Reportagem

SME tem o registo de 139.812 imigrantes de diversas nacionalidades

Alberto Quiluta

Jornalista

O Serviço de Migração e Estrangeiros (SME), afecto ao Ministério do Interior, tem o registo, em todo o país, de 139.812 imigrantes de diversas nacionalidades.

18/12/2023  Última atualização 08H28
Governo angolano iniciou recentemente, em Luanda, o registo e atribuição do cartão de refugiado a cidadãos estrangeiros de várias nacionalidades © Fotografia por: João Gomes | Edições Novembro

A informação foi avançada ao Jornal de Angola pelo director-geral do SME, comissário de Migração Principal João António da Costa Dias, que falava ao Jornal de Angola a propósito do Dia Internacional dos Migrantes, que se assinala hoje.

Segundo o director-geral do SME, estima-se existir em Angola e por registar  um total de 28.090 requerentes de asilo e 14.595 cidadãos com estatuto de refugiado.

João António da Costa Dias informou que a média de pessoas repatriadas durante os anos de 2022 e 2023 foi de 23.759 e 28.549 cidadãos de diversas nacionalidades, respectivamente.

Quanto ao que se entende por migrante, o director-geral do SME disse tratar-se de um cidadão estrangeiro que entra no território nacional a coberto de visto de entrada, válido de acordo com a legislação em vigor.

A migração, enquanto fenómeno global, é definido como o deslocamento voluntário ou forçado de indivíduos, de um espaço geográfico para outro, de forma temporária ou permanente, que pode ser desencadeado por vários motivos, nomeadamente económicos, culturais, religiosos, políticos e naturais.

 
Estratégia sobre migração

Em Angola, a estratégia sobre migração tem as suas premissas no Decreto Presidencial n.º 318/18, de 31 de Dezembro, que aprova a Política Migratória Nacional, como plataforma de orientação para todos os órgãos intervenientes na gestão dos fluxos migratórios, concebida para influenciar a actuação dos vários organismos do Estado.

 "A referida plataforma contém as bases onde estão fixadas as políticas de identificação e a adopção de critérios para a concessão de estatuto migratório, de modo que a integração do cidadão migrante se constitua em mais-valia para o desenvolvimento económico, cultural e social do país”, referiu o responsável do SME.

A entrada, permanência, trânsito e saída de cidadãos estrangeiros no país é regulada pela Lei 13/19, de 23 de Maio, sobre o Regime Jurídico de Estrangeiros na República de Angola, que dispõe de uma vasta tipologia de vistos, em função da finalidade de entrada em território nacional.

Segundo o responsável do SME, apesar da especial atenção reservada à política de integração dos migrantes em território nacional, eles ainda encontram alguma dificuldade no processo de socialização, em virtude da religião e cultura.

João António da Costa Dias avançou que as nacionalidades com mais migrantes no país são a portuguesa, chinesa, guineense e congolesa (República Democrática do Congo).

 
Direitos dos migrantes

Quanto aos direitos e garantias, a Lei n.º 13/19, 23 de Maio, nos artigos 4º a 12º, prevê que o cidadão estrangeiro (migrante) em Angola tem direito à livre circulação, direito de reunião e manifestação, liberdade de educação, ensino, direito de adesão às organizações sindicais e associações profissionais.

O migrante beneficia, ainda, de todas as garantias constitucionais e legais reconhecidas aos cidadãos nacionais, nomeadamente recorrer aos órgãos judiciais dos actos que violem os seus direitos, não ser preso nem sofrer qualquer sanção, a não ser nos casos e pelas formas previstas na lei, exercer e gozar pacificamente os seus direitos patrimoniais e não sofrer quaisquer medidas arbitrárias ou discriminatórias e não ser expulso ou extraditado senão nos casos e pelas formas previstas na lei.

A situação dos refugiados em Angola decorre da observância de obrigações internacionais assumidas, com a adesão às convenções internacionais relativas ao refugiado e da inibição da utilização abusiva do processo de asilo para aqueles que, de forma fraudulenta, pretendam entrar no país fora dos pressupostos definidos pelas convenções internacionais.

O SME é o organismo do Estado que aprecia os pedidos de asilo e procede à instrução dos processos de concessão do estatuto de refugiado, com base na Lei 10/15, de 17 de Junho, Lei sobre o Direito de Asilo e o Estatuto de Refugiado.

Atribuição de novos documentos

O director-geral do SME lembrou que, com a extinção do Comité de Reconhecimento de Direito de Asilo (COREDA), foi aprovado o Decreto Presidencial nº 200/18, de 27 de Agosto, que cria o Conselho Nacional para os Refugiados (CNR), órgão multissectorial que, recentemente, deu início, em Luanda, nos postos de atendimento do Rangel e da Zona Económica Especial, em Viana, ao processo de registo nacional de refugiados e requerentes de asilo e a atribuição de novos cartões de refugiado.

Trata-se, acrescentou, de um documento moderno, com maior durabilidade, seguro, com código QR, de difícil contrafacção e demais elementos de segurança.

O referido registo é extensivo ao agregado familiar dos visados e decorrerá em todo o território nacional.


 IGREJA CATÓLICA: "Acolhimento é feito de acordo com as normas internacionais”

O secretário da Comissão Episcopal da Pastoral para os Migrantes Itinerantes (CEPAMI) da Igreja Católica, Octávio Miguel Buco, que falou em representação da secretária-executiva da CEPAMI, madre Carla Frey Bamberg, esclareceu que o migrante ou a pessoa em situação de mobilidade pode ser enquadrado em várias subcategorias, em que  estão os refugiados, deslocados, retornados, repatriados, dentre outros.

 "Quando falamos da situação dos migrantes em Angola, precisamos olhar por categoria diferenciada, porque cada uma delas tem uma especificidade muito própria”, disse.

Por exemplo, indicou, "os migrantes económicos, aqueles que são estrangeiros e vêm para o nosso país na condição de empresários, têm um nível de vida totalmente diferenciado de quem vem em outra condição”.

 "O mais importante é a salvaguarda da vida humana. Estamos com cerca de 56 mil requerentes de asilo e refugiados em Angola, onde o acolhimento é feito de acordo com as normas internacionais”, referiu.

Octávio Miguel Buco esclareceu que refugiados e requerentes de asilo são todas as pessoas que, por fundamentados temores de serem perseguidas, transpõem as fronteiras territoriais dos seus países e rumam para um outro país pedindo asilo.

Segundo o responsável, os constrangimentos que os mesmos enfrentam são muitos, como a falta de apoio de instituições próprias. "A maneira como muitos chegam para as nossas instalações deixa a desejar, mas nós, como pessoas de bem, tratamos o que é de direito”, salientou.

Sobre as nacionalidades, Octávio Miguel Buco avançou que entre os que mais chegam ao país destacam-se os da República Democrática do Congo (RDC), Guiné Conacry, Senegal, Mauritânia, Camarões, Eritreia dentre outras.

"Os nossos vizinhos da RDC têm estado sempre connosco, por força dos vários conflitos que se verificam naquele país”, adiantou.

No entender do secretário da CEPAMI, os refugiados têm uma situação totalmente diferente, porque um refugiado sai da sua terra sem nenhuma preparação, não leva nada, nem bagagem, dinheiro, sai apenas com a roupa que tem no corpo e foge.

O migrante é toda a pessoa que se transfere do seu lugar habitual, da sua residência comum ou de seu local de nascimento, para outro lugar, região ou país. A Comissão Episcopal da Pastoral para os Migrantes Itinerantes  é o organismo da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST) criada, em 2006, com a finalidade de organizar e dinamizar serviços pastorais relacionados com os refugiados e deslocados no desenvolvimento humano e integral em Angola.


Senegalês Câmara Dialo vive em Angola "sem problemas”

O senegalês Câmara Dialio, residente em Angola há oito anos, assegura que vive sem problemas porque tem o estatuto de refugiado, que lhe permite realizar os seus negócios.

A cidadã Lisi Que Gorety, 40 anos, refugiada do Burundi, mostrou-se satisfeita com o gesto do Executivo angolano, no reconhecimento do registo que decorre, em Luanda, para a aquisição do cartão de refugiada, que vai permitir tratar documentos em Angola, como a abertura de uma conta bancária, de modo a ajudá-la a integrar-se socialmente no país.

Já Ibraima Amadi, 40 anos, vive em Angola há cinco anos. Residente no bairro de São Paulo, disse que, com o cartão de refugiado, vai poder registar os filhos, abrir uma conta bancária e trabalhar sem constrangimentos.

 
Sonho de um migrante

Para os estrangeiros que residem em Angola, o sonho é ter grandes empreendimentos. É o caso do guineense Mohamed Jordi, que almeja um dia ser proprietário de um estabelecimento de renome nacional.

 "Estou neste negócio há seis anos, mas ainda não me sinto realizado. Um dos meus maiores sonhos e acredito que também é o de todo o migrante, é conquistar uma vida estável neste país”, disse.

"A vida que encontramos em Angola, no nosso país, infelizmente, não temos. Se fosse assim também na Guiné, não tinha necessidade de vir para Angola”, lembrou.

Sadio Sodré também tem o sonho de um dia edificar uma gigantesca loja de electrodomésticos e móveis. Mas, por agora, contenta-se com uma pequena casa comercial no bairro Mártires de Kifangondo. Oriundo da Côte d’Ivoire, Sadio Sodré deixou a família para tentar uma vida melhor, escolhendo como destino Angola.

Solteiro, de 37 anos, vive no bairro Hoji ya Henda. Em 2017, quando completou 30 anos, Sadio Sodré pediu aos pais que o deixassem tentar um novo modo de vida fora do seu país e veio para Angola.

Desde que chegou, trabalha arduamente para um dia voltar para junto dos familiares e poder dar-lhes algum conforto. "Estou a dar o meu melhor para poder dar outra vida à minha família”, referiu.

Touré Mohamed é outro imigrante, que saiu da Guiné-Conacry à procura de melhores condições de vida. Está em Angola desde 2015. Chegou a Angola num período em que os imigrantes eram vistos como contrabandistas e tudo o que faziam estava ligado a negócios obscuros. Na altura que falava para a reportagem do Jornal de Angola, arrumava os produtos numa prateleira da loja onde é o gerente, no bairro Prenda, em Luanda.

"Antes de me estabelecer neste país, o povo da Guiné-Conacry tinha uma outra imagem deste país. Ouvíamos dizer que Angola era um país de muita turbulência e desordem mas, felizmente, as coisas hoje estão a melhorar e foi aí que decidi vir e viver a realidade angolana e gosto de cá estar”, explicou.


SECRETÁRIO-GERAL DA ONU
"As pessoas em movimento são poderosos    impulsionadores do desenvolvimento”

O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, considera que as pessoas em movimento são poderosos impulsionadores do desenvolvimento, tanto nos países de origem como nos países de destino, como trabalhadores, estudantes, empresários, familiares, artistas e muito mais.

Numa mensagem por ocasião do Dia Internacional dos Migrantes, que se assinala hoje, 18 de Dezembro, António Guterres refere que os migrantes mantêm muitas vezes fortes ligações com os países de origem, ao mesmo tempo que abraçam as suas novas comunidades, onde trazem uma riqueza de conhecimentos, experiência e competências.

"Se bem gerida, a mobilidade pode ser uma pedra angular do desenvolvimento sustentável, da prosperidade e do progresso”, sublinhou.

No seu entender, desbloquear o potencial da migração "é fundamental para acelerar os esforços para enfrentar os desafios significativos da Agenda 2030, articulados durante a cimeira dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, realizada em Nova Iorque, em Setembro de 2023, para o benefício de todos”.

"Há uma necessidade urgente de a comunidade internacional fornecer soluções centradas nas pessoas e baseadas em evidências para que as pessoas permaneçam nas suas comunidades e para aqueles que querem ou devem mudar-se”, apelou.

 O Secretário-Geral das Nações Unidas referiu ainda que a cimeira COP28 recentemente concluída, no Dubai, proporcionou à OIM (Organização Internacional para as Migrações) a oportunidade de defender novamente que o impacto das alterações climáticas sobre os migrantes fosse uma parte central da discussão.

"A promoção de parcerias igualitárias e inclusivas com migrantes, mulheres, pessoas com deficiência e comunidades, ao mesmo tempo que enfatiza o papel dos jovens, é agora mais crítica do que nunca”, enfatizou.

Neste Dia Internacional dos Migrantes, acrescentou, a OIM pretende posicionar a migração como uma das soluções para os desafios globais, como a adaptação aos impactos das alterações climáticas ou a oferta de melhores oportunidades económicas para as comunidades.

 

Dia Internacional dos Migrantes

 O Dia Internacional dos Migrantes é celebrado anualmente no dia 18 de Dezembro. A data foi instituída pela Assembleia Geral das Nações Unidas, através da Resolução 55/93, adoptada a 4 de Dezembro de 2000.

O 18 de Dezembro foi escolhido porque foi nesta data que, em 1990, foi adoptada a "Convenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e Membros de Suas Famílias”.

A cada ano, a Organização das Nações Unidas, através da Organização Internacional para as Migrações (OIM), usa o Dia Internacional dos Migrantes para destacar as contribuições dos cerca de 281 milhões de migrantes, incluindo mais de 45 milhões de Pessoas Deslocadas Internamente (IDPs) e os desafios que enfrentam.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Reportagem