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A população da comuna de Quipedro, no município de Ambuíla, provincia do Uíge, vive dias difíceis. Falta-lhes quase tudo. A dieta rotineira à base de funje com kizaka ou feijão já agonia os populares, que não têm outras opções porque estão privados de aceder, com facilidade, a outras regiões para adquirirem outros bens.
O acesso à comuna de Nambuangongo era a melhor opção, porque os 90 quilómetros até à aldeia Zonda, para chegar a Ambuíla estão intransitáveis. A outra via, de 68 quilómetros, passando pela aldeia Cauanga para o município de Quitexe é percorrida em longas horas e apenas em viaturas com sistema de tracção a todo terreno.
Nestas condições, chegar a Quipedro exige muito sacrifício. Foi o que aconteceu com a delegação do governador provincial do Uíge, José Carvalho da Rocha, que visitou recentemente a localidade.
Depois de 60 quilómetros percorridos da cidade do Uíge até ao desvio da aldeia Cauanga, na comuna da Aldeia Viçosa, a viagem para a sede comunal de Quipedro, num percurso de 68 quilómetros, é feita entre cinco e seis horas quando, em condições normais, com uma boa asfaltagem, poderia durar uma hora e meia e uma terraplanagem poderia reduzir a viagem em pelo menos duas ou duas horas e meia.
Mesmo no percurso asfaltado, da cidade do Uíge até à Aldeia Viçosa, ainda existem vários troços degradados com buracos enormes, onde a viagem deve ser feita com prudência, devido aos buracos que obrigam a andar aos ziguezagues, ocorrendo, em várias ocasiões, colisões e despistes que causam danos humanos e materiais avultados.
Depois do desvio para a aldeia Cauanga, a picada, mesclada, maioritariamente de troços terraplanados na era colonial, hoje totalmente degradada, com buracos, poços de lama e lagos com vários declínios de solo, faz perceber aos visitantes o "calvário" que vem pela frente.
A poucos quilómetros da sede comunal de Quipedro, a viatura em que seguiam todos os jornalistas atolou porque, o condutor, por sinal o director do Gabinete Provincial da Comunicação Social, Ismael Botelho, desviou os olhos do pavimento lamacento, distraído por um belo pássaro "rabo-junco" de cor vermelha e preta, uma combinação perfeita para representar a bandeira nacional.
À
entrada do pequeno vilarejo de Quipedro é possivel notar que as únicas seis
infra-estruturas modernas foram erguidas há menos de 10 anos, pelo então
Gabinete Técnico de Gestão do Programa de Investimento Público (GTG - PIP), e
já clamam por reabilitação. A maior parte das residências dos habitantes é
feita de adobe e coberta com chapas de zinco.
População abandona aldeias
O administrador comunal de Quipedro, Sérgio José, disse que o difícil acesso às localidades e a falta de quase tudo, leva a população a abandonar as suas aldeias para procurar melhores condições de vida em outras localidades.
"Devido
às más condições das vias de acesso em toda comuna, tem se notado um acentuado
êxodo populacional, estando muitas famílias a abandonar as aldeias para irem
viver na província de Lunda ou na comuna do Úcua, no Bengo, na busca de
melhores condições de vida", lamentou.
"Melhorar os acessos com urgência”
Abalado com a situação que a população da comuna de Quipedro vive, o governador provincial do Uíge, José Carvalho da Rocha, que visitou recentemente a localidade, disse ser urgente a melhoria das vias de acesso para melhor mobilidade de pessoas e bens.
José Carvalho da Rocha assegurou que os trabalhos de melhoramento do acesso à comuna do Quipedro vão iniciar ainda este ano, tendo sido eleito o troço de 90 quilómetros entre a sede comunal e a aldeia Zonda.
"É para já! As obras devem iniciar o mais rapidamente possível neste ano para melhorarmos o acesso a esta comuna e melhorar as condições de vida desta população que carece de quase tudo. Quanto à ponte sobre o rio Loé, estamos a concertar com o governo do Bengo para encontrarmos, com brevidade, uma solução conjunta, tendo em conta a sua importância para o cenário socioeconómico das populações de Quipedro e Kixiko", garantiu.
Para
os vários problemas identificados na comuna de Quipedro, o governador do Uíge
disse que existem responsabilidades repartidas entre o governo da província e a
administração municipal, mas que todas devem concorrer para o desenvolvimento
da região e melhoria das condições de vida da população.
Poucos técnicos de saúde
O sector da saúde na comuna de Quipedro também enfrenta diversas dificuldades, desde a falta de médico e o reduzido número de enfermeiros e a falta de postos de saúde em algumas regedorias e aldeias com grandes aglomerados populacionais.
O administrador comunal, Sérgio José, informou que a região possui um centro de saúde na sede da comuna e cinco postos de saúde.
Dos cinco postos de saúde existentes, apenas os das aldeias Quibalacata e Quissalavua são de construção definitivas. Os restantes três, localizados nas aldeias Kaniqui, Quicumbi e Luêge funcionam em estruturas improvisadas.
Os serviços de saúde são assegurados por 19 técnicos, sendo sete técnicos médios de Enfermagem e três auxiliares de Enfermagem, pertencentes ao pessoal efectivo, seis enfermeiros colaboradores e três outros auxiliares administrativos. Números considerados insuficientes para o número de habitantes.
"É
necessário que existam pelo menos dois médicos no centro de saúde, que seja
aumentado o número de técnicos de saúde e a frequência na disponibilização dos
fármacos. O Centro Comunal de Saúde precisa de uma ambulância para poder
evacuar doentes cujas patologias ultrapassam o nível de conhecimentos dos técnicos
existentes, bem como a construção de estruturas definitivas para os postos de
saúde de Kanique, Quicumbi e Luêge", referiu.
"Arranjem-nos só as estradas”
Paula Manuela, 47 anos de idade, conta que nas primeiras horas da manhã e no final do dia, senhoras, jovens e crianças têm a missão de irem aos rios Cambamba, a um quilómetro, e Kinginha, a dois quilómetros da sede comunal, para acarretarem água para o consumo e uso doméstico.
Nos vários fontanários existentes na sede comunal de Quipedro, a água já não jorra há um ano e sete meses. Mas o que Paula Manuel tem mais saudades é ter nas suas refeições pelo menos peixe (fresco ou seco) porque depois do desabamento da ponte sobre o rio Loé este bem alimentar não chega à população.
"Já
não passamos de funje com kizaka ou com feijão. Falar de peixe ou frango
congelado já é uma miragem, para não pensarmos no pão, açúcar, sal, arroz,
massa alimentar, óleo e outros produtos que permitiam variar a nossa dieta
alimentar. Arranjem-nos só as estradas", rogou.
Dinamizar o PLAAF
A população da comuna de Quipedro produz mandioca, banana, ginguba, feijão, milho, batata-doce, muteta e outras culturas que constituem a base da dieta alimentar local.
A actividade do campo ainda é feita manualmente e os agricultores clamam pelo apoio do Governo para a mecanização da mesma, com vista a se evitar algum sofrimento e aumentar a produtividade.
O governador do Uíge informou que está em curso a implementação do Programa Local de Apoio à Agricultura Familiar (PLAAF), que permitiu cultivar 200 hectares de terra em todos os municípios, assim como a distribuição de sementes, meios de trabalho e acompanhamento técnico.
Para a presente campanha agrícola, prosseguiu, todos os municípios devem elevar para 300 hectares a quantidade de terras a serem lavradas de forma mecanizada e, neste contexto, a Administração Municipal de Ambuíla deve, na sua planificação, contemplar a comuna de Quipedro para se poder potenciar os camponeses, aumentar a produção e criar renda e riqueza para as famílias.
"Por
via do PLAAF, vamos tudo fazer para que os habitantes de Quipedro, sobretudo
aqueles que se dedicam exclusivamente à agricultura, sejam beneficiados com vários
hectares de terras lavradas, semente e instrumentos de trabalho para poderem
produzir mais para o autoconsumo, criarem bancos de sementes e comercializarem
o excedente", frisou.
Visita oportuna
O administrador municipal de Ambuíla, Justino Kuiassana, considerou de oportuna a visita do governador do Uíge à comuna de Quipedro, porque permitiu ao governante constatar a realidade da região e, possivelmente, sensibilizado, vai passar a olhar com "outros olhos" aquela circunscrição.
Justino Kuiassana indicou que além do que foi apresentado ao governador por meio de memorandos e relatórios, José Carvalho da Rocha constatou as dificuldades existentes, desde as vias de acesso, Educação e Saúde, Energia e Águas e outras necessidades da população.
"O senhor governador preferiu deixar de ouvir sobre as lamentações do povo de Quipedro e decidiu vir pessoalmente para constatar a realidade. Acreditamos que com esta visita muita coisa pode vir a mudar nos próximos tempos, de acordo com as garantias feitas pelo principal gestor da província", disse.
Pesca com plantas venenosas
Alguns pescadores artesanais da comuna de Quipedro e outras localidades do município de Ambuíla utilizam plantas venenosas para matar os peixes, na mesma altura em que em outros pontos dos mesmos rios a população toma banho e retira a água para o consumo.
A denúncia foi feita por um dos pescadores do município, João Mayala, que fala também do descaminho dos apoios materiais e financeiros alocados ao município para apoio à pesca artesanal, uma situação que fez reduzir drasticamente o número de pescadores e as quantidades de pescado que antes era disponibilizado para à população.
Sustentou que alguns pescadores utilizam as referidas plantas venenosas nos rios Vamba, Kijoão, Issasse e Kileke para envenenar e apanhar os peixes que depois são comercializados nos mercados da cidade do Uíge, enquanto a população das aldeias ribeirinhas consome a mesma água.
"É um atentado à saúde pública o que muitos dos meus colegas estão a fazer. O ideal mesmo é serem usados anzóis, redes, armadilhas (muzuas) porque os produtos tóxicos que estão a espalhar nos rios para matar os peixes podem trazer consequências graves para o nosso povo", sublinhou.
Aulas debaixo de mangueira
No bairro Kingola, na sede comunal de Quipedro, os alunos do Ensino Primário estudam debaixo de uma mangueira, porque a localidade nunca teve uma escola convencional, muito menos uma outra infra-estrutura onde se pudesse adaptar as salas. Ao se deparar com a situação, José Carvalho da Rocha ficou bastante comovido.
Verificou que a maior parte dos alunos não usa batas e carecem de vestimentas, porque os pais e encarregados de educação são, maioritariamente, pessoas desfavorecidas. O governador ficou também preocupado com o número de crianças que apresentam sinais graves de má nutrição.
Orientou o Gabinete Provincial da Saúde a criar um plano de intervenção urgente para se inverter a situação sanitária e de má nutrição naquela comunidade. Ao Gabinete Provincial da Educação pediu que mobilizasse recursos para a aquisição de batas escolares para serem distribuídas a todos os alunos da comuna.
"Temos de prestar maior atenção a estas crianças para amanhã não nos condenarem pelo que têm passado e pelo que o futuro lhes reserva. Dentro dos recursos alocados para a promoção da cidadania, podem ser adquiridas batas escolares para as crianças", referiu.
O administrador comunal de Quipedro, Sérgio José, disse que a circunscrição conta com nove escolas, das quais oito do Ensino Primário e um colégio que albergaram, no total, este ano lectivo, 2.962 alunos. O processo de ensino e aprendizagem é assegurado por 53 professores.
"Tanto o número de salas de aula como o de professores ainda é insuficiente para o normal funcionamento do sector, tendo em conta que ainda existem crianças a estudarem em baixo de árvores e, com as novas estruturas a serem erguidas, vamos continuar a ter falta de docentes", observou.
Bens para a população
No quadro da sua visita à comuna de Quipedro, o governador José Carvalho da Rocha entregou um lote de bens alimentares e roupa usada, detergentes, produtos de higiene pessoal, instrumentos agrícolas, equipamentos desportivos, canadianas e cadeiras de rodas para pessoas com deficiência, equipamentos de som e medicamentos para o centro de saúde.
"Não se trata de uma acção para acabar ou solucionar as necessidades que esta população vive. Mas temos fé que vai ajudar a minimizar a carência existente por algum período de tempo. Vamos continuar a mobilizar recursos para irmos, paulatinamente, apoiando estes nossos concidadãos", rematou José Carvalho da Rocha.
Energia e água
A população que vive na sede comunal de Quipedro e nas principais regedorias não beneficia de água tratada e canalizada nem energia eléctrica da rede pública. Consome água acarretada nos rios e alguns fazem recurso aos pequenos geradores de corrente eléctrica para iluminar as residências e desenvolverem alguma actividade comercial, sobretudo a venda de bebidas.
Sérgio José informou que apenas o gerador de 30 Kva instalado no centro de saúde funciona, para garantir os serviços daquela unidade e da Administração Comunal. Existe um outro de 20 Kva, na aldeia Quicumbi, que servia para garantir o bombeamento da água à sede comunal, cujo sistema está inoperante há mais de um ano. Na aldeia Quissalavua existe um outro gerador de 10 Kva, avariado há mais de dois anos.
"Estes dois sectores constituem também preocupação da Administração Comunal, porque a sede da comuna anda às escuras, sobretudo no período nocturno e as nossas mamães e crianças são obrigadas a percorrer longas distâncias para acarretar a água de consumo nos rios", lamentou.
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