Entrevista

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Victorino Cunha: “Tivemos de partir do zero”

Honorato Silva e Melo Clemente

No meio do nada Victorino Cunha pegou na batuta e lançou as bases do basquetebol angolano nos primeiros anos de Independência, após regressar de St. John’s University, onde estagiou sob a batuta de Luigi P. Carnesecca, aposta de que resultou a hegemonia de Angola em África e a conquista do respeito no mundo com base na disciplina que hoje o obrigaria a deixar o influente Carlos Morais fora do Mundial da Ásia

09/10/2023  Última atualização 08H00
© Fotografia por: M.Machangongo Edições Novembro

Quarta-feira, 27 de Setembro. O relógio com o tempo local, fixado na parede da recepção, marcava 7h50. Exactamente 40 minutos antes da hora combinada. Do elevador chamado do parque de estacionamento localizado na cave, saiu um homem distinto, pelas marcas do tempo. Cabelos grisalhos e barba pintada num tom de cor próprio de quem, pelo peso dos anos vividos, tem autoridade moral e conhecimento para dizer verdades irrefutáveis. Os passos são mais lentos e cuidadosos, mas a voz, embora branda, ainda guarda o vigor do angolano nascido em Mogofores, Portugal, e adoptado por Angola como um dos seus melhores filhos. Cidadão de mérito, combatente da primeira hora, no exigente campo de batalha do desporto, primeiro grande veículo de diplomacia e de afirmação do Estado nascido na gloriosa noite de 11 de Novembro de 1975. Lá estava Victorino Cunha, o "senhor basquetebol” do país e referência incontornável do sistema desportivo nacional, que se apresentava no Hotel Trópico, em resposta ao convite da Edições Novembro, para tomar o pequeno-almoço com os títulos Jornal de Angola e Jornal dos Desportos. Falou do passado, do presente e do futuro da modalidade; paixão elevada a casamento indissolúvel, ainda na transição da infância à juventude, contava 18 anos. Vem daí, caro leitor, nesta viagem de 2 horas e 40 minutos de conversa frontal, aberta e sem ressentimentos. Boa leitura!                    

Jornal dos Desportos - Qual o maior contributo que deu ao basquetebol angolano, numa análise na primeira pessoa?

Victorino Cunha - Foi ter contribuído para a formação de dezenas e dezenas de atletas. Dezenas e dezenas de treinadores, que hoje continuam o nosso legado. Acho que este é o meu contributo. No início éramos professores da Escola de Instrutores de Educação Física. Tivemos, a partir do zero, de começar a preparar os ex-alunos da Escola de Instrutores, para a função de treinadores, já que em 1975 houve um êxodo de praticantes de basquetebol, e ficámos aqui reduzidos a muito poucos, para iniciar do zero até onde chegámos. O maior contributo é formação dos atletas, dos treinadores, por ter contribuído para, digamos, um certo equilíbrio em relação à gestão da coisa do desporto. Para que não deixássemos morrer esta actividade social.

Ter transitado do período colonial terá contribuído para o sucesso da modalidade, pelo conhecimento que tinha da base e até dos aspectos sociais do povo angolano?

Sim. Rapare! Nós sabíamos que era necessário fazer alguma coisa. Estávamos em guerra, e era necessário mobilizar também a nossa juventude para outra actividade que não só a guerra! Então foi a partir daí que nós, com um esforço enorme, e vocês sabem que antes da fase do reinício do desporto federado, estávamos no desporto informal, conseguíssemos que uma ou outra disciplina começasse a dar os primeiros passos, em questões da preparação desportiva, até que em 1977 recomeçámos a competição federada, normal. Acho que foi a partir daí. Naquela altura a estrutura que geria, superintendia o desporto, era o Conselho Superior de Educação Física e Desportos, liderado pelo camarada Gi.

 

Em 1980 Angola não tinha relações diplomáticas com os Estados Unidos, mas o Professor foi para lá fazer um estágio, ao invés de ter ido à Jugoslávia ou à União Soviética. Porquê e como foi improvisada esta ida aos Estados Unidos, em plena Guerra Fria?

Em 1977, fui ao I Congresso Mundial de Balon Cesto (basquetebol), em Tenerife, Espanha. Conheci uns treinadores americanos, que estavam lá como palestrantes. Mantivemos o contacto e, quando o camarada Rui Mingas, secretário de Estado dos Desportos, me disse: "Vais para a Jugoslávia, ficar três, quatro, cinco meses”; eu disse não. Naquela altura dizer não ao secretário de Estado não era fácil (risos). Disse se sair, porque eu já tinha formação de determinados cursos que frequentei em Portugal e Espanha, iria para os Estados Unidos. Vais para os Estados Unidos como? Perguntou. Sim vou, respondi. Foi por intermédio do primeiro vice-Primeiro Ministro, o camarada José Eduardo dos Santos, a qual fui submetido. Ele só me perguntou, então não há problema nenhum? Eu disse que não havia problema. Foi assim que em 1980, portanto, autorizado pelo camarada José Eduardo dos Santos, que fui, durante três meses, inscrito na Universidade de St. John’s, em Nova Iorque.

Isso criou embaraços, já que na altura não existiam relações diplomáticas?

Não. Fiz uma viagem Luanda/ Lisboa/Nova Iorque. 

Foi com passaporte angolano?

Sim. Saí com passaporte angolano. Quando fui solicitar o visto, perguntaram-me o que ia fazer a Nova Iorque. Eu disse que ia a St. John’s University. Vou ao Carnesecca. Concederam-me o visto. Foi assim. Em três dias obtive o visto em Lisboa. 

Chegado aos Estados Unidos, concluiu que era importante lá ir. Isso veio a ser um ganho para o basquetebol angolano?

Sim! Naquela altura quem estava a chefiar a nossa missão nos Estados Unidos era o Elísio de Figueiredo. Cheguei, fiquei num hotelzinho, em Manhattan, na 52 street, e, no dia seguinte, dirigi-me à nossa missão. Disse estou aqui, vou para St. John’s University. No dia seguinte, levaram-me a St. John’s University. E fui recebido pelo Carnesecca (Luigi P.), que eu já conhecia, e pelos seus adjuntos. Contribuí para a "Pre-Season”. Quer dizer, contribuí para a pré-época da St. John’s University. O nosso trabalho ali era assistir aos treinos e irmos, ao fim-de-semana, fazer o "scouting” (avaliação). Não dos adversários, porque a época só começava entre Outubro e Novembro. Íamos avaliar jovens a High School (ensino secundário), que potencialmente, passados dois anos, podiam ser contratados pela universidade. 

"Os militares quando pediam era quase uma ordem”

Após o regresso, como foi a inserção?

No 1º de Agosto! Eu estava na Secretaria de Estado e houve a autorização do secretário de Estado, para também treinar o 1º de Agosto, já que antes, formalmente, no tempo ainda do Conselho Superior, apareceram-me alguns camaradas: Ndalu, Orlog, Kito... Eu dava aulas na actual sede do 1º de Agosto. Controlava mais ou menos aquilo. Naquela altura, subimos e fomos falar com o secretário de Estado. Eles, os militares, quando pediam era quase uma ordem. Estávamos em 1978. O pavilhão era utilizado também por camaradas da Segurança. Jogávamos futebol de salão. Tínhamos de controlar aquilo, para não ser vandalizado. Aquela infra-estrutura era da antiga Associação de Estudantes de Coimbra. Para vocês terem uma ideia, o património dessa associação ia até ao morro do Catambor. Houve até uma fase, em que eu sugeri ao Kito, ao Ndalu e mesmo até ao próprio Iko Carreira, que vedássemos até lá acima, senão aquilo seria tudo tomado. Eles disseram, não, calma aí. Depois, nós somos militares, varremos isso tudo. 

E, qual foi a receita que levou o basquetebol angolano a atingir a hegemonia em África?

A receita foi o trabalho que eu disse ao Nini, o Roberto Leal Monteiro. Disse-lhe, olha, sabes bem que nós no tempo colonial praticamente não treinávamos. Aquilo era três vezes por semana. Para que nós possamos, em médio prazo, conquistar alguma coisa, temos de trabalhar muito e melhor, actualmente. Ele disse está bem. Foi, digamos, o saltar de três vezes por semana, para volumes de treino. Teve de ser com calma. Começámos com 500 horas, 600, 700. Aumentar o volume e a intensidade do treino, ao nível da época desportiva, e competir. Porque precisávamos de jogar, aparece, em 1980, o primeiro Campeonato Nacional. Mas, recorrendo ao Pacto de Varsóvia, aos Jogos do SKDA, para começarmos a ser mais fortes, com treinamento e competição. No SKDA levámos jogadores fundamentalmente do 1º de Agosto, mais um ou outro do Petro, do Sporting e da TAAG, para começar, digamos, a futura Selecção Nacional. Todo este processo culminou com a conquista da primeira medalha de bronze, nas Universíadas do Quénia, em 1979. A primeira medalha colectiva do desporto angolano. A primeira medalha individual foi do Melão, no triplo salto.

E, o Professor partiu para essas conquistas só com as valências apreendidas nos Estados Unidos. Que outras formações fez?

Não. Nós frequentávamos "clinics”. Eu era um autodidacta na questão do desporto, em particular do basquetebol. O primeiro livro que comprei foi aqui na Lello. Tinha os meus 18 anos, isso em 1963. Era um jovem. O título era "El Balon Cesto”. Portanto, fui-me apaixonando pela modalidade. No Liceu Salvador Correia, joguei futebol e joguei basquete. Depois no Benfica de Luanda. Estive um ano e meio em Portugal. Naquela altura os meus pais mandaram-me para lá. Regressei e continuei. 

Falou do autodidactismo, dos vários cursos feitos e da ida aos Estados Unidos. Havia partilha de conhecimentos entre os treinadores?

Colaborávamos na formação dos treinadores. Realizávamos cursos de formação. Naquela altura, além dos cursos de monitores e instrutores de Educação Física, depois do surgimento da Federação, realizávamos cursos de três níveis: estagiário, II e I nível.

E, como era feito o acompanhamento?

Mais tarde, com a melhoria da organização da própria Federação, os que frequentavam os cursos e ficassem aptos, iam trabalhar para os clubes. Depois, apresentavam um pequeno relatório da actividade. E, havia uma duração entre os estágios e a frequência do nível seguinte. Tinham de trabalhar quatro anos como treinadores-adjuntos, nas equipas com os técnicos principais, para frequentarem o curso de nível seguinte. Era assim a formação. 

E, quem foram os seus companheiros neste período?

Nessa altura, era o Óscar Fernandes. Depois o Mário Palma, que tinha sido meu aluno na Escola de Instrutores de Educação Física. Também o Romero. O António Henriques "Tonecas”, quando deixou de ser jogador, começou a exercer essa função. Era o falecido Alberto Portugal. Se a memória não me atraiçoa, o Chilocas, no Ferrovia. Portanto, eram esses. O Moscavide esteve algum tempo, sim. O António Ferreira. Este era o núcleo mais forte, digamos assim.

Daqui dá para inferir que o espírito libertário, de construção do país novo, criou maior coesão no vosso seio, cujo ideário era fazer uma Angola forte também no desporto…

Claro que sim! Apontámos como objectivo, em médio prazo, a conquista de uma medalha africana. Em 10 anos. Isso conseguiu-se, em 1987. Eu disse que em 10 anos conseguiríamos uma medalha em África. Os próprios cubanos que estavam aí a ajudar, viraram-se para mim e disseram que seria difícil. Eu disse claro que sim. E, aí conseguimos em Nairobi, nos Pan-Africanos. Ganhámos em masculinos e ficámos em segundo em femininos, com o Tonecas.

E, quando é que sentiu que Angola era capaz de se impor em África?

Em 1987. Realizámos também aqui o Campeonato Mundial Militar. Na Cidadela, antes do Pan-Africano, em Nairobi. Ganhámos, com a ajuda de três não do 1º de Agosto, em Julho, o Campeonato Mundial Militar do SKDA.

"Não evoluímos na última década”

Que nos pode dizer da denominada escola do basquetebol angolano?

Salvo o erro, referi primeiro este termo, escola, para aí em 1980, 81, depois de vir dos Estados Unidos. Era uma escola de básquete. As pessoas podiam confundir com escola do sistema de ensino. Escola é termos um conjunto de princípios, que têm de ser aplicados na preparação desportiva e na competição, que seja divulgada e ampliada, onde se joga básquete. Defini alguns princípios que caracterizavam essa escola. Face ao nosso menor poderio somático de altura, peso, íamos optar pela melhor preparação desportiva possível, dotando os atletas de resistência, velocidade, força compatível com o seu corpo. Uma excelente defesa, depois nos tornarmos rápidos na transição da defesa ao ataque e começar a seleccionar os lançamentos. Digamos, a cultura táctica. Darmos educação aos atletas, para que nós, face à observação que tinha feito das equipas africanas, o estilo de jogo e a sua maneira de jogar, pudéssemos, a médio prazo, obter uma medalha a nível continental. Um conjunto de princípios que caracterizavam essa escola. E depois os clubes, os treinadores, começaram a seguir.

Hoje essa escola ainda é respeitada?

Há uma certa descaracterização em relação a esses princípios que caracterizam essa escola. Porque o basquetebol evoluiu. Nós não evoluímos na última década! É necessários os treinadores terem a competência necessária, conversando entre eles, para que se defina o que é necessário fazer, de modo a que a evolução seja um facto. Disse muito bem, a nossa escola, a nossa característica, era boa preparação física, depois defender bem, contra-atacar e lançar. Os indicadores estão aí. As percentagens de lançamentos de dois e três pontos ficam muito aquém do que é o padrão estabelecido para que se possa vencer a nível africano. Portanto, há uma certa descaracterização. Tem de se ter bom-senso, para ver o que é necessário fazer, para que em quatro anos possamos apontar como objectivo chegar às meias-finais.

Que impacto teve, na perda desses princípios da escola do basquetebol angolano, a chegada de treinadores estrangeiros?

Alguns treinadores não contribuíram para a manutenção das características do basquetebol. A estrutura do treino é caracterizada pelo seu conteúdo, volume, a sua intensidade, e dos percentuais que têm de ser dados aos diferentes elementos que têm de ser treinados, para que os atletas melhorem e a equipa consiga rendimentos desportivos superiores. Dedica-se muito tempo à táctica! Isso é um erro. Há muita táctica e pouco conteúdo de treino, para preparar os conteúdos programáticos, as acções defensivas e ofensivas, que caracterizam o basquetebol moderno. Numa estrutura de treino, por exemplo de 120 minutos, não se pode dedicar 60% à táctica. Não tem valia nenhuma. Tem de se estruturar a sessão de treino de maneira que sejam exploradas e melhoradas as situações de um contra um, dois contra dois, as desigualdades numéricas. Dois contra dois, mais um e ao contrário. Até jogar três contra três, quatro contra quatro. Tudo isso tem de ser estruturado, de maneira que se chegue ao cinco contra cinco.

E não tem sido assim o treino das nossas equipas?

Claro que não! O que acontece, na maioria dos treinadores, é que dedicam muito tempo ao cinco contra cinco. Não é! Isso é um erro que está a acontecer no nosso básquete. Tem de ser rapidamente corrigido, para que os atletas melhorem as suas capacidades. Não só físico e atléticas. Tudo bem, com treino específico, mas também técnicas, pré-tácticas e tácticas. Quer dizer, hoje a táctica inidividual é como fazer e quando fazer. É um drama. Os treinadores não entendem isso. Pensam que a táctica só é colectiva. Não. A táctica individual é como o atleta tem de fazer e como fazer, no momento oportuno, no momento certo.

Como explicar isso de forma mais simples para o leitor comum?

Tem de se dedicar mais tempos às acções colectivas, de maneira que se possa chegar a essa tal táctica. Táctica defensiva, contra-ataque, transições.

Se o adversário montar uma estratégia que bloqueie a táctica, os nossos jogadores ficam sem soluções?

Sim. As respostas para contrapor essas dificuldades é que não estão a ser convenientemente treinadas. Não tenho dúvida nenhuma.

Descontentamento na classe de treinadores

Na classe de treinadores angolanos existe essa união, para se mudar o actual quadro?

Olha! Há um certo descontentamento em relação à classe de treinadores. É um facto. Não podemos esconder. Escamotear. Porque os treinadores nacionais, por vezes, são desrespeitados e até mesmo hostilizados, por alguns agentes do desporto. Tem de haver, digamos, respeito por aquilo que se fez nestes 45 anos, em relação à modalidade. E há um grupo de treinadores nacionais que podem liderar o processo. Podem liderar! Mas se sentem desrespeitados. Podem desempenhar funções, com a ajuda aqui e acolá, em relação a saber o que é necessário fazer, para que a evolução seja um facto. Eles podem liderar os processos. E, depois, deparam-se com situações de treinadores expatriados, que não nos dão nada! Não agregam valor. Os treinadores nacionais sentem-se completamente perdidos. Isso é um facto.

Não está a fazer uma defesa paternalista?

Honorato, não é uma defesa paternal (Risos). É mesmo um facto! Os treinadores nacionais sentem-se desprestigiados. É necessário que haja um reconhecimento dos treinadores nacionais, da parte de quem lidera a componente administrativa.

"Não temos Stephen Curry ou James Harden”

E qual tem sido o papel da Associação do Treinadores?

Há um documento que foi submetido à Federação, há 10/12 anos, em que, estava claro, era necessário para treinar em Angola, não apenas na Selecção Nacional, que eles, os expatriados, reunissem um conjunto de pressupostos. Sim. Não era qualquer um que viria treinar. Mas o documento não foi validado pela Federação. Foi a Associação Nacional de Treinadores que concebeu e submeteu. Associação tem de ser um parceiro. Mas quem lidera a Federação tem de reconhecer competências à Associação, neste momento liderada pelo Gi (Manuel Silva), para que haja um melhor aproveitamento dos técnicos nacionais.

Mas o actual estágio do basquetebol angolano não é também resultado da retirada de importância à formação?  

Também passa por aí. Mas, não me refiro só ao basquetebol. Os treinadores dizem que na formação nós temos é de formar, entre aspas.

E temos os melhores treinadores na formação?

Não! Mas nos clubes, deverá haver um órgão que trate dos assuntos técnicos e estude a modalidade, para que quem tiver esse órgão nos clubes, tenha reuniões periódicas com os treinadores, por forma a fazer a análise da modalidade e dos conteúdos programáticos que têm de ser ministrados aos jovens atletas, para começarem o seu processo evolutivo como homem e como jogador, naturalmente. Os conteúdos que estão a ser ministrados aos jovens atletas, sub-12, sub-14, não são os melhores, para que eles tenham uma ascensão harmoniosa como homem, indivíduo e como atleta.

Estão atrasados ou adiantados para o escalão etário?

Não estão é adequado ao seu escalão etário. Como vêem muitos vídeos, pensam que se pode ter 55% de percentagem de lançamentos de dois pontos ou de três pontos, tentam imitar e não conseguem, porque quem prepara os jogadores são os treinadores. Não tem dúvida nenhuma. E aquilo que se dizia, percentagem inadequada, em relação à táctica, está aqui. Logo na formação. Isso não é só no básquete. É no futebol, é no andebol. Começam a pôr os miúdos a realizar a tal táctica, em detrimento das outras componentes do treino, que levam depois ao processo táctico a ser realizado com mais êxito.

Aqui entra a necessidade da repetição do gesto técnico…   

Claro (riso). Isso é básico. É elementar. Se o gesto técnico não for adquirido de maneira correcta, depois a partir dos 16, 17 anos é muito difícil ser corrigido.

Então por aqui se pode entender a prestação da Selecção Nacional em Manila?

É menos difícil treinar processos defensivos, apesar de que em termos emocionais, o treinador ter a capacidade de motivar, educar e preparar os atletas, para que eles sejam submetidos às cargas que levam à aplicação dos processos defensivos; e em relação ao gesto técnico que culmina o processo ofensivo. É muito difícil serem bem trabalhados. E mais. Joga-se como se treina, sim, e treina-se como se joga. Significa que no acto do lançamento, se ele não for realizado correctamente, desde a base, num processo evolutivo de aquisição dos gestos motor e técnico, depois ele chega ali aos sub-18 com os aspectos técnicos incorrectos, é muito difícil ser trabalhado. Perdão, corrigido. Isso é para ontem. Por que se não, sobre pressão, os atletas em 20 lançamentos marcam dois ou três. Tal como acontece numa outra modalidade, no futebol. É a mesma coisa. Se ele não tiver a capacidade de numa situação de pressão defensiva do adversário, desenquadrar o defensor directo e efectuar o remate como tem de ser executado, tem de ter a força, a resistência, a velocidade, a força explosiva, que é uma componente que não está a ser convenientemente trabalhada. A força explosiva permite desenquadrar o defensor directo e por vezes indirecto, para que realize o gesto técnico com eficácia.

No passado havia disciplina táctica do jogo. Hoje há uma corrente que defende que qualquer jogador pode lançar…

 O basquetebol evoluiu sim. Mas não é com esse tipo de manifestação que se obtêm as vitórias e rendimentos superiores. Se o atleta, portanto, numa situação real do jogo, tem de ser preparado durante as sessões de treino, ele não consegue, em 20 tentativas, pelo menos 10/12, não consegue fazer 55%, 60%, como é que depois vai ter êxito no processo competitivo? Não pode! Havia e há, na minha opinião, determinadas situações em que se pode lançar e se deve lançar dos três pontos, com o mínimo de êxito. Nós não temos aqui Stephen Curry ou James Harden. Não temos. É necessário que eles compreendam isso. Mas, temos de criar situações. O trabalho sem bola, que é a educação. Os bloqueios, a movimentação constante, para que se coloque um atleta em condições favoráveis de espaço e de tempo, para lançar ao cesto. Condições favoráveis, por intermédio dos bloqueios, directos, indirectos, trabalho sem bola, exploração dos buracos, com penetração e saída da bola, para que se coloque um atleta, com espaço e tempo, para lançar com êxito ao cesto. É tudo o que posso dizer neste momento.

Nesta situação de baixo aproveitamento de lançamentos, colocaria os atletas, no dia seguinte, a repetir o gesto técnico. Isso ajudaria?

É evidente que se melhora sempre. No treino, o treinador tem é de preparar a bateria de exercícios, de maneira que seja a situação real de jogo. O que acontece, eu já citei esse exemplo, põem parelhas de dois atletas. Um debaixo do cesto, outro fora, lança, outro salta, outro passa. Isso não é uma situação real de jogo! As situações reais de jogo implicam o trabalho sem bola, divisão da acção do defensor, para a abertura das linhas de passe, com defensor activo, ou passivo, ou a 50%. Ou beneficiando de um bloqueio directo. Isso é que são situações reais do jogo, que têm de ser replicadas no treino, para que ele depois se sinta mais à vontade no acto competitivo.

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