Reportagem

Empresa de Águas promete 15 mil novas ligações na cidade do Uíge a partir de Janeiro

Valter Gomes| Uíge

A presidente do Conselho de Administração (PCA) da Empresa de Águas e Saneamento do Uíge (EASU – E.P), Emília Fernandes, disse que a solução para o problema da falta de água em alguns bairros da periferia da cidade do Uíge está para breve.

16/09/2023  Última atualização 12H44
Emília Fernandes, garante trabalhos © Fotografia por: Mavitidi Mulaza | Edições Novembro
A gestora pediu tranquilidade aos moradores, sublinhando que a partir de Janeiro do próximo ano vão ser feitas 15 mil novas ligações domiciliárias num perímetro de 100 quilómetros quadrados, cujos trabalhos de levantamento e sinalização dos pontos já tiveram início.

A falta de água potável para o consumo da população nos bairros periféricos da cidade do Uíge continua a ser uma preocupação dos munícipes, porque o sistema de captação, bombagem, tratamento e distribuição do "precioso líquido” ainda não cobre toda extensão da urbe, abastecendo apenas a zona urbana da cidade e alguns bairros.

 A maior parte da população na periferia usa água das cacimbas, furos artesianos, tanques subterrâneos e de pequenos poços feitos pelos moradores.

Emília Fernandes diz que os bairros Bem-Vindo, Quijima, Damba, Gigí, Quindenuco, Tange, GAI, Ana Candande, Orlando Fonseca, Sonangol e outros já estão catalogados para a expansão da rede de distribuição de água potável. Nesta fase, acrescentou, vão ser também concluídas as ligações não feitas nos bairros já abrangidos pelo programa "Água para todos”, desde que estes não estejam em zona de risco.

A responsável alertou que, para os terrenos baldios, residências em construção, casas abandonadas, bem como aquelas residências arrendadas e cujos proprietários não honram os compromissos com a empresa, estes não vão ter acesso à água pelo facto de dificultarem o normal funcionamento da rede e o alcance dos objectivos da empresa.

"Estamos a trabalhar com a administração municipal, no sentido de nos fornecer o número de habitantes por cada bairro, de modo a determinar-se o número de ligações domiciliárias necessárias por cada localidade”, disse a PCA, acrescentando que os trabalhos de expansão da rede domiciliária estão a cargo da empresa Chinesa CTC, que também vai fazer a construção do novo sistema de abastecimento de água a partir do rio Loge.

Novo sistema de captação e tratamento

A PCA da EASU – E.P avançou que o novo sistema de captação, tratamento e distribuição, financiado pelo Banco Mundial, vai ter uma capacidade de bombear até16 mil metros cúbicos de água por hora, um reservatório e dois tanques com capacidade para cinco e quatro mil metros cúbicos. O mesmo vai reforçar o actual, que capta e bombeia, do rio Loé, 630 mil metros cúbicos/hora.

"Enquanto se espera o reforço do novo sistema de abastecimento de água, a rede de distribuição da Centralidade horizonte do Quilumosso oferece boa capacidade e só se utiliza 15 por cento da mesma. Por isso, será feita uma conduta que vai ligar à rede antiga de distribuição de água na sede da cidade do Uíge, para aumentar a quantidade de água a distribuir”, disse.

A PCA lembrou que, até 2012, a cidade do Uíge tinha apenas três mil ligações domiciliárias. Actualmente, frisou, conta com mais de 28 mil extensões e os trabalhos prosseguem para abranger mais localidades e atender a demanda da população.

População clama por uma solução urgente

Nos bairros Quindenuco, Gigí, Quixicongo Novo, Sonangol, GAI, Ana Candande, Quijima, Damba, Tange, Quituma e 6ª CIA, todos da periferia da cidade do Uíge, a equipa de reportagem do Jornal de Angola constatou a inexistência de água da rede pública. A população continua a enfrentar enormes dificuldades e clama por uma solução urgente.

 "A situação é preocupante. Diariamente, em muitas famílias, são registados casos de diarreia, febre tifóide, schistosoma e outras doenças abdominais, provocadas pelo consumo de água imprópria”, disse João Diogo, morador do bairro Gigí. Acrescentou que o aumento do êxodo populacional do centro da cidade para a periferia agudizou a situação, porque grande parte das cacimbas estão a secar e os poucos furos artesianos construídos pelo governo estão obsoletos e já não suportam a demanda da população.

Clientes devem mais de 400 milhões de kwanzas

A presidente do Conselho da Administração da Empresa de Águas e Saneamento do Uíge lamentou o facto de muitos consumidores não pagarem as suas facturas de consumo. Apenas na cidade do Uíge, disse, os clientes devem mais de 400 milhões de kwanzas, sendo que 84 por cento deste valor é referente aos consumidores domésticos.

Emília Fernandes referiu que a situação tem criado uma rotura nos cofres da empresa e a comprometer vários serviços como a aquisição de novas bombas, pagamento de salários, facturas e outros serviços. A gestora avançou que, dentro de dias, a empresa vai efectuar cortes e tomar novas medidas aos devedores.

"A água encontra-se na natureza, mas para chegar até as residências e ser consumida em segurança o governo faz vários investimentos. Por isso, os consumidores têm a obrigação de pagar as suas facturas para assegurar a manutenção do sistema”, sublinhou. 

Emília Fernandes informou que foram criadas lojas de pagamento com acesso fácil em pontos e bairros estratégicos da cidade do Uíge, como na Centralidade do Quilomosso, nos bairros Mbemba Ngango, Dunga, Paco e Benze, Quilala (CLESE), Candombe-Velho, Papelão, Bem-vindo e outros e existe ainda a disponibilidade para o pagamento por referência nos ATM.

Vandalização de contadores

Outra preocupação é a vandalização dos equipamentos, sobretudo contadores, tubos e outros que permitem a leitura do consumo de água, nos bairros que já beneficiam de água.

A PCA condena o comportamento dos munícipes que vandalizam os equipamentos, considerando que os danos causados diariamente originam retrocesso na expansão do sistema de água para os outros bairros, bem como para a manutenção dos mesmos.

A responsável alertou que o garimpo de água e a vandalização dos equipamentos constituem crimes puníveis por lei. Para tal, está a ser feito um levantamento exaustivo de todos os equipamentos vandalizados para se determinar os prejuízos já causados e aqueles que forem indiciados como autores destes actos vão ser responsabilizados criminalmente.

"Temos nos deparado também com atitudes menos abonatórias. Há moradores que agridem fisicamente os técnicos da empresa em serviço de cobrança, rasgam os vestes e tiram os telemóveis sincronizados com o sistema de facturação em posse dos mesmos. Esta situação não ajuda na boa coabitação da instituição com os consumidores”, lamentou.

Bairro Sonangol

No bairro Sonangol não existe nenhum furo artesiano. A água consumida pela população é extraída de uma fonte denominada "murro”, com uma elevação acentuada de mais de 300 metros de altura e muitos moradores não conseguem efectuar duas viagens carregando bidões, baldes e banheiras às mãos ou à cabeça.

Nesta localidade, o ponto onde é acarretada a água, o tubo de polietileno que abastece o tanque partiu-se e originou uma lagoa de água suja onde, na época chuvosa, tudo fica misturado com impurezas, obrigando a população a consumir a mesma água, por falta de alternativa. 

Teresa dos Santos, outra moradora do bairro Sonangol, que o Jornal de Angola encontrou a acarretar água no referido poço, lamenta a situação que outros moradores vivem. Lembrou que o tubo transportava água até a um ponto onde se podia obter o líquido em melhores condições. Mas, devido à fragilidade, há três anos que o mesmo quebrou e nunca foi reparado. Por falta de alternativa, disse, os moradores continuam a consumir aquela água imprópria.

"Queremos fazer ouvir o nosso grito de socorro. Como podem constatar, aqui estamos mal. A fonte está localizada numa enorme profundidade que não permite buscar água duas vezes, e a mesma é suja. Vivemos dias difíceis e por essa razão as doenças diarreicas agudas não nos deixam. Muitas das vezes somos obrigados a comprar água nos mototaxistas em outros pontos da cidade”, desabafou.

Ponte sobre o rio Gigí

Além da falta de água, as populações dos bairros Gigí, Quindenuco e Quixicongo Novo clamam também pela melhoria da ponte sobre o rio Gigí, que faz a ligação entre as três localidades. O soba adjunto do Quindenuco, Ernesto Manuel, disse que recentemente foi colocada uma estrutura de betão para servir de passagem hidráulica e facilitar a circulação de viaturas na região, mas devido ao seu pequeno tamanho, as águas do rio procuram outro curso, dando abertura a uma vala maior e voltando a impedir os carros e motorizadas de circularem no local.

"Aqui no Quindenuco não temos mercado. A população compra os bens alimentares no outro lado do Quixicongo Novo. A ponte está degradada e os carros e motorizadas não passam e quando cai a chuva a baixa toda fica inundada que, até mesmo a pé, os moradores não conseguem atravessar”, disse.

O soba realçou que a ponte sobre o rio Gigí representa uma necessidade fundamental daquela comunidade, por ser o elo para os bairros com milhares de habitantes. Daí a urgência da sua melhoria, pois faz parte da vida socioeconómica da população, bem como na melhoria da circulação de pessoas e viaturas.

Oportunidade de negócio

À medida que vão aguardando pela expansão da rede de distribuição de água para os seus bairros, alguns moradores tiveram de celebrar contratos com proprietários de motorizadas de três rodas, vulgo Nambuangongos ou kupapatas, que diariamente recolhem recipientes em suas residências para lhes abastecerem com o produto que acarretam em vários pontos da cidade.

Miguel Feliciano Eduardo, um dos mototaxistas que se dedica a esta actividade há vários anos, nos bairros Sonangol, GAI e Ana Candande, disse que o negócio surgiu diante da necessidade dos moradores, porque nestas localidades não existem fontenários ou cacimbas, sendo obrigados a percorrer longas distâncias com bidões de água.

"Todo esse processo que se conclui com a celebração verbal do contrato, passa por um acerto com os clientes. Cobro 50 kwanzas pelo bidão de 20 litros. É uma actividade cansativa, pois muitos moradores querem água, o que me faz começar com o atendimento a partir das 5 horas da manhã e termina apenas ao entardecer”, disse.

Pai de três filhos, Miguel Feliciano Eduardo disse que a actividade é rentável e lhe garante o sustento da família. "Com a mesma construí a minha casa e cobri as despesas com a formação académica e do resto da família”.

Bairro Gigí

O presidente da Comissão de Moradores na zona sete do Kibanda, no bairro Gigí, Razão José Luboko, disse que a população utiliza a água do rio Gigí para o uso doméstico, sobretudo na época seca.

O morador alertou que a saúde humana depende da influência do crescente número de substâncias tóxicas existentes na água, no ar, nos solos e nos alimentos e a falta de água potável agudiza ainda mais a situação sanitária da população.

"A falta de água potável nas residências e o saneamento básico constitui um problema grave na vida dos moradores. Por isso, pedimos a intervenção do Governo para uma solução em breve”, apelou, acrescentando que, em algumas cacimbas, por causa do excesso de pessoas a procura de  água, tem havido conflitos entre moradores, uma situação que deixa preocupadas as autoridades tradicionais.

Bairro Quindenuco

No bairro Quindenuco, a situação não é diferente. O soba adjunto, Ernesto Manuel Pinto, em nome da população, lembrou que há muito tempo que aquela comunidade recebeu a promessa de instalação da rede pública de distribuição de água potável, que nunca foi concretizada. Referiu que na circunscrição vivem mais de sete mil habitantes e todos dependem de um único poço de água  denominado "Kakididi” (barreira), pois apenas o primeiro a chegar leva água limpa e os demais ficam com o líquido já turvo, situação que obriga as mulheres a madrugarem ou procurar outras alternativas.

"A água é vida e saúde. Uma população sem água tratada não está saudável. Estamos preocupados porque, diariamente, os nossos filhos ficam doentes e tememos pelo pior com a chegada da época chuvosa em que somos muitas vezes obrigados a acorrer aos hospitais durante a noite”, disse.

Ernesto Manuel Pinto sublinhou que todas as manhãs os moradores são forçados a percorrer longas distâncias para procurar água com alguma qualidade, visto que as cacimbas existentes no bairro já não oferecem condições, por estarem no meio de residências, próximo de casas de banho e  junto de depósitos de lixo arrastado pelas chuvas.   

"Os moradores dos bairros Quindenuco, Gigí e parte do Quixicongo Novo, todos circunvizinhos, com uma população estimada em mais de 20 mil habitantes, recorrem ao único fontenário, o Kakididi, onde homens e mulheres, com bidões e baldes às mãos e a cabeça, madrugam para conseguir um pouco de água para o consumo”, lamentou.

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