Reportagem

Linda viagem a bordo do comboio de Luanda

Quem viaja de comboio, pela primeira vez,em Luanda,surpreende-se com uma viagem linda e fascinante.

18/10/2023  Última atualização 09H26
© Fotografia por: DR

O relógio marcava 9h15 minutos, horário em que, geralmente, os profissionais do Caminho-de-Ferro de Luanda(CFL) têm tudo a postos para o comboio partir da paragem do Bungo até Viana. Uma rotina diária.

O DMU4 é um dos novos comboios que a empresa comprou, num lote de sete, composto por quatro vagões, duas cabines e ar condicionado por todo o compartimento.

No interior, a decoração é composta por bancos de alumínio nos quais os passageiros se sentam uns de frente para os outros, para usufruírem de uma viagem tranquila.

A equipa de reportagem do Jornal  Metropolitano da Capital Angolana, observou no comboio pessoas de várias faixas etárias ocupando os assentos. Enquanto uns conversavam, outros mexiam nos telefones. Havia um terceiro grupo  de pessoas com o semblante sério, a apreciar a bela viagem rumo à Vila de Viana.

Antes de partir, o comboio tem, obrigatoriamente, que soar a buzina, para alertar os passageiros que vai partir. A equipa de reportagem do Jornal  Metropolitano de Luanda  acompanhou de perto o trabalho árduo dos Maquinistas dos Caminhos-de-Ferro(CFL).    

Ao longo da viagem,  vimos jovens a tomar banho nas valas de drenagem do Bungo, que estavam cheias e cuja água escorria pela via.

Ao redor, vê-se muito lixo e capim a estragar a paisagem de quem apreciava o trajecto. Um cenário que em nada contribui para o crescimento do turismo nacional.

Osvaldo Paulo, que sonhava ser engenheiro ou cientista, hoje é chefe de secção dos operativos e maquinista dos CFL. Contou-nos a sua história e como conseguiu ingressar no órgão.

A 16 de Julho de 2012, após o término do Ensino Médio, viu a grande oportunidade de participar no concurso público que estava a decorrer no Ministério dos Transportes e Urbanismo como uma  fuga. Não queria ficar em casa sem fazer nada. Explicou que ser maquinista é um grande desafio, na medida em que "todos os dias aprendemos coisas novas e vimos coisas que não queremos ver nem acreditar”.

O que mais lhe chamou a atenção e deixou admirado foi ver uma mulher maquinista, colega sua, manejar o comboio. Ela fazia a rota Luanda/ Malanje.

"Contemplei a coragem e a ousadia da colega e disse a mim mesmo:‘se ela é capaz eu também sou’. Aquilo me motivou e hoje estou aqui. Consegui! Sou maquinista. Vi aquilo como um grande desafio e cheguei ao nível dela”, disse, orgulhoso.

Trata-se do seu primeiro emprego. Com o tempo, aprendeu a gostar do que faz. A profissão de maquinista, disse, inspira e motiva muita gente a trabalhar nos caminhos-de-ferro."É uma profissão que tenho como espelho no país. Às vezes, sou escalado para manejar o comboio, mas não deixo de fazer meu trabalho do outro lado”. Conta ter encontrado, inicialmente, dificuldades no labor, superadas uma a uma com o passar do tempo.

"Não é fácil chegar até aqui. Para entrar no perfil de linha, temos de passar por um processo de formação e análise com pessoas mais experientes.

"São várias etapas pelas  quais temos de passar, para entrar nos CFL. Fazem-nos testes psicotécnicos e exames, para estarmos aptos. Se alguém tiver alguma doença que possa prejudicar o desempenho no trabalho, a empresa afasta logo”, disse.

Funcionário dos CFL há 11 anos, há um ano trabalha como maquinista e faz viagens de curto a longo percurso.

"Nunca foi o meu sonho trabalhar  nos CFL. Fiz no ensino médio o curso de Ciências Exactas e Biológicas, entrei no Instituto Superior Técnico de Angola (ISTA) e estava a cursar Contabilidade Administrava. Mas,  por questões financeiras, não consegui dar seguimento aos estudos até hoje. Tranquei o ano académico, estava a frequentar o segundo ano da universidade”. Não desistiu. Promete terminar a formação superior logo que puder." Nunca é tarde para estudar”, disse.

O chefe de Secção dos Operativos disse que o salário que aufere é insuficiente para custear as despesas de casa e os estudos.

Vive maritalmente e tem três filhos.  "Mas, dá para gerir a família, apesar das dificuldades”, contou.

Nos Caminhos-de- Ferro de Luanda trabalham por regime de escala em três turnos: manhã, tarde e noite. O comboio começa a circular às 4h30 minutos, para o trajecto de longo curso. Para médio percurso, o comboio começa a sair a partir das cinco horas.

A viagem da estação do Bungo até à Vila de Viana faz cerca de 49 minutos e para Malanje faz 11 horas.

O comboio transporta vários tipos de mercadorias, entre alimentos e mercadorias perigosas como gás inflamável e combustíveis.

Osvaldo Paulo explicou que o percurso de Luanda a Malanje é um trajecto muito difícil, pois há muita debilidade nas linhas férreas, que estão danificadas, porque alguns  troços ainda não foram reabilitados.

O troço do  Zenza a Cacuzi é onde se encontram  maiores dificuldades, por ser uma das  linhas mais antigas. "O trajecto é delicado, tem muitos obstáculos. Mas, com algum sacrifício, consegue-se chegar ao destino”, disse.

Durante o tempo em que conduziu o comboio, ao longo da viagem, teve de buzinar várias vezes para afastar da linha férrea pessoas distraídas, a fazerem a travessia, assim como para senhoras que vendiam ao redor da linha.   

Guarda na memória uma viagem de médio curso que fez de Luinha, um comboio misto, de mercadoria e passageiros, junto à entrada da estação do quilómetro  30.

Ele e a sua equipa  colheram um indivíduo adormecido na linha férrea, à 1h00 da manhã. "Não tinha como a gente frenar, porque aquilo aconteceu numa curva. Buzinamos, ele não despertou, porque estava sob o efeito de álcool. Viu que o único lugar para dormir era em cima dos carris, aquilo cortou-lhe a cabeça e o braço. Foi morte imediata. Fiquei  traumatizado,  foi uma experiência horrível”, contou. 

A equipa, prontamente ligou à Polícia que estava a trabalhar nos arredores, no quilómetro  30. "Foram lá ver o corpo, que dividiu-se. Estava espalhado ao longo dos carris e arredores”.

Quando isso acontece, fez saber, o comboio fica horas parado, até o corpo ser removido da linha.

Criticou pessoas negligentes, que andam com auriculares nos ouvidos, com  músicas  altas ao ponto de não ouvirem a buzina do comboio.

Manuel Vivaldo,  um jovem de 35 anos, passageiro assíduo, vive no município do Kilamba Kiaxi e contou que apanha sempre o comboio para chegar ao trabalho. "É de louvar essa iniciativa do Governo, que nesse aspecto do transporte, está a olhar pelo povo”.

Considerou os novos comboios melhores que os antigos, na medida em que têm televisão para distrair os passageiros, mais conforto e mais espaço.

Contudo, em algumas horas, fica abarrotado, principalmente à tarde, no fim do expediente.

O bilhete custa 200 kwanzas

Joaquim Bandoni, residente na Vila de Viana, contou que é mais económico apanhar o comboio para a Universidade Agostinho Neto, que frequenta actualmente, tanto para ir como para regressar. Entretanto, esclareceu, o regresso é difícil por causa da enchente. Uns viajam sentados, mas a maioria vai de pé. 

"Gosto do conforto daqui. Tem ar-condicionado, o que é difícil, na realidade que nós vivemos. É um comboio mais espaçoso e mais confortável.  Quando eu comecei a usar esse transporte tinha várias pessoas que pregavam a palavra de Deus. Tinha também uma senhora que comercializava alguns produtos”, lembrou.


Benefícios económicos e a tranquilidade nas viagens

O Jornal Metropolitano de Luanda deslocou-se  à Estação Central do CFL, localizada na histórica zona do Bungo, em plena baixa luandense, onde conversámos com alguns passageiros.   

O cenário é de calma e descontracção. Contrariamente às demais salas de embarque, onde os passageiros são avisados por meio de altifalantes, o ambiente aqui é diferente: a buzina do comboio é o indicativo de partida e chegada. Sentada na sala de embarque, Paula Teixeira, funcionária pública, aguardava pelo comboio das 11h00.    

 "Esta não é a minha hora habitual de sair do serviço, mas como tenho uma consulta de oftalmologia marcada para as 14h00, em Viana, fui dispensada cedo”, explicou Paula Teixeira, dando ênfase, que neste período do dia, a locomotiva regista o menor afluxo de passageiros.

 Residente no bairro do Grafanil Bar, diz que diariamente acorda às 5h00, para chegar na paragem do comboio que é sempre pontual. Paula Teixeira disse à reportagem do Jornal Metropolitano de Luanda que nos dias úteis da semana embarca no comboio das 6h00, em direcção ao Bungo. Quando os ponteiros registam 7h30, está no posto de trabalho.

 A funcionária do Ministério do Comércio, cujo edifício está localizado nas imediações do Porto de Luanda, descreve que as viagens matinais e no final da tarde realizam-se num ambiente tranquilo, sem empurrões e num clima agradável. Paula Teixeira refere que, desde que optou pelo comboio, o seu orçamento mensal melhorou.

 Comparativamente a épocas anteriores, a deslocação para o local de trabalho, resumia-se em quatro táxis, isto é, ida (Grafanil Bar - Mutamba) e volta (Mutamba-Grafanil Bar), cujos valores rondavam os mil e 200 kwanzas, por dia. Contas feitas, Paula Teixeira gastava em 22 dias úteis, só num mês, o valor de 24 mil kwanzas.

 Depois de uma conversa aturada com a vizinha de porta, sobre os custos e os transtornos nos táxis, decidiu optar pelo comboio. O buraco financeiro e os transtornos com os sobe e desce, desapareceram. A tabela de preços dos bilhetes do comboio, Luanda-Viana-Luanda, custam apenas 200 kwanzas, por cada viagem.

 Ou seja, a funcionária pública, adstrita ao Ministério do Comércio, passou a gastar apenas 400 Kwanzas dia. "Neste momento, não sei o que é apanhar táxi, para chegar à Baixa da cidade de Luanda. Utilizo apenas o comboio, até porque há melhorias nos serviços, por conta dos investimentos feitos com a sua modernização”, disse.

 Wesley Karicoco vive no bairro da Estalagem (Viana). Estudante da 9ª cl asse, chegou a integrar os escalões de iniciados do Clube Ferroviário de Angola, cujas instalações estão localizadas a escassos metros da Estação do Bungo.

Devido aos estudos, viu-se obrigado a abandonar o desporto. Para aliar os estudos à prática desportiva, são ministradas, na sede do Clube Ferroviário de Angola, aulas de reforço, direccionada aos jovens atletas. Wesley Karicoco sai semanalmente de comboio, da Estalagem para o Ferroviário, para aprimorar os seus conhecimentos e matar saudades.

As aulas de reforço são das disciplinas de Matemática e Língua Portuguesa. "Agora tenho um bom desempenho escolar e boas notas, graças a estas explicações ministradas no clube. Graças ao comboio, consigo chegar todos os dias a tempo e hora”, referiu o jovem estudante.

Realçou que com a difícil situação económica, seria um problema para os seus pais suportar as despesas com o transporte.

João Pedro


Novas estações inauguradas em Dezembro

O processo de reabilitação e modernização do Caminho-de-Ferro de Luanda já é um facto. Quem circula pelas imediações das principais estações ferroviárias, apercebe-se de que há obras de grande dimensão. Estações modernas darão novo fôlego aos usuários dos comboios em Luanda.

A reportagem do Jornal Metropolitano de Luanda percorreu as estações do Bungo, Muceques, Viana, Baia e o Terminal Ferroviário do Novo Aeroporto Internacional de Luanda, onde constatou que a construção das mesmas decorre em ritmo acelerado sob responsabilidade da empresa Hyway e Tianjin Oubaiwei e fiscalizada pela Transfic.

Fonte contactada pelo JML soube ainda que as mesmas vão estar disponíveis aos passageiros, e não só, nos próximos dias, com as suas inaugurações. "Prevê-se que a cerimónia inaugural destas estações decorra, juntamente com o corte de fita do Aeroporto Internacional Dr. António Agostinho Neto", revelou a nossa fonte.

Retorno das obras
Paralisadas há 18 meses, por motivos não mencionados, as obras das estações ferroviárias do Bungo, Musseques, Viana, Baia e do Novo Aeroporto Internacional de Luanda decorrem sem grandes sobressaltos. Para trás, ficaram factores como financiamento e aspectos técnicos.

A construção da estrutura em alvenaria, das novas estações ferroviárias, como constatou a reportagem do Jornal Metropolitano de Luanda, apresenta já um figurino avançado, que permite ter uma noção clara da grandeza e beleza arquitectónica. Está para breve a instalação de Infra-estruturas de Comunicação e de Sinalização.

Fonte do CFL disse ao JML que as novas estações ferroviárias terão capacidade de albergar mais de 7 mil passageiros por dia. A estação principal do Bungo, que vem desde o tempo colonial e já sofreu várias obras de reabilitação, vai ter uma capacidade superior em relação às demais.  A nova estação do Bungo terá uma capacidade estimada em 2.200 passageiros por dia. A partir da estação Baia, imediações do Mercado do 30, está em construção o ramal ferroviário que ligará ao novo Aeroporto Internacional de Luanda, baptizado com o nome do primeiro Presidente de Angola, Dr. António Agostinho Neto.

Em construção, encontram-se várias plataformas e linhas no interior das referidas estações, que irão facilitar o tráfego, manobras, depósito das mercadorias e os meios operacionais do CFL. O programa de expansão e modernização do CFL, contempla, igualmente a construção da segunda linha, que ligará a estação do Bungo até à Baia.

Desmobilizado à maquinista
Várias são histórias de vida, que marcam o dia-a-dia, dos trabalhadores do Caminho-de- Ferro de Luanda. João Pascoal é uma figura que viu renascer a vida, depois de um longo período à procura de emprego. Tio João, como é carinhosamente chamado pelos colegas e passageiros, integrou o CFL na década de 90. 

Aos 60 anos, João Pascoal revelou ao Jornal Metropolitano de Luanda que depois da sua desmobilização como militar das ForçasArmadas Popular de Libertação de Angola (FAPLA), na ânsia de conseguir uma profissão e trabalhar condignamente para sustentar a família, dirigiu-se a um centro de trabalho.

Por conta do seu grau académico, foi encaminhado para o CFL, onde frequentou o curso básico de maquinista. Depois de concluído o curso, foi admitido como ajudante de maquinista. Posteriormente, dada a sua dedicação, realçou, foi promovido a maquinista de primeira classe, categoria que ostenta até hoje.

João Pascoal exerce actividade de maquinista há 34 anos. Gaba-se que já percorreu milhares de quilómetros como comandante de uma locomotiva e que sempre sentiu ter sob os seus auspícios, a responsabilidade de proteger a vida das centenas de pessoas, já que um deslize ou falta de cuidado pode ser fatal.

Com uma folha de serviço invejável, João Pascoal tem sido o timoneiro das locomotivas que transportam combustíveis e mercadorias, no percurso Cuanza-Norte e Malanje. Ao longo de décadas como maquinista do CFL, o sexagenário afirma que os troços ferroviários do Zenza do Itombe e de Cacuso, em Malanje, são os mais difíceis.

 A justificação é curta e rápida: não beneficiaram de obras de reabilitação e modernização. "É um troço muito complicado. Na zona da Kizenga, município de Cacuso, está o epicentro dos tristes descarrilamentos dos comboios, isto é, por falta de assistência técnica”, lembrou.

Fula Martins

Número elevado de peões na linha férrea preocupa maquinistas

No período matinal, agitação por parte dos passageiros é notável. A nossa equipa de reportagem foi às instalações da linha férrea do Bungo para saber mais sobre o trabalho feito pelos maquinistas.

O trabalho é feito em rotas de médio e longo cursos, assim como suburbanas, com muita cautela e responsabilidade por parte dos maquinistas. Mas os obstáculos encontrados ao longo da viagem são vários. Muitos indivíduos chegam a ser colhidos por circularem nas linhas férreas.

David José Fausto, 43 anos,  disse ter saído de uma empresa onde trabalhou como técnico de eletricidade e infraestruturas. Há dois anos ingressou no Caminho-de-Ferro de Luanda (CFL), tendo, para o efeito, participado numa formação para maquinista, durante nove meses.Posteriormente, passou para os quadros da empresa como técnico de terceira.

"Nós temos uma escala que é feita todas as sextas feiras. Cada maquinista tem o seu trabalho a fazer. Neste momento, estou a manejar o comboio de 19.000 mil quilómetros, que termina com 19.817. Vamos fazer cinco viagens no sentido ascendente e seis no descendente" explicou.

O maquinista disse que para todas as rotas, os comboios são os regulares. Os extras têm dias e horas determinadas, como é o caso do comboio que vai para Cuanza-Norte, Luinha e para Malanje, às segundas e terças feiras.

O comboio para o Luinha, no Dondo, fez saber, parte às 6h20 da Estação do Musseque, no Tunga Ngo,com previsão de chegada às 11 ou 12horas, dependendo do percurso e da   mercadoria a bordo.

Já o que faz o percurso Luanda-Malanje, parte da Estação do Musseque às 3h00 da manhã, com previsões de chegada às 16h00.

Os comboios extras, que são os de combustíveis e gás, também chamados de mistos, não têm um dia determinado para sair e podem carregar outras mercadorias.

David Fausto manifesta satisfação por fazer parte do CFL e de toda a equipa que, como ele, realiza um trabalho árduo, permitindo-lhes todos os dias apreender coisas novas com um grupo de profissionais cheio de experiências e criatividade.

"Em menos de dois anos, aprendi bastante com este colectivo. Tudo o que sei foram eles que me ensinaram. O chefe Kiala, além de ajudar-me com as máquinas, também me ensina algumas técnicas que devo ter ao longo de uma viagem", reconheceu.

Com a chegada dos novos comboios, os maquinistas do CFL têm uma rotação diária de dez vezes, com  quatro carruagens cuja lotação máxima é de 696 passageiros, partindo da paragem do Bungo até à vila de Viana. A jornada começa nas primeiras horas do dia. O grupo de trabalhadores tem uma escala de trabalho feita por turnos.

David Fausto contou que a melhor experiência que teve, enquanto maquinista, decorreu numa viagem em que transportou gasóleo de Luanda a Malanje. Disse ter sido uma viagem de muita produtividade, motivo pelo qual passou a considerar-se um maquinista, desde essa experiência.

Criticou os peões, que não lhe têm facilitado o trabalho, andando livremente pela linha férrea, assim como as vendedeiras que comercializam produtos junto à linha férrea e as crianças que brincam na   linha de comboio.

"As pessoas, muitas vezes, pensam que quando alguém morre na linha do comboio a culpa é nossa. Nós despertamos sempre com a buzina. Isso acontece muito quando o peão usa auriculares e não presta atenção à aproximação do comboio. Nós temos um tempo de frenar. Se isso acontece com três metros de distância, não tem como o comboio travar e isso faz com que a pessoa seja colhida na linha”, lamentou.

Fez saber que os comboios andam com uma velocidade média,  por conta de algumas linhas que não estão em bom estado. Qualquer anomalia que a máquina apresentar, disse, é chamada a equipa técnica com a qual  trabalham. "São os homens  das estações, da segurança e da Polícia Nacional. Gosto de manejar estas máquinas, principalmente quando é uma viagem de longo curso. Mas, muitas vezes, a ansiedade toma conta de mim quando faço noite. Sinto-me pressionado a não fazer o comboio atrasar. Na maior parte das vezes, partimos às 5 horas para fazer as rotas,  como de costume. Se cometermos alguma falha ou erro durante a viagem, somos substituídos por outros colegas", referiu.


O coração dos comboios de Luanda

Localizado no município do Cazenga, na conhecida Estação dos Musseques, foi inaugurada no dia 28 de Maio de 1957, em substituição da velha oficina do Caminho-de-Ferro de Ambaca.

Desde a sua construção, as Oficinas Gerais constituem o núcleo principal de um plano geral de assistência a todo o equipamento de exploração ferroviário do Caminho-de-Ferro de Luanda (CFL), sendo considerada pelos funcionários como o "coração da empresa”.

A grua, com uma capacidade de 180 toneladas, assegurava as mais de 130 toneladas da locomotiva reparada por uma equipa de mecânicos. O crivo jornalístico levou-nos à única senhora que integrava a equipa. Chama-se Nkitumuene Ruth Kukoba, sendo entre os colegas uma referência, pela dedicação ao trabalho.

Conhecida por Ruth, a jovem faz parte de um grupo de cinco mulheres mecânicas do CFL. Em conversa com o Jornal Metropolitano de Luanda, desvendou-nos que quando criança, sonhava ser motorista ou bombeira. A mecânica foi a sua primeira experiência, por conta da ajuda de um vizinho.

Insatisfeita com os conhecimentos adquiridos enquanto estagiária de mecânica, na oficina, decidiu inscrever-se num Centro de Formação Profissional, onde durante três anos, aperfeiçoou os seus conhecimentos e que épocas mais tarde, decidiu frequentar o curso médio de mecânica.

Formada e com diploma, conseguiu o seu primeiro emprego nas Oficinas Gerais de Reparação (OGR), instituição pertencente às Forças Armadas Angolanas (FAA), onde trabalhou com material bélico e mais tarde foi transferida para a Secção dos T ransportes Ligeiros.

 Em busca de melhores condições laborais, em 2012, por intermédio de uma conhecida, teve a oportunidade de ingressar para os quadros do Caminho-de-Ferro de Luanda (CFL). Antes, foi submetida a diversos testes. Hoje, passados 11 anos, Nkitumuene Ruth Kukoba diz que não é 100 por cento fácil ser mecânica, por exigir dedicação.

"Trabalhar no meio de muitos homens é bom, porque sempre que  há um serviço duro, eles estão presentes. Os resultados são obtidos numa união de pensamentos e sou tratada com muito carinho”, sublinhou Ruth Kukoba. Orgulhosa pelo seu trabalho, realça que alegra-se quando vê que as locomotivas seguem sob carris em várias direcções.

"Sinto satisfação de dever cumprido, por salvar uma máquina que tinha problemas técnicos, e fazer parte de uma equipa de trabalho, que diariamente, faz de tudo para os passageiros poderem se locomover de Viana ao Bungo ou chegar até Malanje”, realçou a mecânica do CFL.

João Pedro


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