Opinião

Exploração de crianças

Embora o ordenamento jurídico angolano tipifique e criminalize toda e qualquer prática de exploração de trabalho infantil, quase que recorrentemente somos confrontados com informações sobre trabalho com menores que raiam à servidão. Com maior incidência nas zonas rurais, o fenómeno, oportunistamente aproveitado nestes tempos por força da crise económica, é transversal a toda a sociedade.

17/04/2021  Última atualização 06H55
Até nas áreas urbanas, e não raras vezes a partir do seio familiar, é crescente o número de crianças e adolescentes exposto ao trabalho do tipo escravo. 

Não é segredo para ninguém que centenas de crianças são movimentadas, algumas com a convivência de familiares, para trabalhar nas fazendas, pedreiras, para o casamento forçado, no caso das meninas, e outras formas criminosas de exploração. É verdade que não é fácil o controlo e acompanhamento, por parte das autoridades, do movimento de crianças e adolescentes que, dentro do território nacional, acabam em fazendas, quintas, exploração de inertes e minerais, nas supostas famílias de acolhimento. A ausência de documentação e uso da falsas ligações familiares, além da falsa identidade em muitos casos, dificultam a monitoria dos casos que envolvem a mobilidade de crianças e adolescentes para os espaços em que acabam escravizadas. Algumas famílias, pelas mais variadas razões, económicas, financeiras e até culturais, não se coíbem de "alienar” os dependentes menores a terceiros com a falsa promessa de cuidados, tratamentos e educação. 

É nas famílias onde as crianças e adolescentes, para nos focarmos neste segmento, atendendo ao elevado grau de vulnerabilidade, deviam encontrar a maior protecção contra tentativas de exploração. As instituições do Estado tudo fazem, à luz das leis, protocolos, convenções internacionais e regionais ligadas à protecção de menores, mas sem a firme colaboração das famílias, das comunidades e das pessoas singulares na denúncia de casos que atentem contra os direitos das crianças, pouco ou nada se conseguirá. 

É preciso que as famílias elevem a vigilância, acautelem eventuais abordagens que envolvam promessas de cuidados dos seus dependentes e recorram aos organismos do Estado em caso de dúvidas. Tal como no passado, mesmo em situação de pobreza, nunca as famílias abdicaram das suas responsabilidades, logo não faz qualquer sentido que, hoje, se evoque a pobreza como principal factor que leva as famílias a cederem os filhos ao cuidado de terceiros, sem garantias efectivas, nem controlo e acompanhamento ali onde vão. 

A mobilidade de crianças, que são movimentadas de uma província para a outra, não pode passar a efectivar-se pelos controlos sem um verdadeiro e apertado escrutínio da Polícia Nacional, representantes do INAC e outros peritos em matéria de exploração de trabalho infantil.As pessoas  que movimentam crianças, muitas vezes sem qualquer documentação que ateste o parentesco ou tutela, deviam ser desencorajadas a fazer sem reunir, ao menos, algum tipo de prova testemunhal junto das entidades competentes. 

Não se pode admitir que camiões com crianças ou adolescentes circulem de uma província para a outra sem que haja informação, autorização, controlo e acompanhamento por parte de quem de direito para, eventualmente, se resgatarem as pessoas em caso de maus-tratos ou trabalho escravo.  A exploração do trabalho infantil deve ser erradicada, mas para isso urge um processo de sensibilização e consciencialização por parte das nossas famílias, ao lado do papel exercido pelas instituições do Estado. 

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