Reportagem

Comunidade da Mabuia quer mais apoio para aumentar a produção agrícola

Ana Paulo

Jornalista

A comunidade da Mabuia foi sempre uma zona com potencial agrícola. É banhada pelo rio Zenza e duas lagoas e possui terras aráveis sem limite.

03/11/2023  Última atualização 08H40
Produtores da Mabuia pedem apoio de inputs agrícola © Fotografia por: Luís Damião|Edições Novembro

A populaçao dedica-se, até aos dias de hoje, essencialmente, à agricultura,  produzindo alimentos para garantir a sobrevivência das famílias e da comunidade.

Fundada em 1962 e com localização geográfica no município de Icolo e Bengo, comuna de Cabiri, a Mabuia fica a 60 quilómetros da cidade de Luanda.

Mais conhecido pelos munícipes como a "Comunidade dos cabo-verdianos", por serem estes os primeiros moradores do bairro na era colonial, Mabuia foi uma potência na era colonial, no cultivo de algodão.

Hoje, o povoado  consegue diversificar as culturas com uma variedade de produtos agrícolas, desde hortícolas, tubérculos, frutícolas, uma actividade praticada por mais de 100 pessoas, que têm como principal ocupação o campo.

No grupo dos 100 agricultores, faz parte o cidadão Jaime José Rodrigues, mais conhecido por "DÁ” ou "David", proprietário da "Fazenda DÁ”, com cerca de 40 hectares cultivados com uma variedade de produtos.

No local, a reportagem do Jornal de Angola constatou as culturas de milho, mandioca, batata, banana, quiabo, berinjela, cebola, melancia, repolho, couve, feijão manteiga, girassol, para a produção de óleo, entre outros produtos.

A cebola, já em fase de colheita, ocupa dois hectares. Segundo Jaime José Rodrigues, a produção ultrapassa o espaço de dois hectares quando há condições de inputs.

O cultivo de repolho é visível numa área de um hectar, o tomate, em cerca de dois hectares, mais as áreas prontas para colheita, e outras ainda em amadurecimento.

Sem ter em mente a estatística dos níveis de produção na sua Fazenda, por falta de material próprio para a pesagem, Jaime José Rodrigues garantiu que toda a produção é feita em grande escala  com meios próprios, sem apoio das administrações comunal e municipal nem do Governo da Província.

Para aumentar os níveis de produção, aquele agricultor necessita de apoio de materiais agrícolas, para alavancar a produção não só na sua zona de cultivo, como de toda classe camponesa da Mabuia.

Um dos apoios de maior relevância que a comunidade pede é um tractor para desbravar a terra, máquina que, até agora, têm sido alugadas no município de Cacuaco, comuna da Funda.

Produção de citrinos

Na Fazenda DÁ, há uma área de, aproximadamente, cinco hectares reservada para a produção de citrinos, sendo um hectare já em produção. Trata-se de um pomar onde se encontram variedades de frutas, outras até menos conhecidas pela população angolana, por serem mais comuns nas culturas cabo-verdianas.

O pomar encontra-se recheado de limão, sape-sape, goiaba, laranja, limão, gajaja, fruta-pão, romã, manga, abacate, tangerina, toranja, gaja-manga (família da manga), banana, entre outras frutas.

Estas frutas, segundo Jaime José Rodrigues, vão ser colhidas nos períodos de Dezembro deste ano até Janeiro de 2024, melhor época de safra destas culturas.

Produção de cacussos

Na mesma fazenda, está em curso a escavação de tanques para Aquicultura. Uns para a produção de cacussos e outros reservados especificamente para a produção de peixe bagre e seguilhão (espécie da família do bagre).

Um dos tanques encontra-se com 30 metros de comprimento e três de profundidade. O projecto, segundo Jaime José Rodrigues, entra em produção até Dezembro deste ano.

 Principais constrangimentos 

A falta de uma máquina para desbravar a terra, de transporte para o escoamento da produção, o encarecimento de sementes e fertilizantes e outros inputs que impulsionam a actividade agrícola continuam a ser os principais problemas vividos pelos agricultores e camponeses locais.

Jaime José Rodrigues explicou que, para desbravar a terra e prepará-la para o cultivo, as máquinas são sempre alugadas, fazendo com que os gastos sejam avultados consoante as dimensões da terra por cultivar.

"O aluguer de um tractor custa entre 35 e 40 mil kwanzas dependendo do material que será necessário para preparar a terra”, sublinhou o agricultor, reforçando que a falta de carrinhas para o escoamento da produção e serviços de táxi para apoiar as vendedoras que vão lá comprar os produtos é outra questão que deve ser resolvida, para o bem da comunidade.

"Recebemos muitas compradoras dos grandes mercados de Luanda, principalmente do Km-30, onde é escoado o grosso da produção da comunidade”, informou.

A fonte insistiu na questão dos meios de transporte e no acesso às lavras.  "Não temos transporte próprio, as picadas e estradas que dão acesso às lavras estão degradadas, por isso apelamos às entidades competentes para que nos ajudem a resolver isso", frisou Jaime José Rodrigues.

Ao lado de outros produtores da região, Jaime José Rodrigues disse que a comunidade tem acompanhado nos órgãos de comunicação social notícias sobre os apoios que o Governo disponibiliza para o município de Icolo e Bengo. "Estas ajudas não têm chegado na comuna de Cabiri e suas comunidades”, sublinhou.

Outro aspecto que deixou descontente o representante da comunidade da Mabuia e seus parceiros foram as palavras proferidas por um representante do sector da Agricultura, cujo nome não citou, que, durante uma visita a comuna, disse, na reunião com os agricultores locais, "que a comuna de Cabiri não produz". "Estas palavras nos deixaram tristes porque não é verdade”, lamentou.

"A comuna de Cabiri já foi considerada como cintura verde de Luanda”, salientou Jaime José Rodrigues.

Jaime José Rodrigues considera que a comunidade da Mabuia foi abandonada. "Nós é que aguentamos Luanda naquela altura e trabalhávamos com armas nas costas e enxada na mão e hoje somos desprezados e vivemos como filhos perdidos", disse, esclarecendo que "o abandono começou a partir de 2018-2019”, período que deixaram de ter apoio de entidades governamentais e da administração municipal.

Jaime José Rodrigues contou que, anteriormente, a comunidade recebia quinzenalmente visitas de governantes, desde governadores, ministros, embaixadores e outras entidades que apoiavam a comunidade.

 "Desde que Icolo e Bengo passou a pertencer à província de Luanda fomos abandonados e nem apoio moral da parte dos administradores municipais recebemos”, lamentou Jaime José Rodrigues, esclarecendo que Mabuia tem os pequenos camponeses, constituídos por cidadãos de 3ª idade e alguns jovens e a classe dos grandes e médios agricultores, principais detentores  de parcelas de terra entre 30 e 60 hectares, sem esquecer os fazendeiros detentores de grandes parcelas de terra.

 "Já mostrámos o que somos capazes e para triplicarmos a nossa produção precisamos de apoio de inputs e materiais agrícolas", frisou Jaime José Rodrigues.

Jaime José Rodrigues reconheceu que o Governo tem um projecto ambicioso para o bem da Nação, que é a diversificação da economia. A comunidade da Mabuia, frisou, está disposta a contribuir trabalhando arduamente no aumento da variedade de produtos do campo.

Preço do combustível    

O preço do combustível é, também, um dos principais problemas dos agricultores. Jaime José Rodrigues disse que desde 2009 que o Governo fala sobre a subvenção de combustíveis para a classe, mas, até ao momento, não se nota nada.

Os agricultores, prosseguiu, gastam montantes avultados na compra deste produto para abastecer a bomba. "Diariamente, gasto 20 litros de gasóleo e 15 de gasolina”, lamentou.

Para colmatar este défice, aquele agricultor apelou, mais uma vez, ao Governo para prestar maior atenção à comunidade da Mabuia, que até à presente data não recebeu nenhum apoio.

Milhares de toneladas de produtos escoados para o mercado do Km-30

Cabiri é uma das comunas do município de Icolo e Bengo que, apesar de algumas dificuldades, produz quase tudo que vem da terra.

Além de agricultor renomado na comunidade, Jaime José Rodrigues é o presidente da Comissão de Moradores da Zona B da Mabuia. Garante que, diariamente, seis a sete camiões saiem na região para o mercado do Km-30, uns com até quatro mil toneladas de produtos diversos.

"Não tenho feito pesagem nem cálculo, mas garanto que são toneladas e toneladas de produtos diversos que são escoados para o mercado do 30 e outros", sublinhou, insistindo que "haveria mais produção se a comuna tivesse apoio”.

"Os camponeses têm força de vontade para aumentar a produção agrícola mas, infelizmente, não há condições suficientes por falta de inputs, fazem tudo por conta própria", lamentou Jaime José Rodrigues.

Produção de cebola em grande escala

O cultivo de cebola na comunidade da Mabuia é, também, uma das grandes culturas na zona, apostado fortemente pelo cidadão da Guiné Conacri, Mamadu Dian Bang, que passou de cantineiro a pequeno agricultor.

Residente há cinco anos na comunidade da Mabuia, Mamadu Dian Bang é detentor de três hectares de terra já cultivados, onde é visível o cultivo de cebola em quantidade, além de milho e outras culturas.

O Jornal de Angola testemunhou a colheita de quantidades de cebola com folha e sem folha, onde faziam parte dos que colhiam, seis funcionários.

De tanta plantação, Mamadu Dian Bang não consegue precisar as quantidades de cebola que produz. Disse que essa tarefa seria fácil se existisse na comunidade um armazenamento para a conservação de produtos com todas as condições, incluindo sistema de pesagem.

Embora não saiba ao certo a quantidade de toneladas, Mamadu Dian Bang explicou que a colheita é controlada por talha. Numa talha de quatro metros de largura e 120 metros de comprimento, esclareceu, pode ser colhida uma tonelada de cebola.

Mamadu Dian Bang decidiu abraçar a agricultura porque presenciou a chegada de muitos luandenses e alguns conterrâneos a procura de terreno para cultivar.

Sem querer ficar para trás, a aglomeração de muitos chamou-lhe atenção e despertou nele o interesse de apostar no campo, arrendando um espaço a um dos agricultores, onde iniciou a produção de cebola, milho e feijão.

"Compro os inputs com os lucros que consigo obter na cantina, onde vendo, também, alguns produtos do campo", frisou Mamadu Dian Bang.

Espaço para armazenamento e conservação de produtos

Uma zona de armazenamento e conservação dos produtos na comunidade da Mabuia é, para Mamadu Dian Bang, o que se precisa com a máxima urgência.

Por falta de espaço de armazenamento, disse, os produtores não têm onde guardar e conservar os produtos, por isso são obrigados a colher o produto apenas quando é comprado pelos comerciantes dos grandes mercados.

Com efeito, o Jornal de Angola encontrou na área de cultivo de Mamadu Dian Bang alguns comerciantes do Mercado do Km-30 e zonas adjacentes a colherem a cebola numa talha já comprada.

Segundo Mamadu Dian Bang, na sua lavra, uma caixa de cebola custa 10 a 12 mil kwanzas e uma talha pode passar dos 100 mil kwanzas. "Uma talha pode sair cinco redes vermelhas de cebola de 20 e 30 quilos, dependendo do tamanho do produto. De quando em vez consigo despachar nas mãos das senhoras três toneladas de cebola, que a posterior são escoados para os mercados do Km-30, Kicolo e Catinton”, informou Mamadu Dian Bang.

Outro problema que deseja ver resolvido na comunidade é o apoio material para o sistema de irrigação, porque a lagoa onde é puxada a água fica a 700 metros da sua lavra e tem sido difícil, por falta de motobomba com capacidade para tal. 

Produção é comprada antes da colheita

Na zona de cultivo de Mamadu Dian Bang aguardam pela cebola algumas vendedoras dos mercados de Luanda. Uma delas é a cidadã Luísa Candumbo, vendedora do Mercado do Km-30.

Luísa Candumbo conta que é a segunda vez que se desloca a Cabiri, na Mabuia, para comprar produtos do campo. "Quando cá chego, compramos talha que varia de 150 a 100 metros ao preço de 130 a 140 mil kwanzas. O preço está acessível por ser uma época de muita oferta e quando chegamos no mercado vendemos a 21 mil kwanzas a rede de 20 a 30 quilos”, frisou Luisa Candumbo, satisfeita com a colheita.

Satisfação pela chegada de uma visita há muito esperada

O Jornal de Angola encontrou na povoação da Mabuia o presidente da Associação Cintura Verde de Luanda, Mito da Silva, que levou alguns kits de inputs agrícolas para acudir as necessidades dos camponeses locais.

Fazem parte dos kits 24 enxadas, duas pulverizadoras e cinco regadores, além de outros materiais. Jaime José Rodrigues agradeceu ao também agricultor Mito da Silva, que tem apoiado a comunidade com alguns inputs agrícolas.

"Estamos satisfeitos, porque ele lembrou-se de nós e veio para cá trazer-nos um suporte que muito precisamos", frisou o agricultor cabo-verdiano, satisfeito com a visita.

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