Opinião

Facilidades e isenção de vistos. Falta a reciprocidade

Adebayo Vunge

Jornalista

Uma das grandes vantagens da mundialização é a facilidade de mobilidade das pessoas, mercadorias e do capital. No fundo, a sociedade global, na actualidade, realiza-se mediante o fim das barreiras que permitem com que tudo esteja acessível para todos.

16/04/2024  Última atualização 09H20

Um dos motores dessa mobilidade é a tecnologia, que está em níveis muitas vezes ininteligíveis para o comum dos seres humanos. Os acérrimos defensores dos avanços tecnológicos não vêm, por isso, limites.

Quando pensamos na facilidade de mobilidade de pessoas para lá das fronteiras nacionais pensamos exactamente no peso e fluidez de circulação que alguns passaportes permitem em detrimento de outros. De resto, isso explica a grande corrida de certos angolanos em deter um passaporte da União Europeia, especial e obviamente o português. Muitos angolanos lutam para ter um passaporte português por conta da grande facilidade de mobilidade que este laissez-passez permite para muitos destinos.

Essa maior procura pelo passaporte português, obviamente por via da nacionalidade, tem atrás de si outras vantagens também de índole social, mas não traduzem qualquer sentimento de identidade, o que seria desejável ou expectável para quem procura ter outra nacionalidade.

Então, há uma conjuntura económica e diplomática que levou a que o Governo angolano adoptasse uma postura há muito reclamada de maior abertura e facilidade nos processos de aquisição de vistos e mesmo de circulação interna por parte dos estrangeiros em território nacional. Mesmo que haja afinações e melhorias a introduzir no processo, por conta por exemplo das condições de hospitalidade no nosso velhinho 4 de Fevereiro, quando essa semana se tornou público que em Fevereiro as suas operações passam para o Novo Aeroporto Internacional Dr. Agostinho Neto.

O que é expectável, em contrapartida, é que o Estado angolano passe a requerer reciprocidade de tratamento para os seus cidadãos que são hoje tratados com completa desumanidade nos diferentes serviços consulares onde requerem os tais vistos, seja por que razão for. Como perceber que os tais serviços retenham os passaportes por períodos tão longos de alguns meses, coartando inclusive a possibilidade de circulação dos cidadãos para outros países que não os seus, sobretudo aqueles com os quais, hoje, os angolanos já dispõem dessas facilidades e isenções?

O afã pela emigração não é um exclusivo dos angolanos. Esse desejo está mais ou menos implantado um pouco por todo o lado, em todas as sociedades e entre a população globalmente, mas isso não pode justificar o tratamento indigno que os angolanos recebem, o que começa desde logo pela forma de atendimento, a demora na tramitação dos tais processos e outros expedientes.

O caso português é ainda mais flagrante porque coloca em causa inclusive outro tipo de acordos bilaterais – como é o caso da tal parceria estratégica reclamada pelos dois Estados, e multilaterais – no quadro da CPLP, por exemplo, que cada vez mais perde fundamentos para a sua afirmação. Sabemos todos que os conservadores andam por aí a proliferar nos últimos anos, com Presidentes de extrema direita e populistas nos Estados Unidos da América, no Brasil, Canadá e alguns países da União Europeia.

São tudo expedientes e discursos cuja prática nos revela uma situação de discrepância no tratamento e torna imperativa a exigência de reciprocidade. Se não em termos de isenção, pelo menos com expedientes de facilitação, o que traz consigo as outras duas componentes que referi ab initio aqui, ou seja, a mobilidade de mercadorias e do capital.

Não se pense que só o petróleo pode ser exportado. Temos hoje um naipe grande de produtos a sair de Angola. O que nos falta é escala, consistência e sustentabilidade para que a nossa produção se torne competitiva. O que nos falta, nalguns casos, é uma indústria transformadora que tire maior proveito de alguns recursos naturais e minerais que destaco, a exemplo da madeira e das rochas ornamentais.

Por conseguinte, o paradoxo dessa política é que os tais consulados não conseguem enxergar diferenças e colocam todos os angolanos na condição de potenciais emigrantes. 

Só o Estado Angolano pode, assim, proteger os seus cidadãos e exigir algum respeito.

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