Opinião

Fertilizar a pandemia

Luciano Rocha

Jornalista

A frase “grupos de risco” nunca, nas últimas décadas, foi tão dita, redita e ouvida, nem no aparecimento ou auge do Sida - que estigmatizou pessoas - como, agora, em tempo do novo coronavírus.

26/04/2021  Última atualização 07H20
Os portadores de Sida evitavam, principalmente nos primeiros anos, assumirem a infecção para fugirem a rótulos discriminatórios ditados pela ignorância, ao contrário do que sucede com os do coronavírus, que não são rejeitados, têm a solidariedade generalizada das sociedades, apoios institucionais e campanhas constantes sobre formas de a evitar.

Os maiores  obstáculos, não os únicos, no combate à actual pandemia são algumas das potenciais vítimas, que, cada vez em maior número, mesmo perante as evidências de factos, a certeza de, pelo menos, para já, não haver fármaco que, comprovadamente, aniquile o coronavírus, escusam-se ao cumprimento de medidas decretadas para o bem de todos, até deles.

 Rostos descobertos, distanciamentos e recolhimentos domésticos ignorados enxameiam os espaços públicos de Luanda perante a inacção de quem está obrigado, mesmo sem pandemia, a zelar pela segurança dos que a habitam.

Desleixo, transgressão e sentimento de impunidade, como todas atitudes prejudiciais ao bem comum, têm efeitos multiplicadores. Comprovam-no dados recentes e actuais da nossa História, dos quais a província de Luanda é fértil.

Os "grupos de risco”, entre nós, por todas aquelas razões e muitas mais, tendem, "pelo andar da carruagem”, a transformar-se em multidões de infectados. "Pela Covid-19, mas, também, por doenças mais antigas, mas que dizimam, igualmente, vidas, enlutam famílias, reduzem a nossa força de trabalho, enquanto país, e hipotecam-lhe o futuro, com juros incalculáveis.

Os "grupos de risco”, bem vistas as coisas, somos todos, até aqueles que, transgredindo, dificultam a luta contra a pandemia, facilitam-lhe a caminhada assassina. Por enquanto - até quando? - é uma, a da Covid-19. Antes que seja tarde demais, aperte-se o cerco a quem directa e descaradamente alarga as hipóteses de contágios, mas, igualmente, aos que assobiam para o lado, como se nada estivesse a acontecer.  Em ambos os casos, os protagonistas funcionam como fertilizantes do vírus.

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