Entrevista

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“Angola tem condições de tornar o turismo a principal fonte de divisas”

A Prodoil aplicou, desde a sua criação, 65 milhões de dólares, na construção de um condomínio na província de Cabinda. O condomínio possui 11 edifícios e 290 apartamentos.

14/10/2023  Última atualização 08H40
Pedro Godinho Presidente do Conselho de Administração da Prodoil © Fotografia por: DR
Em entrevista ao Jornal de Angola, o presidente do Conselho de Administração da Prodoil, Pedro Godinho, disse que o grupo que dirige está apostado no sector do turismo por ser um segmento que traz facilmente divisas ao país.

Senhor Pedro Godinho como surge a Prodoil?

Na altura, o Governo de Angola, através do Ministério dos Petróleos, decidiu que qualquer operadora multinacional que quisesse vender serviços e equipamentos, tinha que ter uma parceria com uma empresa angolana. A estratégia do Executivo era de reter os biliões de dólares que gastava com as empresas estrangeiras para sustentar as operações petrolíferas no país.

Foi desta maneira que constituí uma empresa de prestação de serviços para o sector petrolífero. A implementação do Conteúdo Local permitiu o país, técnicos angolanos, empresários e o cidadão comum beneficiar directamente dos resultados das operações petrolíferas.

Repare, cada dólar que um operador gasta é recuperado com o petróleo extraído no país. Os operadores que trazem empresas como prestadoras de serviços, os recursos financeiros que arrecadam beneficiam as economias dos seus países. E, quando o Governo deu conta que gastava muito dinheiro com as operações petrolíferas, orientou as operadoras a fazerem parcerias com empresas nacionais, para que esses biliões ficassem no país. O Governo orientou também a transferência de tecnologia, conhecimento, oportunidades de negócio e criação de emprego.

A implementação do Conteúdo Local trouxe resultados positivos para o país?

Claro que sim, porque o Governo forçou as operadoras que vendiam produtos acabados, a fabricarem esses equipamentos em Angola. Fruto desta estratégia, temos a Sonamet, que fabrica plataformas para a indústria petrolífera. Esta empresa quando está no pico de produção, chega a empregar mais de três mil trabalhadores. Apesar de algumas empresas nacionais de prestação de serviços terem fechado as suas oficinas, o país beneficiou muito com este programa.
O Conteúdo Local, no que diz respeito à transferência de tecnologia, conhecimento, oportunidades de negócios e criação de emprego, contribuiu bastante para o surgimento de várias empresas angolanas, que fizeram parcerias significativas no sector petrolífero.

Neste caso, que parcerias é que a Prodiam Oil Services estabeleceu?

A Prodiam Oil Services criou uma parceria com a empresa AKER Solutions. Em 2014, ganhámos um projecto avaliado em 2,3 biliões de dólares, para prestar serviços no campo Kaombo, que é operado pela Total. Uma parte deste valor ficou em Angola, com a construção de um centro tecnológico em Viana, que por sinal é o único em África. Fizemos investimentos na Faculdade de Engenharia, da Universidade Agostinho Neto, e equipámos laboratórios. Em 2018, fizemos uma outra parceria, com uma empresa americana de engenharia. Dos 35 engenheiros, que estavam envolvidos neste projecto, metade eram angolanos.

A Prodoil está focada na produção de petróleo?

Neste momento, a Prodoil está a trabalhar para concorrer em alguns blocos, onde pretendemos operar no futuro, porque o sonho de qualquer empresa que está no sector dos petróleos é tornar-se um operador.  
Não estamos a operar, mas estamos  a actuar como investidor. Estamos no Bloco 2/05, que está a produzir, e no Bloco 4/05, estamos como investidor. Entramos para o bloco do Congo 5, no Offshore, que está na fase inicial de exploração, e no Onshore, do Bloco 6, da Bacia do Congo. Actualmente, empregamos 380 angolanos.

A meta da Prodoil é elevar os níveis de produção nos blocos que estão a investir?

Este é o nosso objectivo, apesar de existirem alguns pressupostos que precisam ser acautelados para que isso aconteça. Neste momento, estamos a trabalhar para que a Prodoil possa ter uma contribuição satisfatória no aumento dos níveis de produção nos blocos que estamos a investir. O dinheiro que estamos a arrecadar com a produção de petróleo está a ser aplicado em outros sectores, porque a meta é usar esta verba para investir em diferentes segmentos da economia.

Em que sectores está a ser aplicado esse dinheiro?

Estamos a aplicar esse dinheiro no sector do turismo, por ser o único segmento da economia que facilmente pode substituir o sector petrolífero. O turismo tem a essência de captar recursos financeiros para o país. Angola não pode continuar a estar refém do petróleo. É das poucas fontes de receitas em divisas. Só estamos reféns deste recurso, porque pensamos que é o único que traz divisas à economia.

Está a dizer que a Prodoil vai focar-se no turismo?

Sim, porque vejamos. Em 2019, antes do surgimento da pandemia da Covid-19, a Itália conseguiu arrecadar 76 biliões de dólares. A África do Sul fez dez biliões de dólares. A França 86 bilhões e os Estados Unidos 213 biliões de dólares, só em turismo.  

Aplicámos 65 milhões de dólares para a construção de um condomínio de 11 edifícios, com 290 apartamentos. O objectivo deste projecto é dar resposta às necessidades de acomodação no país. Retirámos dinheiro do petróleo para investirmos num condomínio residencial em Cabinda, criando 240 empregos naquela região do país. 

Vamos trabalhar com uma cadeia mundial que vai gerir o projecto, para que quem for a Cabinda consiga estar acomodado com todas as condições que são exigidas em qualquer parte do mundo. Estamos a buscar recursos do petróleo para direccionarmos em outras áreas.

Por que Cabinda?

Porque, em Cabinda, estão a ser construídas várias infra-estruturas, como o porto de águas profundas, aeroporto internacional e a refinaria de petróleo, que vai processar 60 mil barris de petróleo por dia, bem como o surgimento de uma zona franca. Estamos a dar a nossa contribuição na província de Cabinda, porque vemos que tem um potencial no sector do turismo. Este condomínio vai servir para apoiar as operações petrolíferas, porque muitas das empresas que vão prestar serviços à Chevron terão acomodação garantida.

A Prodoil pretende tornar-se numa referência neste sector?

Imagine se Angola tivesse 200 ou mais empresas do sector petrolífero a apostarem no turismo ou num outro segmento da economia. O país estaria desenvolvido. O objectivo da Prodoil é dignificar o cidadão angolano, porque quando queremos sair do país, com o nosso passaporte, devemos ser respeitados, como um americano ou um francês. A única maneira de nos sentirmos respeitados, é contribuirmos para o desenvolvimento deste grande país, que se chama Angola.

Acredita no desenvolvimento do turismo em Angola?

Acredito profundamente, porque Angola está em condições de tornar o turismo, como principal fonte de entrada de divisas para a economia nacional, sobretudo, do interesse dos Estados Unidos em aplicar recursos financeiros para o desenvolvimento de Angola. Mas um dos objectivos fundamentais para o país desenvolver-se neste sector, é Angola procurar fazer parte do grupo G-30. O grupo G-7 é restrito, e o G-20, Angola não está em condições de destronar, os países que fazem parte deste núcleo. Mas, se for estendido para G-30, Angola deve procurar fazer parte, em benefício do desenvolvimento económico e social do país.

A par do turismo, qual é o outro sector em que a Prodoil pretende investir? 

O outro plano é apostarmos no fomento do café. Como sabe, Angola já foi um dos maiores produtores desta cultura no mundo. Apostar em outras culturas agrícolas faz parte do nosso plano estratégico, apesar de não estarmos interessados em desenvolver agricultura. Admiro e louvo o empenho dos empresários que apostam no sector da agricultura, porque têm estado a contribuir para auto-suficiência alimentar e no combate à fome no seio das famílias angolanas. 

"Só existe desenvolvimento, quando há conhecimento”
Existem outros projectos em curso?

Sim, com a nossa associação de Promoção, Desenvolvimento Prosperidade e Tecnologia (PDPT). Esta associação tem a missão de descobrir talentos no país. O objectivo é acompanhar os jovens e levá-los até à universidade. Neste momento, estamos a negociar com algumas universidades dos Estados Unidos com atribuição de bolsas de estudos.

Já conseguimos identificar 50 jovens que estão a participar nos nossos programas. Identificamos igualmente duas jovens que vão fazer uma especialidade muito rara no país, que é a "Mio-Cardiologia”. Estamos a tratar dos vistos e as passagens estão pagas. Estamos a pagar as propinas de 29 jovens para terem uma evolução académica satisfatória. Quando atingirem o ensino superior e mandá-los-emos para as melhores universidades do mundo.

Esta é a nossa contribuição para o desenvolvimento do país, porque quem acredita que Angola pode fazer parte dos G-30, também deve acreditar no desenvolvimento do país. Só existe desenvolvimento, quando há conhecimento. 

Estamos a preparar as novas gerações para os desafios da economia global e estimular o intercâmbio, entre as empresas e instituições.

Qual é a missão desta associação?

A missão desta associação é identificar, apoiar e promover o talento de crianças e jovens mentores e promotores de projectos inovadores. Desenvolver iniciativas que estimulem o espírito empresarial e o trabalho em parceria, com vista à formação, informação e apoio técnico de empreendedores emergentes. É um programa dirigido a jovens dos 8 aos 25 anos.

O mais impressionante é que as campanhas que temos promovido, permitem-nos identificar excelentes talentos, e com este programa, estamos a descobrir verdadeiros talentos em Angola. Temos jovens com muito potencial e muitos deles estão a inventar produtos que estão a ser patenteados no exterior. 

Quais são os critérios para obter uma bolsa de estudos? 

No âmbito deste programa, seleccionamos os melhores alunos  para frequentarem cursos em várias universidades dos Estados Unidos. Mas, antes de beneficiarem de uma bolsa de estudos, passam por um teste de inglês. Infelizmente, os resultados não têm sido positivos, porque o nível de inglês que apresentam não os permite obter notas satisfatórias.

Apesar de terem alcançado notas negativas, os jovens são considerados cientistas. Por isso é importante que o país aposte no ensino da língua inglesa.

Qual é o conselho que deixa ao Ministério da Educação?

Penso que é a altura de o Ministério da Educação começar a introduzir o ensino da língua inglesa nas classes iniciais, para permitir que as crianças angolanas dominem este idioma mais cedo. O inglês é a língua da ciência e do negócio. O inglês também é importante para os nossos governantes e empresários, porque existem momentos que queremos tratar os assuntos de forma confidencial, sem partilhar com o colaborador, tradutor ou intérprete.

A China tornou-se no maior falante da língua inglesa no mundo, porque o governo chinês mandou os seus estudantes, com bolsas de estudos, para os Estados Unidos, e para outros países. Hoje, a China está a desafiar os Estados Unidos, na liderança do mundo, do ponto de vista económico.

Se uma criança iniciar a aprender o inglês, com quatro anos, quando atingir os 20, estará em condições de absorver os conhecimentos com facilidade.

Produção de petróleo
Acredita que Angola pode atingir os dois milhões de barris de petróleo/dia?

Olha, em 2008, Angola chegou a produzir dois milhões de barris de petróleo por dia. Os actuais campos produzem petróleo, há 60 anos, e estão antigos. Urge a necessidade de serem descobertos novos blocos. Angola tem mais 10 bacias. Neste momento, o petróleo é explorado em duas bacias, que é a do Cuanza e Congo. O país tem condições para produzir nas 10 bacias. Se nas duas bacias consegue-se produzir um milhão, em 10, pode superar os actuais índices de produção.

O que deve ser feito?

Angola tem aproximadamente 56 blocos, e o país deve ir atrás desses blocos. Nos anos 80, víamos Moçambique, como um país pobre, porque não se tinha descoberto nada. Quando começaram a investir na exploração, descobriram um menga campo de gás. Se calhar é o maior do mundo. Com esta descoberta,  estão a ser vistos como bilionários. As descobertas de novos campos mudam o perfil económico de um país. Se o país não procurar novos campos, dificilmente consegue desenvolver-se.

Os nossos campos já estão cansados, o que causa declínios de produção. Existe um bloco, onde a Prodoil é sócio, produz petróleo há 45 anos. Antes produzia três mil barris/dia, hoje, está a produzir 700 barris. O que demonstra que devemos procurar novos campos com maior potência de produção.

PERFIL
Quem é Pedro Godinho?

O engenheiro de minas e petróleo, Pedro Godinho entrou para os quadros da Sonangol, em 1980, inserido no departamento de estudos e projectos. Como a Sonangol tenciona incluir jovens angolanos no sector da produção, no âmbito do processo de angolanização, em 1981, juntou um grupo composto por 34 angolanos, que foram indicados para trabalharem com técnicos estrangeiros. O objectivo era adquirir conhecimentos e experiências no sector de hidrocarbonetos.

Em 1981, foi trabalhar para Texaco, como operador, e mais tarde colocado no departamento de reservatórios.

Com a implementação do "Conteudo Local”, decidiu abrir uma empresa para prestar serviços ao sector petrolífero. "Trabalhar para a Texaco foi a melhor coisa que fiz na minha vida. Hoje, tenho o perfil que tenho, e uma parte do sucesso que tenho, graças a estratégia montada pela Sonangol na altura”, confessou.

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