Por conta de algum ajuste da pauta aduaneira, concretamente relacionada com a taxação dos produtos de uso pessoal, nos últimos dias, a Administração Geral Tributária (AGT) esteve, como se diz na gíria, na boca do povo. A medida gerou uma onda de insatisfação e, sendo ou não apenas a única razão, foi declarada a suspensão daquela modalidade de tributação, nova na nossa realidade.
Em diferentes ocasiões, vimos como o mercado angolano reage em sentido contrário às hipóteses académicas, avançadas como argumentos para justificar a tomada de certas medidas no âmbito da reestruturação da economia ou do agravamento da carga fiscal.
Diz-se que, em política, convém que não prevaleça a regra do vale tudo, um facto nem sempre observado pelos fazedores de política, sobretudo quando confrontados com alguma impaciência, aparente desespero, eventual falta ou fracasso das estratégias, além da expectável necessidade de “criação de factos políticos”.
A extensa carta, se por um lado, pode ter sido o que a oposição política em Angola entendeu como uma "soberana oportunidade” de partilhar as suas inquietações, "se queixar” aos americanos, por outro, pode ter sido um exercício pouco consistente, com um impacto muito residual nas relações de Estado para Estado e até certo sentido uma demonstração desnecessária de fraqueza.
Mesmo partindo do princípio que sejam atendíveis, eventualmente plausíveis, algumas das "queixas” feitas pelo sexteto de subscritores da carta dirigida ao número um do Departamento de Estado, uma das primeiras ilações que se pode retirar, além das já mencionadas acima, tem que ver com a ideia de uma suposta subalternização nas relações entre Angola e os Estados Unidos. Conscientes ou não, pretendeu-se, com a carta, a julgar por grande parte do conteúdo e proposições, que devem ser os Estados Unidos a efectivar o fortalecimento do papel da sociedade civil, como parte do alegado "compromisso da Administração Biden de apoiar as Organizações da Sociedade Civil e os indivíduos na linha de frente do avanço dos direitos humanos e da mudança democrática”.
Os Estados podem, entre si influenciarem-se positivamente, mas, hoje, o processo de maturação da democracia, o reforço da observância dos direitos humanos e, mais importante, a "mudança democrática” não podem ser concebidos como resultados que tenham de vir de fora. E os políticos, inclusive para não serem encarados como fracos, deviam ser os primeiros a ganhar consciência dessa realidade e resistir a iniciativas como esta desencadeada pelos "parlamentares da oposição, integrados na Frente Patriótica Unida (FPU)”, que recorreram ao secretário de Estado em carta. E numa analogia com o que se passa em casa, de qualquer agregado familiar, quando as pessoas não são capazes de gerir internamente os seus problemas, ao ponto de se queixarem a terceiros, revela em certo sentido fraqueza, independentemente das circunstâncias.
As relações de Estado a Estado, na era moderna, postuladas em Cartas constitutivas de Organizações Internacionais, regionais, Convenções e Tratados, não prevêm um papel de sujeição de uns aos outros, independentemente da grandeza, influência e poderio, ao ponto de os políticos da oposição em qualquer parte do mundo, mesmo em situação de fraqueza, recorrerem como expediente para resolver problemas internos.
Em África, como a experiência nos tem mostrado, ao longo de mais de trinta anos, não foram as potências ocidentais, organizações internacionais ou factores externos que contribuíram para o fortalecimento das Organizações da Sociedade Civil, mas foram as variáveis internas, na maioria dos casos. E essa realidade continua até hoje, facto que devia levar a qualquer político sério a evitar recorrer fora, primeiro para não ser encarado como um ente desprovido de forças (ideias, capacidade de mobilização e papel activo nas instituições de que faz parte, etc.), segundo porque se trata de um mau precedente e em terceiro lugar porque essa estratégia pouco ou nada ajuda. Não é debalde que desde os aborígenes da Austrália, passando pelos índios brasileiros, às organizações da sociedade civil onde os processos de democratização se constroem ou se consolidam, não há muitos precedentes de recurso ao exterior como forma de pressão para resolver problemas locais.
Em mais de 100 anos de história de luta e revezes da National Association for the Advancement of Colored People (NAACP), para "promover a igualdade de direitos e erradicar o preconceito de casta ou raça entre os cidadãos dos Estados Unidos, promover o interesse dos cidadãos de cor”, não há registo de que tenham recorrido, algum dia, à ONU, aos tribunais de Haia ou "queixar-se” em países com algum poderio e influência para a resolução dos seus problemas.Os subscritores da carta ao secretário Blinken fazem alusões a factos e desígnios sobre os quais importa discutir e reflectir, é verdade, mas os Estados Unidos nunca se poderão substituir ao papel que os políticos e a sociedade civil angolana devem fazer, contando com as suas próprias forças. Embora não conheça a resposta do secretário Blinken, provavelmente a resposta não fugirá muito do que qualquer entidade receptora de uma carta, naqueles moldes, diria, nomeadamente que tudo depende mais do que vocês no terreno são capazes de fazer, em detrimento do que os Estados, nas suas relações bilaterais, podem fazer. Não me parece que os nossos actores políticos queiram promover um quadro em que se efective uma ingerência nos assuntos internos de Angola por parte dos Estados Unidos, um pressuposto condenado em todo o lado.
É verdade que é normal que haja interacção entre entes estrangeiros e actores políticos angolanos, que as forças políticas da oposição queiram interagir com entidades estrangeiras, particularmente aquelas originárias de países com algum peso político, diplomático e económico, em visita ao país, mas não sei se faz algum sentido aproveitar estes momentos para fazer "queixinhas”, mesmo quando este exercício pouco ou nada muda. Pela próxima e pelo histórico de iniciativas neste sentido e porque em política faz todo o sentido que se façam balanços, convirá aos subscritores desta iniciativa e demais entes políticos ou da sociedade civil ponderarem se com estes gestos pretendem demonstrar fraqueza, fazer queixas ou criar "factos políticos” decorrentes de alguma inacção ou necessidade de mostar que estão activos. Enfim.
*Jornalsta
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