Entrevista

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“Gostaria de levar a magia do livro às crianças mais desfavorecidas”

Francisco Pedro

Jornalista

Natural do Lubango, província da Huíla, Gisela Borges é escritora de textos infantis. Nesta entrevista, a propósito do Dia Mundial da Literatura Infantil, assinalado, recentemente, a autora do livro “O meu livro de Estórias” fala da emoção de contar as histórias da obra às crianças e aos adultos

09/04/2024  Última atualização 10H36
Autora tem ido às escolas, igrejas, creches, festas de crianças e em encontros de familiares e amigos para apresentar a obra © Fotografia por: DR

O que a motivou a escrever obras infantis?

Tenho apenas um livro com sete histórias e umas tantas por sair. A minha experiência na infância e na adolescência, enquanto realizadora e apresentadora de programas infantis de rádio e televisão, motivou-me a pegar na caneta e deixar fluir a imaginação. Claro que, também, pelo facto de ter tido a oportunidade de ouvir e ler muitas histórias. Sempre fui estimulada nesse sentido.

 

Quais são as suas estratégias ou recursos para criar histórias infantis?

As minhas estratégias foram, sobretudo, olhar para o meu público-alvo e tentar pensar como ele (crianças). Utilizei episódios reais para criar as minhas personagens. Olhei para a natureza e tentei identificar, em cada objecto, animal ou planta, o porquê, como, em que circunstância, para passar uma mensagem positiva ou um ensinamento valioso e importante. É claro que procurei, em cada frase, usar uma linguagem acessível, deixando sempre espaço para algumas palavras novas, de modo a enriquecer o vocabulário da criança. Tudo isto, aliado à parte lúdica e recreativa.

 
Como autora, pretende continuar a escrever apenas obras infantis?

Tenho um carinho muito especial pela literatura infantil. Como disse, tenho outras histórias escritas, mas também gosto de escrever coisas que falam de amor. Quem sabe, saia, um dia, um romance.


Faz da literatura uma aposta profissional ou passatempo?

Um passatempo e uma terapia. Sinto-me muito "viva” quando escrevo. Viajo para um mundo mágico, onde tudo de bom pode acontecer.

Desde que lançou a primeira obra, quais foram os momentos marcantes como resultado deste livro?

Um dos momentos marcantes, como resultado da obra, foi o próprio acto de lançamento. Eu queria que fosse uma coisa especial e que as crianças e adultos presentes vivessem uma experiência única. Não passou de um simples lançamento de livro, foi um sonho realizado, ao

oferecer um espectáculo cultural com poesia, teatro e música. Consegui isso com a ajuda da família e amigos.

 
As histórias do livro serviram como pano de fundo?

Sim. Decidi ter as minhas histórias como pano de fundo do evento. Ou seja, um poema que foi musicado, uma história que foi teatralizada, alguns personagens fizeram-se presentes como o "Relógio que queria ser atleta”, e "A nuvem que queria cantar…”. E eu, enquanto contadora de histórias, criei uma história especial só para aquele dia. Foi a história do "Obrigada”. Uma forma simpática que encontrei para agradecer a todos os que me permitiram ter o livro na mão. Foi muito emocionante para mim.

 
E depois do lançamento?

Depois disso, a alegria de saber que as crianças queriam ler o meu livro, queriam que eu contasse histórias de outros autores, tornando-me muitas vezes numa contadora de histórias (para o meu agrado).

Devo ainda dizer que o meu livro está numa das prateleiras de uma das bibliotecas de Milão, Itália, (alguém o levou, não sei quem) e está nas mãos de muitos meninos de Portugal, Brasil, Moçambique, Cabo-Verde, e obviamente do nosso país. Sinto-me feliz por isso.

 
A Huíla tem mercado para a literatura infantil?

Não tanto quanto deveria ser. Mas, os pais agora já se preocupam mais em comprar livros infantis, que são de certo modo escassos. As escolas começam a incentivar a leitura, com algumas actividades literárias.

Contudo, lamento a fraca adesão, o que se deve ao fraco poder de compra de certas famílias. Entre escolher um livro ou um pão, é óbvio que a barriga grita mais alto.

Tem tido outros momentos específicos para divulgar o livro?

Os meus textos são divulgados nas escolas, nas igrejas, em festas de aniversário ou em eventos particulares, quando sou convidada para contar histórias ou falar da importância da literatura infantil.

Confesso que gostaria de divulgá-lo mais. Mas, outras ocupações nem sempre me permitem levar a minha fantasia em forma de escrita, para onde deveria. Mas, tenho fé de que o quadro vai mudar.

 
Ser também contadora de histórias é a via mais rápida que encontrou para brindar os leitores/ouvintes com a sua criatividade literária?

A via mais rápida, actualmente, para divulgar os meus escritos é, sem dúvida, pelo meio digital. Mas, nem todos têm acesso. Entretanto, tenho ido às escolas, igrejas, creches, festas de crianças e em encontros de famílias e amigos.

 
Para quando prevê lançar mais uma obra infantil?

Para muito breve… (risos). Não gosto de prometer, pois, sou muito lenta a tomar decisões. Contudo, a caneta já começou a trabalhar.

 
As obras infantis são restritas às crianças? Como é que devem ser lidas?

Devem ser lidas com muito amor! A leitura não é feita apenas para as crianças. Existem muitos adultos que se encantam com uma boa história e bem contada. Lembro-me de que uma vez fui contar a conhecida história do "Capuchinho Vermelho”, acompanhada com uma tia e algumas amigas. Naquele dia, estava tão inspirada, imitava a voz do lobo mau, do capuchinho vermelho, a voz meia rouca da avó, e enquanto narradora também dramatizava, fazendo gestos (risos), e cada vez que via o brilho nos olhos das crianças, empolgava-me respondendo às perguntas curiosas. Eu cantava, pulava, enfim, foi tudo muito especial.

 
E qual foi a reacção dos adultos?

Quando terminei, os adultos que lá estavam disseram-me: "Conheço essa história há muitos anos, mas nunca tinha ouvido contar dessa maneira!”. Isto, para dizer que devemos dar vida às histórias que contamos. Colocando emoção, encorajando a participação, fazendo gestos, usando recursos visuais, respeitando o ritmo das crianças, e, sobretudo, dar uma entoação vocal para criar uma conexão emocional entre quem conta e quem ouve.

 
O que gostaria de ter feito ou organizado em prol do 2 de Abril?

Gostaria de levar a magia do livro às crianças mais desfavorecidas, através do teatro, da música e da poesia. Eu imagino um cavalo branco a puxar uma carroça, cheia de livros, e nela um palhaço alegre com um sino a chamar pelas crianças. Duas ou três pessoas vestidas com muita cor, cada uma com um livro gigante nas mãos, a cantar uma música que retrate a importância do livro. As crianças a correrem atrás e, de repente, a carroça pára num local preparado, e aí surge a verdadeira festa das histórias (risos). Com amor tudo é possível. Este sonho é realizável e poderá um dia acontecer.


Perfil

Gisela Fernanda Carmelino de Andrade Borges Nascida no Lubango, a 2 de Junho de 1970

Mãe de três filhos (duas meninase um rapaz)

Licenciada em Economia e Gestão

Apresentadora da Televisão Pública de Angola (TPA-Huíla)

Administradora Executiva da Escola Portuguesa do Lubango

Reformada pelo Banco de Poupança e Crédito (BPC)no Lubango

____________

Outras funções:

Realizadora e apresentadora de programas infantis (1983-1993), professora de Matemática (1989-1992), professora universitária das cadeiras de Marketing e de Técnicas Discursivas e palestrante

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