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Gestão da economia vai ser determinante para a escolha do próximo Presidente

Joe Biden, o candidato democrata, quer "destroçar" Donald Trump, candidato republicano à reeleição, com a mesma arma que este último usou há quatro anos: o emprego e a devolução da produção industrial da América

03/11/2020  Última atualização 08H00
© Fotografia por: DR
Apesar de estar à frente de Donald Trump nas pesquisas, o democrata Joe Biden ainda fica atrás do actual Presidente no quesito economia.De acordo com sondagens, há o registo de um sucesso, embora questionável, em termos de aumento da produção doméstica e a postura proteccionista de Donald Trump repercute, profundamente, entre os eleitores, graças a slogans cativantes como "America first" (América primeiro) e "Make America great again" (tornar os EUA grande novamente).Foi nessa base e sem surpresa, então, que Joe Biden promete restaurar a hegemonia industrial dos EUA e fabricar mais produtos dentro do país.Conforme reportado pela imprensa americana, embora a pandemia do coronavírus seja a primeira prioridade para o Governo de Biden, deseja expandir o uso das regras "Buy American" (compre produtos americanos), para ajudar a impulsionar a pequena indústria nacional e criar milhões de novos empregos na produção, incluindo um milhão no sector automotivo.Os planos económicos do antigo vice-Presidente incluem um imposto de 10 por cento sobre as empresas do país que terceirizam a fabricação para fora dos Estados Unidos e prometem eliminar lacunas que ajudam as multinacionais americanas a poupar lucros estrangeiros das garras do fisco. Projectos que se comprometam a reconstruir ou fortalecer a manufactura nacional beneficiariam de um crédito fiscal de 10 por cento.Segundo Mark Zandi, economista-chefe da Moody's Analytics, citado pela DW, as sanções e recompensas do plano de Biden podem ter um impacto significativo sobre onde as empresas americanas sediam as fábricas. Mas ele ressalta que, para serem realizados, os planos dependem de os democratas, além de ganhar a Casa Branca, também controlarem o Congresso. "Se o Senado permanecer sob o controle republicano, é difícil ver Biden fazer muito legislativamente, incluindo a implementação de plano Made in America”, sublinha.

Promessas discutíveis

Outros economistas consideram algumas das promessas de campanha de Biden tão discutíveis quanto as de Trump. Afinal, as multinacionais americanas costumam transferir a produção para o exterior para tirar benefício de mercados novos e inexplorados, como Brasil e China.

"Uma proporção muito alta de fábricas americanas no exterior está a produzir para venda e uso no país ou região onde a fábrica está localizada", observa o economista Ed Lotterman.
Segundo disse, pouco disso vai voltar para os EUA. Acredita que, mesmo se os fabricantes pudessem ser convencidos a transferir as suas fábricas de volta para Iowa e Illinois, por exemplo, um rival provavelmente conquistaria a participação no mercado internacional.

Apesar de ter alertado sobre os perigos de um défice em espiral, como senador de Delaware. Biden planeou aumentar o défice federal – que já está em 3,3 trilhões de dólares ou 16 por cento do PIB, com um enorme plano de gastos de 5,4 trilhões de dólares para a próxima década. As fortes promessas de Biden para enfrentar as mudanças climáticas, impulsionar o acesso ao sistema de saúde, combater a falta de moradias populares e enfrentar a desigualdade racial foram elogiadas pelos progressistas dos EUA.

De acordo com o site de campanha de Joe Biden, um grande investimento para reconstruir a infra-estrutura dos EUA o ajudará a cumprir a meta de pleno emprego, enquanto a educação será responsável pela maior parte dos novos gastos públicos. Grandes aumentos de impostos, principalmente sobre os ricos, reverterão parte dos cortes de impostos de 1,5 trilhão de dólares de Trump e compensarão quase dois terços de seus compromissos de gastos.

Segundo analistas, o restante beneficiará da actual política monetária do Fed, o banco central americano.
A América corporativa pode pressionar Biden a desfazer muitas das políticas comerciais agressivas de Trump que, além de combater a ameaça económica da China, enfraqueceram os laços com os aliados mais fortes dos Estados Unidos, incluindo o México e a União Europeia.

Donald Trump viu a sua corrida à reeleição impulsionada pela rápida recuperação dos mercados financeiros depois do confinamento face à pandemia ter sido amenizado, mas agora há sinais de nova turbulência. "O nervosismo dos mercados financeiros pode ser um factor", ressalta Lotterman, cuja coluna Real World Economics é publicada em vários jornais americanos.
Mercados ficam expectantes com novas injecções de moeda para travar crises

Qualquer resultado que se obtenha nas eleições americanas de hoje, 3 de Novembro, terá sempre muitas leituras de politólogos e partidários a nível mundial e pelos agentes económicos, para os quais as «bazucas» de triliões de dólares norte-americanos comecem a ser «disparadas» para a economia real e principalmente para outra pré-catástrofe emergente, no horizonte da humanidade: a crise ambiental.

De acordo com o economista Daniel Sapateiro, as eleições nos Estados Unidos da América têm sido marcadas por factores fora do «raio» político, essencialmente por questões raciais e pandémicas. Ainda assim, são um «farol» para o mundo semi-confinado e onde a pobreza é alarmante. Os Estados Federados do Sul, socialmente mais pobres, revelam também marginalização social, capaz de fazer com que os resultados eleitorais possam ser aproximados e, de acordo com o candidato e actual Presidente Donald Trump, haver reivindicação de recontagem de resultados para o Colégio Eleitoral.
"O ano de 2019 já não tinha acabado bem, com as principais economias mundiais em desaceleração e com ameaças de recessão para 2020. Os sintomas de fim de ciclo apareceram com um aumento global da dívida pública, diminuição de investimento nacional e estrangeiro, e alguma sobrecapacidade produtiva", disse.

Esta é ao menos a visão do economista Daniel Sapateiro, para quem o actual crescimento demográfico é superior ao aumento previsto do PIB mundial, o que faz empobrecer cada cidadão do mundo por via do PIB «per capita».
Para o também consultor e docente, o mais importante indicador, no caso o volume de comércio mundial, normalmente nos 5/6 por cento de aumento anual, o dobro do crescimento do PIB mundial, caiu 0,5 por cento, a terceira queda desde 1980. As outras foram em 1981 e 2009.

"Esta má condição a somar ao confinamento, criará provavelmente a pior quebra no produto mundial, desde 1945. A recuperação virá, talvez já no 4º trimestre ou final do 3º, mas lenta, bastante lenta mesmo, talvez a necessitar de seis ou sete anos para recuperar o nível de output de 2019", explica.

Diante deste quadro, Daniel Sapateiro conclui que os bancos centrais dos diferentes Estados têm feito o mesmo papel desde a quebra das empresas tecnológicas, designadas de "dot.com" no ano de 2000 e a cada crise bolsista ou económica, vão baixar juros para níveis já sem folga para combater uma crise séria como esta.

Segundo prevê, os governos irão aumentar os défices, alguns designados por défice gémeos: orçamental e da balança de pagamentos, pelos estabilizadores automáticos, mais subsídios de desemprego e menores receitas de impostos, e pelos auxílios de tesouraria às empresas e outras formas de fazer chegar dinheiro às famílias.

"Ora nós sabemos que a dívida é a redução de despesa no futuro a não ser que se gira um fluxo de rendimento tal que pague o capital e os juros. Esta dívida não é de investimento, é uma dívida social, essencial para alimentar pessoas e "tapar buracos" nas empresas, não gera fluxos para a sua liquidação", disse.


Transição energética

A Europa já anunciou que vai entrar na questão da transição energética por via da Agenda até 2050. Os Estados Unidos entrarão também, caso Joe Biden ganhe a eleição. Trump, por sua vez, não está interessado em investir na transição energética.

Para Daniel Sapateiro, se o mundo se unir para tentar salvar o clima, os chineses estarão no barco; se Trump ganhar, os chineses ainda queimarão muito carvão.
Nesse quadro eleitoral americano, para Angola continua em expectativa o impacto negativo da actual pandemia que interfere na destruição de empregos, embora sejam notórias as ajudas à recuperação de empresas e a mitigação junto das dificuldades das famílias por parte do Governo. Todavia, é notório, o cenário recessivo e de empobrecimento do país pela Covid 19.

Segundo o professor de finanças públicas, o ano que aí vem e  se aproxima a «passos largos» será muito desafiante e será acima de tudo uma aprendizagem cumulativa ao ano "horribilis”, que temos vivido, mas que aprendamos novos caminhos de sustentabilidade, de criação de auto-emprego e dar-se aos jovens a possibilidade de empreenderem e criarem empresas formais, reduzindo o peso da economia informal e da corrupção, males que grassam a sociedade angolana.


A favor de Biden

Na visão do economista Rui Malaquias, o mundo nunca esteve tão expectante e atento às eleições nos Estados Unidos da América, pois é quase vontade mundial que Donald Trump não vença as eleições, como é claramente demonstrável, o actual Presidente americano tem exercido uma influência negativa no campo económico, partindo do princípio que os Estados Unidos são um país fortemente comprador de muitas matérias-primas e a sua retracção prejudica os fornecedores.
Para Malaquias, espera-se que Joe Biden vença para pôr fim a uma sequência de medidas extremadas e nocivas ao comércio internacional, pois Donald Trump, dentre outras coisas erradas, levou a cabo políticas excessivamente proteccionistas, instituiu a obrigatoriedade de desmaterialização de investimentos privados de outras economias para a economia americana e atacou politicamente parceiros comerciais tradicionais.

Por outro lado, considera, há uma gritante instabilidade governativa que influencia negativamente os mercados internacionais, a forma displicente como trata o dilema ambiental, bem como a forma desastrosa como está a gerir a pandemia no seu país, que é só a maior economia do mundo, faz com que perspective uma recuperação mais lenta nos mercados internacionais.

"A guerra comercial entre os USA e a China também não é boa para o comércio internacional, pois os dois países, por serem as maiores potências comerciais do mundo, polarizam os mercados, sendo que cada um deles exige dos seus aliados colaboração imediata, fazendo com que países mais fracos e pequenos economicamente se sintam obrigados a escolher produtos e serviços por conveniência e não por racionalidade", conclui.