Opinião

Caxito, cidade igual a si mesma

Guimarães Silva

A urbe continua igual a si. De manhã acorda tranquila e disposta para receber visitantes. Dos seus, os Akwadange (Associação dos Amigos e Naturais do Dande) conhece de cor e salteado e recomenda os cuidados para suportar o clima tropical húmido. Colorida, com o verde em primeiro plano, areia a namoriscar com o betão dos passeios e o reflorescer dos jardins das alamedas frontal e lateral da famosíssima igreja da Santana.

17/03/2024  Última atualização 11H25

Caxito mantém-se geograficamente no mesmo lugar, com os hábitos, costumes e a hospitalidade que a caracteriza. Faz calor de dia, faça sol ou vento. De noite não se faz rogado, mantém o aquecimento, que obriga ao recurso a meios artificiais para apaziguar os ânimos. Ventoinhas e o ar condicionado fazem parte das tecnologias para amainar o clima. O recurso ao abano é pouco aconselhável nesta altura do ano, porque é ineficaz.

O cortejo de batas brancas ao longo da semana a enfeitar os corpos das crianças e jovens, é a imagem da fina flor dos futuros homens da ciência. Hoje comprometidos em enfrentar desafios no difícil trajecto de longos anos das carteiras da primária à Universidade, para a ilustre missão de aprender visando o contributo para um amanhã melhor.

A cidade não acolhe só os seus. Como pai-grande, tem igualmente, carinho para com alunos, estudantes e trabalhadores dos municípios das províncias de Luanda, Uíge e mesmo Zaire, que emprestam valores acrescentados ao crescimento económico. Vai daí que o transporte, por ora só o terreste, é essencial para cobrir distâncias intermunicipais e provinciais. O táxi e autocarros são os eleitos. Às tardes, os passageiros atrasados correm riscos de pernoitar…Tal é a concorrência e a avalanche de gente no término do Cauango.

A condição de zona de transição de Luanda para as províncias do Uíge e Zaire dá à cidade vestes de cosmopolita, predisposta a satisfazer as múltiplas necessidades que o corre-corre da vida impõe a todos que circulam pela Estrada Nacional nº 100.

Os jovens aqui preservam a sua identidade e têm na hospitalidade um dos pontos fortes. Entretanto, nos seus recantos têm acesso às tecnologias de comunicação e informação. Os telefones de diferentes marcas são na cidade do jacaré o pão nosso de cada dia. Aqui, como em outras paragens da nossa Angola, são peças para toda a obra, desde namoricos, pedidos de saldo aos incautos, lamentos, passar o mujimbo, fofocar, enfim…Tudo vale para que o pequeno aparelho android, ou outro, sirva o fim para que foi fabricado.

Quando a urbe acorda, o Rio Dande continua lá, sempre corrente no seu leito em direcção ao Atlântico. Do lado oposto, o canal de irrigação mantém-se intacto e funcional. É uma bengala que dá vida, mais a mais porque é nele onde parte das lides domésticas são satisfeitas. À cata de água para inúmeros fins, o banho a céu aberto, lavagem de roupa, da loiça, têm neste espaço uma mais-valia, só ultrapassada pelos agressivos mosquitos e a ausência de uma limpeza regular para eliminar lixos e outros inconvenientes.

A cidade reclama mais serviços de restauração. Os poucos são mesmo poucos para os apetites vorazes dos apreciadores do bom funge de bagre fumado, do cacusso grelhado, da carne de caça, ginguinga, banana pão, kizaka, mengueleka, muteta. Os mercados do Sassa e do Cauango são pontos alternativos na lista dos poucos sítios para comer. Há residências meio escondidas que oferecem pratos de invejar. Só quem conhece tira proveito destes sítios de bom manjar, inclusive com direito a reserva e kilapi. Ainda assim, a vida não pára em Caxito.

Todos os dias há maruvo à prova na linha do Museu da Tentativa. Banana, pitayas, melancias, tomate, repolho, pimento à venda no mercado de Porto Quipiri e ao longo da via para Caxito, onde o olhar casa-se com hectares e hectares de produção agrícola de invejar nas fazendas das redondezas.

Outra riqueza que a cidade abona é o traço cultural. Músicos, cuja fama ultrapassa a urbe, têm convites regularmente para dar show em diferentes palcos da capital do país. Os DJ’s estão na moda, com nomes de outra galáxia, que tocam acordes para fazer mexer o corpo, mesmo de dançarinos mais exigentes. Os produtores musicais e compositores encontram-se aos magotes. Ainda escultores com nome no mercado e artesãos à espera da venda do dia; aqui há grupos teatrais que dão cartas, que o diga o Avô Gongas. Há inclusive uma escola de artes.

Caxito é assim, dinâmica, a fervilhar no Verão e com gente senhora de si. O senão emparelha-se. Bancos comerciais abarrotados, ATM’s apinhados de gente e, por vezes, alinhados com a falta de dinheiro, mas um indivíduo, que sequer se esconde das autoridades, com um simples TPA tem massa para as encomendas.Outro inconveniente que choca, prende-se com alguns jovens que vêm dos municípios com um kibuto de cartões. Recolhem massa quanto baste, deixando o cofre do ATM na falência.

"As noites são as mães dos pensamentos” e do descanso do guerreiro. Assim acontece na terra dos cantores Titi Matias, Jovem Leão, Man Pepas, todos em memória; mas alguns miúdos irrequietos reunidos em gangues, na certa manietados pela insónia, alguma dose de cangonha e pacotinhos de líquidos agressivos, aproveitam o período da paz dos anjos para perturbar, fazendo das suas, com combates de paus, pedras,garrafas, catanas e machados. Ainda bem que o Comissário Delfim Calulu Inácio e seu efectivo não dormem para manter a paz e a tranquilidade de Caxito, que continua igual a si.

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