurso, num tom para lá de crítico, verdadeiramente céptico, como se nada estivesse a acontecer nos 54 países, do Cairo ao Cabo.

24/05/2021  Última atualização 09H35
Em 2021, é verdade que não podemos passar ao lado das consequências sociais e económicas da pandemia da Covid-19, sendo o desafio da gestão das dívidas públicas e o desemprego que grassa entre a juventude os verdadeiros "cavalos de batalha”.
Nesse tempo, também não podemos deixar de olhar para as questões climáticas que começam a afligir várias zonas, de que Angola não é por exemplo excepção e de que se podem referir os episódios de seca, cheias, desflorestação e desertificação – e o fenómeno do terrorismo cujos casos mais recentes apontam-nos para o que se passa em Moçambique, para além, obviamente do Sahel, com consequências que resultam na vertiginosa e vergonhosa onda migratória que se assiste no mediterrâneo.

No fundo, a falta de perspectiva para a população em muitos países africanos resulta também da má-governação e ausência de políticas públicas, ou quando estas existem são erráticas, tal como a deficiente integração regional, devido em grande medida a ausência de homogeneidade no tocante a realidade dos diversos países. Veja-se por exemplo as diferenças entre a África do Sul e os demais países da SADC.

Ora, recentemente, a revista panafricana The Africa Report, braço anglófono do grupo Jeune Afrique, trouxe um rico dossier sobre os casos de sucesso em África. É um levantamento interessante e muito concreto de histórias de sucesso em vários quadrantes que nos fazem preservar na crença que de nem tudo está perdido em África e que, por isso, devemos acreditar e manter firme as esperanças no futuro do continente, tornando o que ainda são casos de excepção a nossa verdadeira regra.

Em primeiro lugar, noto com satisfação o esforço de valorização das matérias primas em África. O exemplo do cacau, sobre o qual o Presidente da Côte d´Ivoire pretende criar uma cadeia de valor local é sem dúvidas digna de realce e sobre o qual, depois de algumas resistências, encontrou acolhimento dos grandes produtores mundiais de chocolate. Do mesmo modo, poderíamos citar a aposta na diversificação de fontes de receitas como é a produção de flores na Etiópia ou ainda o fomento da indústria de serviços financeiros no Quénia e o turismo em Cabo-verde, recursos geridos com absoluto rigor e parcimónia em prol do bem-estar das populações.

Em segundo lugar destacaria também o papel dos talentos africanos. Aqueles que surgem intramuros, como os que dão cartas em diversas organizações internacionais. Incluiria por exemplo neste naipe quadros de elevado valor como o economista senegalês Mockhtar Diop que é o novo patrão do IFC (braço financeiro e de apoio ao sector privado do grupo Banco Mundial). Apontaria também a dama de ferro nigeriana, a madame Ngozi Okonjo-Iweala que dirige há poucos meses a Organização Mundial do Comércio. Formada em Harvard e no MIT, ela é dona de um curriculum invejável na Nigéria e nas organizações internacionais, e é hoje uma das mulheres mais poderosas do mundo, ao lado de Kristalina Georgieva e Christine Lagarde, respectivamente Directora-geral do FMI e Presidente do Banco Central Europeu. À essa lista juntaria o director-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), o etíope Tedros Ghebreyesus, que assumiu a organização, estando a lidar, entre outros assuntos, com a gestão global da pandemia da Covid-19. Ora a lista é infindável e notamos assim o aparecimento de uma eleite intelectual e tecnocrata de africanos que poderão jogar um papel decisivo na transformação do continente nos próximos vinte e cinco anos.

No final do dia, a situação do continente depende sobretudo dos próprios africanos. Das lideranças, mas não só. Do compromisso e da responsabilidade dos diferentes actores em assumir um novo destino e assim mudar o curso da história. Trazer África ao centro e adoptar políticas que permitam reduzir a dependência da ajuda externa e encontrar um novo rumo e dinamismo como se nota, por muito que se possa apontar, em países como o Ruanda, Namíbia, Botswana, Cabo-Verde, Tunísia, entre outros.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião