Opinião

Procura de alimentos em tempo de crise

A pandemia do coronavírus está a impactar negativamente sobre vários sectores da vida económica e social, mas, reiteradamente, temos visto, a nível mundial, como é evidente, a preocupação excessiva de se frisar em grande escala o colapso dos sistemas de saúde.

19/01/2021  Última atualização 10H15
Assim, é também importante reforçar a análise do efeito da pandemia sobre um conjunto de sectores, como, por exemplo, saber a influência da crise no sector da Agricultura e no preço dos alimentos, situação que, segundo analistas, pode criar consequências ainda desconhecidas para a estabilidade financeira dos países.

No caso angolano, não se vislumbram, a curto prazo, problemas que possam pôr em risco a produção de bens agrícolas, que, com o surgimento da pandemia, regista um crescimento. Mas tal facto não impede que possam surgir preocupações ou riscos no que toca à distribuição e escoamento da produção, logística de acesso e contaminações em unidades de processamento, por ineficiência da infra-estrutura de apoio, que é débil e que está também muito pressionada pelos condicionalismos impostos pelas medidas contra a pandemia.

Para além das questões ligadas às infra-estruturas, há um conjunto de variáveis que podem pôr em causa o nível de transações comerciais, tais como a suspensão da aquisição de produtos por grandes compradores, que vêm os seus espaços comerciais condicionados a regimes e horários mais restritivos, bem como a queda de rendimentos de trabalhadores do sector formal e informal e os processos inflacionistas de alguns alimentos, que fazem aumentar o custo de vida, sobretudo nas grandes cidades. Portanto, há um conjunto de preocupações, não apenas ligado à oferta de produtos agrícolas, como também à procura, que deve ser acompanhado no actual contexto de pandemia.

Dados recentemente divulgados pela ONU (Organização das Nações Unidas) referem que a Pandemia de Covid-19 pode deixar cerca de 265 milhões de pessoas em situação de fome generalizada, fenómeno que cresceu 80% mais do que no ano passado. A fome é, aliás, um dos principais problemas do planeta: em 2020 morreram diariamente cerca de 12 mil pessoas. A procura de alimentos cresceu devido à redução da produção e da ajuda humanitária e, não havendo uma correspondente capacidade de resposta a nível da produção, ocasionou um défice de oferta de alimentos, causando, por esta via o aumento do preço.

Ásia e Pacífico são as regiões mais afectadas pela fome, com cerca 500 milhões de pessoas sem acesso a condições básicas de alimentação e 40% da população mundial afectada pela fome vive na China e na Índia. Entretanto, Bangladesh, República Democrática do Congo, Etiópia, Indonésia, Paquistão, Iêmen, Afeganistão, Venezuela, Síria e Haiti são países em que a problemática da fome e a privação de alimentos se faz sentir com maior incidência.

A alteração do padrão da procura de cereais (consumo humano vs consumo Industrial), de acordo com a FAO (Agência das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), no mês de Dezembro, resultou numa subida de 181 pontos no índice mensal de preços de alimentos, valor mais alto nos últimos cinco anos. Este aumento a nível mundial representa cerca de 2,1%, em comparação com o ano anterior. A mesma fonte acrescenta que estiveram na base deste aumento a subida do custo de óleos vegetais, do açúcar e dos lacticínios.

A ONU alerta ainda que a comunidade internacional tem de agir rapidamente, no sentido de garantir acesso a alimentos, evitar a interrupção dos financiamentos aos países, evitando os cortes das cadeias de fornecimento. No entanto, admite que os diversos programas de combate à fome não têm sido bem implementados e previne que é imprescindível retirar cerca de 100 mil pessoas da situação de desnutrição, para que se possa atingir, em 2030, a meta de eliminação total da fome no mundo. Entre outros males, a situação arrefece a economia mundial, aumenta cada vez mais o nível de desemprego e o sub emprego (principalmente nos países desenvolvidos, com taxas de 15% á 20%).

Relativamente à nossa realidade, continua a ser imperioso o reforço da diversificação da base económica, alargando o espectro a um conjunto de áreas prioritárias, nos sectores da produção agrícola e indústria transformadora, com particular enfoque na produção de cereais, pecuária, a agroindústria e restabelecimento da rede de logística e de distribuição. Por essa via, poderemos alterar, de facto, a estrutura da economia angolana, garantindo um desempenho mais interessante do seu conjunto. Tudo isso exige um rigor ao nível da gestão macroeconómica, bem como das políticas de controlo orçamental, ou, seja, melhorar progressivamente o ambiente de negócio e a qualidade da gestão pública.

*Economista

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