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A diplomacia é, para Saadia El Alaoui “Souad”, uma vocação. “Se não a temos, devemos virar-nos e procurar o nosso caminho noutro lugar, porque é preciso fazer sacrifícios pessoais e escolhas, por vezes dolorosas”
Como é que parou na diplomacia?
Embora os meus estudos me tenham predestinado para o campo das relações internacionais, estava mais interessada numa carreira no jornalismo político. Mas quando passei no exame de admissão ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, não virei as costas a uma carreira diplomática. A partir daí, foi um caminho sem mudança de direcção.
Em que momento entrou para a diplomacia?
Na verdade, eu ainda era jovem, mas ainda sou jovem de espírito. De facto, entrei para o Ministério quando estava terminando minha tese de doutoramento de pós-graduação. Foi assim que me envolvi nesta aventura chamada carreira diplomática. No entanto, deve ser enfatizado que ser diplomata de carreira não é necessariamente um caminho linear. É bastante multifacetado, longe de ser um rio tranquilo. No plano administrativo, fui secretária dos Negócios Estrangeiros, conselheira, ministra plenipotenciária, além de coordenadora e negociadora do Movimento dos Não Alinhados, para as Questões de Manutenção da Paz, Coordenadora do G77, para as questões de informação e tantas outras responsabilidades. Em suma, a veia multilateralista tem sido dominante. Mais recentemente, ajudei na criação do grupo dos Embaixadores Francófonos em Angola, em 2019, sendo também Decana do Grupo dos Embaixadores Árabes e vice-decana do Grupo Africano.
Em que países já trabalhou, enquanto diplomata?
A minha carreira profissional levou-me a exercer em vários países na qualidade de diplomata, tendo vivido na Suíça, na Holanda e na Noruega para além dos Estados Unidos. Na minha qualidade de Embaixadora, fui acreditada junto da Islândia, mais recentemente na Zâmbia e actualmente junto da Namíbia.
Que dificuldades enfrentou no mundo da diplomacia?
A mais importante é ser uma "nómada”. Mover-se de um posto para outro, de um continente ao outro e de uma cultura à outra. Isto apresenta toda uma paleta de desafios no dia-a-dia, porque é necessário, em cada etapa, adaptar-se, construir uma rede, descobrir um país. No entanto, essas dificuldades são ao mesmo tempo o que torna a profissão de diplomata tão enriquecedora porque nos abrimos para riquezas culturais incríveis e fazemos encontros humanos que nos marcam em cada etapa. Em suma, o nómada que é o ou a diplomata se torna um 'cidadão do mundo'.
Em algum momento pensou em desistir da diplomacia?
O mundo da diplomacia tem duas vertentes, uma bilateral e outra multilateral. Nesta segunda, o trabalho das Organizações Internacionais (OI), nomeadamente da ONU, faz parte deste capítulo multilateral. Em várias etapas da minha vida, quis passar do quadro nacional para o das O.I. Há muitos diplomatas que vão e vêm entre os seus respectivos Ministérios e as organizações internacionais. A minha experiência como Conselheira Sénior para o Presidente da Assembleia Geral da ONU na 64ª sessão, por um ano, foi enriquecedora em todos os aspectos, pois me permitiu ter uma visão diferente do Secretariado das Nações Unidas em Nova Iorque. Mesmo quando saí do quadro diplomático nacional, fiquei no mesmo padrão.
O que representa a diplomacia para si?
A diplomacia é uma vocação. Se não a temos, devemos virar-nos e procurar o nosso caminho noutro lugar, porque é preciso fazer sacrifícios pessoais e escolhas, por vezes dolorosas. Muitas vezes, erramos ao pensar que a vida de um diplomata é feita de recepções e festas. Longe dessa caricatura, ele ou ela não poupa esforços para trabalhar, não apenas na vertente política, mas também na vertente económica, cultural, mediática. Em suma, deve representar todos os sectores existentes em seu país, com a tarefa de criar pontes sustentáveis.
Sendo o Marrocos um país islâmico, onde não é comum as mulheres ascenderem a cargos políticos, como conseguiu chegar a tal patamar?
Em primeiro lugar, o Islão não é antinómico com as liberdades e os direitos. Muito pelo contrário, o Islão foi precursor no que diz respeito aos direitos das mulheres, numa época em que a mulher era considerada um objecto que se herda. Lembre-se da situação da mulher no mundo, inclusive na Europa, no alvor do Islão em 762, data que remonta à Idade Média. O problema não está nos preceitos do Islão, mas na interpretação restritiva, ou mesmo errónea, que se faz dele.
Como analisa o país hoje, quanto a esse assunto?
A mulher marroquina está hoje presente em todos os sectores da vida social, económica, política, parlamentar, governamental. Marrocos defende um Islão aberto, tolerante que respeita os direitos da mulher e continua a promovê-los e a capacitá-las para os cargos de responsabilidade, tanto no sector público como no privado. Gostaria de salientar que Sua Majestade o Rei Mohammed VI está na vanguarda deste processo com um Projecto Real para a promoção da igualdade entre homens e mulheres como fundamento de uma sociedade justa, democrática e igualitária. Ele diz que "a questão exige, sem dúvida, uma renovação global, através de uma profunda transformação das mentalidades arcaicas e da consciência colectiva. Ela exige deixar à mulher a faculdade de se inserir em todas as facetas da vida da nação”.
Há mais de cinco anos em Angola, como vê a cultura da mulher angolana em relação a do seu país?
O nosso continente tem uma grande diversidade desde o seu Norte ao seu extremo Sul. A abordagem de género e o objectivo de mais igualdade e direitos para garantir a paridade entre homem e mulher são os mesmos, seja no Marrocos ou em Angola. No plano cultural e artesanal, sim, existe uma diversidade entre a mulher angolana e a marroquina, mas também pode ser complementar. Veja-se, por exemplo o desfile de moda que organizei durante as jornadas marroquinas, no âmbito da 1ª edição da Bienal de Luanda, em Setembro de 2019. A designer marroquina fez desfilar as manequins vestidas da tradicional roupa marroquina, os caftans, com acessórios da Madame Nadir Tati. Foi um bom exemplo de cooperação artística. Longe da moda, devemos pensar na mulher rural tanto no Marrocos como em Angola, pois muitas vezes estas mulheres assumem um sem número de tarefas, tanto nos campos como na casa. Merecem o nosso apoio e a nossa admiração.
Enquanto mulher e diplomata, qual é o seu maior sonho?
O meu sonho é conseguir a paridade entre homens e mulheres em todas as sociedades. Que as meninas possam ter acesso à escola em qualquer parte do mundo e que a violência que as mulheres sofrem, em todas as suas formas, cesse de uma vez por todas.
Estamos no mês dedicado à mulher. Na sua terra, como é celebrado o Dia Internacional da Mulher?
Comemoramos o dia 8 de Março, mas na verdade é uma celebração que dura todo o mês de Março. As forças motrizes da sociedade civil, bem como as instituições públicas e privadas, procedem às celebrações habituais. É também um momento em que se avalia o que foi alcançado e os desafios a enfrentar. Organiza-se mesas redondas, painéis, homenagens. O Governo apresenta as acções realizadas. As ONGs fazem também o balanço dos progressos realizados e do caminho que falta percorrer. Este ano, a Agência de Imprensa Nacional, a MAP, publicou uma edição especial dedicada às mulheres embaixadoras marroquinas. Cada Embaixadora teve direito a um perfil muito detalhado, destacando o seu percurso e as suas realizações. A publicação teve um grande sucesso e circulou amplamente nas redes sociais, além da edição impressa. Por último, gostaria de anunciar que temos uma rede de mulheres chefes de missões diplomáticas e de organizações internacionais, aqui em Luanda, e que estamos a organizar um grande evento, hoje, que inclui no programa várias palestras e um debate sobre o tema "Poder e Género: Consolidação das Conquistas das Mulheres”, com a participação de várias mulheres executivas, membros do Governo e altas responsáveis da administração angolana, bem como membros do Corpo Diplomático.
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