Reportagem

Adérito Dias: Da Universidade para o mundo dos negócios

Isaquiel Cori

Jornalista

Empresa jovem apostada no mercado do turismo ecológico em Angola, a TEN Tours tem como objecto social a realização safaris e excursões a sítios de interesse turístico do país, tornando-os acessíveis aos interessados. O director mentor do projecto da empresa é o economista e empreendedor Adérito Dias

15/10/2023  Última atualização 12H43
© Fotografia por: Edições Novembro

Segundo Adérito Dias, o que o inspirou é o facto do turismo ser a indústria que mais cresce em todo o mundo, com realce para a vertente ecológica. "Angola tem um potencial enorme para desenvolver o ecoturismo, por isso, decidimos avançar neste mercado. O Safari é inevitavelmente a nossa mais-valia, por isso a nossa marca é uma Palanca Negra Gigante”, disse, acrescentando que a sua ideia motriz "é despadronizar a forma de se olhar o turismo interno em Angola e ajudar a melhorar a indústria do turismo”.

Num único ano a TEN Tours organizou excursões às províncias de Luanda, Bengo, Malanje, Namibe, Zaire, Uíge, Cuanza-Sul e Cuanza-Norte, com grupos de turistas nacionais e estrangeiros. Em Luanda, os locais visitados foram as grutas de Cabo Ledo, o Museu da Escravatura e o Miradouro da Lua. Foi ainda realizado um safari no parque nacional da Quiçama. No Bengo os turistas agenciados pela TEN Tour foram à Lagoa de Águas Azuis, Cemitério dos Navios, Lagoa do Panguila e ao Açude da Barragem das Mabubas.Em Benguela, os turistas puderam ir à Praia Morena, Caotinha, Baía Azul, Restinga do Lobito, Sé Catedral, entre outros locais. No Cuanza-Sul, visitaram as águas termais da Tocota, na Conda, as grutas de Sassa, as cachoeiras do Binga, etc. No Cuanza-Norte não deixaram de ir ao Jardim Botânico do Kilombo.No Namibe, visitaram a Colina do Arco, o deserto do Namibe, com realce para a WelwitschiaMirabilis, a Piscina Natural do Piambo, a Praia do Soba, Praia da Mariquita, Marginal do Namibe, entre outros locais.

No Zaire, os excursionistas foram às grutas de NzauEvua, ao Museue ao Cemitério dos Reis do Kongo, ao Kulumbimbi, à Ponta do Padrão, à Pedra do Feitiço, etc. No Uíge às grutas do Nzenzo, Lagoa do Feitiço, Pedras Rupestres de Kalaba, etc. E em Malanje foram às Quedas de Calandula, Cascatas de Musseleje, Pedras Negras de Pungo Andongo e aos Rápidos do Kwanza, além de realizarem um safari no Parque Nacional de Cangandala.

"Em cada província que passamos desenvolvemos um itinerário que tem ajudado outros operadores a visitarem os pontos turísticos nas províncias”, elucidou Adérito Dias.

Questionado se o retorno, em termos de receitas financeiras, tem sido positivo, Adérito Dias salientou: "Nesta altura, estamos a consolidar o negócio realizando investimentos sólidos. Ainda não estamos a ter retorno do investimento, mas já existe um alto sustento das actividades, ou seja, as receitas arrecadadas com a venda de pacotes turísticos já cobrem 90 por cento dos custos totais para a realização das actividades”.

Do ponto de vista do negócio, segundo Adérito Dias, apesar de estarmos a atingir alguns dos objectivos definidos "ainda não atingimos a rentabilidade esperada”. Neste momento, adiantou, o mais rentável são as tours e os safaris privados. "Temos parcerias com alguns hotéis em Luanda que têm estado a nos fornecer hóspedes, na sua maioria expatriados, para esse tipo de actividade. Neste momento, temos mais de 200 turistas na nossa base de dados que já participaram nas nossas tours”.

De todos os destinos acima mencionados, o que mais impacto causou aos turistas, no dizer do responsável da TEN Tour, foram as grutas do Nzenzo na província do Uíge. "Essas grutas fazem parte das Sete Maravilhas de Angola e deixaram os excursionistas maravilhados. Mas a Piscina Natural do Piambo, na província do Namibe, também tem sido muito solicitada”.

Questionado qual o destino que mais o impressionou, pessoalmente, Adérito Dias respondeu: "Tenho um conhecimento profundo das belezas naturais de Angola. Já estive antes do projecto TEN em quase todos os lugares que os turistas visitaram, mas penso que o que mais me impressionou foi a cerimónia realizada pela corte do Reino do Kongo, em Mbanza Kongo, para visitarmos o Cemitério dos Reis do Kongo. Foi um momento fantástico”.

Os próximos desafios da TEN Tour, sublinhou Adérito Dias, têm a ver com o desenvolvimento de um programa denominado "Vá para fora, cá dentro”, com o objectivo de desenvolver serviços com padrões internacionais e com os parceiros realizar safaris solidários para crianças e adolescentes do ensino publico e privado. "Também pretendemos lançar, ainda este ano, a Gala do Turismo em Angola (GATA - 2023), para premiação de turistas e serviços inovadores no segmento do turismo. Estamos comprometidos com a construção de um ecossistema forte do turismo em Angola”, frisou, assinalando que a sua empresa está focada em promover o turismo interno. "O nosso alvo é contribuir para tornar Angola um dos principais destinos turísticos da África Austral”.

Relativamente ao estado de preservação dos locais turísticos, sobre os acessos aos mesmos e a existência ou não de estruturas e serviços de apoio aos turistas, Adérito Dias é de opinião que um dos principais segredos para continuar a acreditar no turismo interno "é aceitar a nossa realidade, ou seja, assumir que precisamos começar com as estradas e infra-estuturas que temos. Não temos no país uma política de conservação dos locais turísticos, está tudo jogado à própria sorte”.

O jovem empreendedor, fruto do estudo e da experiência adquirida no sector,  projecta o turismo interno em   três zonas: "O Litoral, que tem estruturas e estradas minimamente razoáveis, onde se faz um turismo de praia e sol; o Norte (Zaire, Uíge e Cabinda), com acessos muito precários e locais turísticos muito bonitos ainda por explorar, onde podemos desenvolver o ecoturismo; o Leste, Centro e Sul do país, que está literalmente esquecido pelas autoridades e agentes turísticos, quase sem estradas de acesso e pontos turísticos por se descobrir”.


Uma abordagem diferente

"Da experiência que já adquiriu, acredita que o turismo em Angola tem potencial para se tornar num sector gerador de grandes receitas para o OGE?”, perguntámos, ao que Adérito Dias respondeu: "Penso que devemos optar por uma abordagem diferente para o sector do turismo. Pensar que o turismo possa resolver o problema da diversificação económica angolana é um erro. Segundo dados do INE, o turismo representa quase 2,5 por cento do PIB, mas parte deste valor é resultado do turismo de negócio, que é um segmento feito pela indústria petrolífera. O sector empresarial privado e público precisa de estar focado na consolidação da indústria turística, e, por consequência, o turismo irá ajudar na geração de receitas para o OGE, na criação de mais empregos e na diminuição das assimetrias regionais”.

Quanto ao papel doEstado na promoção do turismo, Adérito Dias salientou que, bem ou mal, "o Estado está a fazer a sua parte, aprovando leis para promoção do turismo e reparando, na medida do possível, estradas e outras infra-estruturas. Existe um instituto de fomento do turismo (INFOTUR), ligado ao Ministério da Hotelaria e Turismo, existe um gabinete de desenvolvimento do polo turístico de Calandula, do pólo turístico de Cabo Ledo, etc., ou seja, o que não falta ao Estado é boa vontade. Mas penso que podemos fazer mais e com o pouco que temos, se o Estado decidir profissionalizar os guias turísticos e outros intervenientes na industria do turismo”.

Por outro lado, no entendimento da nossa fonte, "podemos aproveitar o turismo de negócio que existe em Luanda para financiar as startups no país, com a criação de um fundo de fomento do turismo, que poderia ser financiado com uma taxa do turista a ser cobrado nos hotéis, conforme acontece nos países desenvolvidos”.

Adérito Dias vai mais longe: "No meu ponto de vista, o Estado deveria entregar todos os parques nacionais para uma gestão privada, no sentido de aumentar o fluxo de turistas e o repovoamento animal, bem como a conservação da fauna”.

Nas várias excursões feitas, a empresa TEN Tour tem se deparado tanto com barreiras como com alguma cooperação. "De um modo geral, as principais barreiras temos tido em Luanda com as entidades centrais do Estado (Ministério da Hotelaria e Turismo, INFOTUR, etc.). A nível local, nas províncias, temos tido boa colaboração dos governos provinciais, no Uíge e Zaire tivemos inclusive o envolvimento dos administradores municipais, Polícia Nacional e empresários locais.  Em relação às autoridades tradicionais só temos que agradecer pela forma como recebem as nossas solicitações e o envolvimento pessoal dos sobas, regedores e outras entidades nasactividades”.


Revista "Njila”

Recentemente, a TEN Tour lançou a revista "Njila”, em cuja primeira edição está reunida informação sobre as excursões aos vários destinos turísticos do país. "Um dos fundamentos do nosso projecto é a promoção do turismo em Angola. E só vamos atingir este objectivo se a divulgação dos nossos serviços for feita de forma sólida e profissional, por isso lançámos a revista do turista ‘Njila’, que em kimbundo significa ‘Caminho’”.

A revista tem uma periodicidade anual e incorpora, além das matérias sobre os pontos turísticos, conteúdos ligados a cultura e gastronomia angolanas.

"A revista ‘Njila’ está disponível para todos os operadores turísticos no país. A ideia é ter a revista como uma forma de ajudar futuros operadores e turistas na busca do conhecimento sobre o potencial turístico do país. Nesta primeira edição, a revista tem 60 páginas e catalogamos todos os pontos turísticos que visitamos nas oito províncias. Os textos foram elaborados de uma maneira simples para que o leitor se sinta atingido pelos mesmos”.

 
Universo empresarial

O universo empresarial de Adérito Dias inclui, além da TEN Tour, a geladaria e pastelaria Doce Frescura, a empresa de consultoria e auditoria financeira e de contabilidade AD Consultores e o Banco Angolano de Roupas.

"Pretendemos criar uma estrutura sólida de negócio que ajude a materializar o crescimento e desenvolvimento económico de Angola que todos almejamos”, disse o empreendedor, sublinhando o maior desafio que enfrenta, na sua condição de jovem empresário: "Temos uma estrutura económica em que o principal cliente das grandes empresas é o próprio Estado e os principais empresários são os próprios gestores públicos e os políticos. Já deve estar a imaginar a dificuldade em conseguir fazer negócio, sendo jovem e sem links para conseguir um bom contrato. Mas esses desafios são a nossa maior motivação para continuar”.

Adérito Dias explicou que desde o tempo de estudante universitário que tem estado ligado a trabalhos de consultoria em contabilidade. "Ainda estava estudando quando abri com um colega da Universidade a minha primeira empresa. E tudo ganhou mais consistência depois de fazer um mestrado em gestão e empreendedorismo”.

O empresário nasceu aos 24/11/1985, em Icolo e Bengo, então província do Bengo, actualmente Luanda. "Mas eu gosto de ser tratado como natural do Bengo”, disse.

Técnico médio de Contabilidade pelo Instituto Médio de Contabilidade do Kilamba Kiaxi (IMEKK), Adérito Dias é licenciado em Contabilidade e Administração pela Faculdade de Economia da Universidade Agostinho Neto, pós-graduado em Autarquias e Finanças Locais, pela Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto e mestre em Gestão e Empreendedorismo pelo Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (ISCAL).

A sua formação profissional inclui os curso de Inglês, de Informática, de elaboração de estudos de viabilidade económica e financeira, de iniciação às tecnicas de perfuração petrolífera, engenharia logística, entre outros. Écasado, tem seis filhos, gosta de jogar futebol ou xadrez nos tempos livres e adora comer funje e mufete.

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